Cientistas registram pela primeira vez um animal tratando ferida com planta com propriedades medicinais

06 maio 2024 às 15h59

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Não são raros os casos de animais se automedicando com plantas e ervas na natureza. O registro desses momentos é que parecia impossível até 2022. Um grupo de pesquisadores registrou o momento que um orangotango-de-sumatra- chamado Rakus mastiga a folha de uma planta conhecida por seus princípios medicinais e aplica sobre uma ferida no rosto. Após alguns dias da aplicação, a ferida não apresentava infecção e estava quase totalmente cicatrizada.
O registro foi feito no Parque Nacional Gunung Leuser, na Indonésia, e publicado na Revista Nature na quinta-feira, 2. O estudo diz que na natureza há exemplos generalizados de comportamento de ingestão de folhas inteiras, mastigação e caules amargos e esfregamento de pelos em grandes símios africanos, orangotangos, gibões de mão brancas e outras espécies de macacos na África, América Central e do Sul, e Madagascar. “Até onde sabemos, há apenas um relato de tratamento ativo de feridas em animais não humanos, ou seja, em chimpanzés”, aponta.
Tratamento em humano foi registrado 2.200 anos a.C.
O texto lembra ainda que nos humanos, o primeiro registro de tratamento de feridas data de 2200 a.C. em um manuscrito médico. “Incluía limpeza, confecção de gesso e enfaixamento de feridas”, relata. “Um dos primeiros produtos conhecidos de cuidados com feridas usados pelos sumérios, gregos, maias e egípcios eram óleo, ervas, larvas, cerveja, vinagre, vinho, tinta verde contendo cobre e mel”.
Antes do registro de Rakus, a pesquisadora Jane Goodall já havia descrito a presença de folhas inteiras nas fezes dos chimpanzés (Pan troglodytes) no Gombe Stream, Tanzânia. “Até o final dos anos 1990, esse comportamento, agora chamado de ingestão de folhas inteiras, foi documentado em vários locais de estudo de grandes símios africanos, juntamente com a mastigação de caules amargos, e demonstrou ter funções terapêuticas e anti-parasitárias”, diz a pesquisa.

O texto divide o tipo de automedicação em cinco tipos: comportamentos de doenças como anorexia; comportamento de evitar fezes, alimentos ou água contaminados; comportamentos profiláticos, como o consumo de alimentos preventivos ou de manutenção de saúde; comportamento terapêutico, definido como na ingestão de uma substância biologicamente ativa com pouco valor nutricional e aplicação terapêutica de plantas farmacologicamente ativas no corpo para o tratamento de condições de saúde externas.
No caso de Rakus, ele tinha um ferimento no rosto. Os cientistas levantam a hipótese de uma briga por território, tendo em vista os sons vocais de luta entre machos orangotangos, tendo sido observada momentos antes da aparição da ferida. “Em 25 de junho, às 11h16, Rakus começou a se alimentar do caule e das folhas da liana de Fibraurea tinctoria , também conhecida como ‘Akar Kuning’, que faz parte da dieta dos orangotangos nesta área”, relata.
De acordo com o estudo, a liana é raramente consumida, mas há registro do consumo das folhas, frutos ou caules, por parte de orangotangos. “Treze minutos após Rakus começar a se alimentar da liana, ele começou a mastigar as folhas sem engoli-las e usando os dedos para aplicar o suco da planta de sua boca diretamente em sua ferida facial. Esse comportamento foi repetido várias vezes e durou sete minutos”, revela.
“Raku espalhou a polpa da planta até que a carne vermelha estivesse totalmente coberta com o material verde das folhas…Observações nos dias seguintes não mostraram sinais de infecção na ferida e até 30 de junho a ferida facial já estava fechada Até 19 de julho de 2022, a ferida parecia estar completamente cicatrizada e apenas uma cicatriz leve permaneceu”, conclui a análise.
Os cientistas perceberam ainda que o processo de recuperação do animal envolveu um maior período de descanso.
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