O Conselho Federal de Medicina (CFM) negou, em nota, que apoia o PL antiaborto legal, que trâmita na Câmara dos Deputados. A proposta visa equiparar a pena de homicídio a interrupção de gravidez legal após 22 semanas. De acordo com a entidade, houveram distorções do debate sobre o tema.

“O projeto de lei 1.904/2024, que tramita na Câmara dos Deputados, não teve participação ou contribuição do CFM em sua elaboração e que o tema deve ser discutido no âmbito do Congresso Nacional, ouvindo todos os segmentos envolvidos e promovendo um amplo debate com a sociedade sobre o tema”, diz a nota do CFM.

“CFM lamenta as distorções às quais esses temas têm sido submetidos, o que sugere uma tentativa de politizar as discussões e confundir a população, gestores, tomadores de decisão e até profissionais da medicina”, continua o documento.

A entidade vinha sendo criticada por especialistas e médicos que atendem vítimas de estupro. Esses profissionais já haviam criticado o CFM pela proibição do da técnica de assistolia para interrupções de gravidez após 22 semanas. O presidente do Conselho afirmou que a assistolia é ato de crueldade, e médicos poderiam ser responsabilizados pelo uso da técnica.

Agora, o CFM diz que “ao médico é vedado deixar de garantir a todos os pacientes o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, o qual fica limitado aos pressupostos definidos pela lei”.

Norma suspensa

Em abril, a Justiça Federal em Porto Alegre suspendeu a resolução aprovada pelo CFM que proíbe a realização da chamada assistolia fetal. O procedimento é usado pela medicina nos casos de abortos previstos em lei, como em estupro, com mais de 22 semanas.

A magistrada atendeu a uma ação protocolada pelo Ministério Público Federal (MPF), pela Sociedade Brasileira de Bioética e pelo Centro Brasileiro de Estudos da Saúde. Para a magistrada, o CFM não tem competência legal para criar restrição ao aborto em casos de estupro.

A norma do CFM proibia a assistolia fetal, um procedimento que envolve a injeção de produtos químicos para induzir a morte do feto antes de ser retirado do útero da mulher. O procedimento é recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para casos de aborto legal acima de 22 semanas a fim de evitar, entre outras coisas, que o feto seja expulso com sinais vitais antes da sua retirada do útero.

Na decisão liminar, a juíza argumentou que a norma do CFM entra em conflito com o Código Penal, uma vez que a legislação não estabelece qualquer limite de tempo gestacional para a realização do aborto legal. Ela ressalta que nem a lei que rege o CFM, nem a lei do ato médico conferem ao Conselho Federal a autoridade para impor restrições ao aborto em casos de estupro.

A juíza enfatizou que, sem uma lei civil sobre o aborto e sem restrições na lei penal em relação ao tempo de gestação, o CFM não pode criar proibições não previstas em lei por meio de resolução, extrapolando seu poder regulamentar.

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