É hora de pôr ordem no País, e isso passa pelo respeito às regras básicas da educação – tanto falando de etiqueta como de pedagogia

A cena é inusitada: aproveitando-se do modo remoto das aulas – algo que, tudo indica, será uma alternativa que a pandemia deixará ao ensino –, uma mãe aparece na aula de História para questionar as informações repassadas pela professora sobre a segurança das urnas eletrônicas.

Aconteceu em Goiânia, no Colégio Olimpo, mas poderia ser em qualquer lugar do Brasil atual, em que fanáticos políticos adoradores de políticos fanáticos acham que militantes são os outros.

Em uma série de vídeos (a matéria em que eles estão pode ser acessada clicando aqui), à frente de uma imensa bandeira do Brasil projetada como fundo de cena, aparece Mônica, a mãe de uma aluna, explicitamente “patriota” (como se pode ver), para reclamar do ensino da aula da professora Anna sobre urnas eletrônicas. Para ela, a mestra deveria apresentar “a outra versão”.

Ou seja, segundo a didática da intrusa, ao mesmo tempo a professora deveria dizer que as urnas eletrônicas brasileiras não tiveram nenhuma fraude registrada e que há vários indícios de que foram fraudadas.

Ou seja, ainda, as urnas seriam uma nova versão do gato de Schrödinger, aquele que ao mesmo tempo está e não está dentro da caixa.

Segundo a didática revisada da mãe questionadora, poderíamos pensar também em um planeta Schrödinger, em que a Terra é ao mesmo tempo esférica e plana. Afinal, cada um tem sua opinião e não se poderia deixar constrangidos os alunos filhos de terraplanistas, certo?

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Errado. Está errado. Está errada a escola que dá permissão para uma mãe invadir uma sala de aula, ainda que de forma virtual. É o local de trabalho de uma pessoa e o local de aprendizado de dezenas de outras que não são filhos da invasora. 

Já bastam as muitas dificuldades do ofício de lecionar – encarado com devoção pela absoluta maioria da classe docente. Vêm da função uma natural tripla jornada (preparar, ensinar e avaliar), vêm de décadas os vencimentos pouco atrativos, vem da sociedade a desvalorização da profissão. 

Não deve ser permitido que a isso tudo se acresçam pais e mães aloprados dando pitacos desrespeitosos naquilo que não entendem, porque viram no WhatsApp ou no YouTube um vigarista dando “outra versão”.

É hora de pôr ordem no País, e isso passa pelo respeito às regras básicas da educação – tanto falando de etiqueta como de pedagogia. Que os diretores de instituições de ensino, particulares ou públicas, coíbam com rigor esse tipo de ocorrência.