Ele foi eleito, é bom recordar, “para acabar com tudo isso que está aí”. Não se pode negar que tem alcançado êxito, seja em relação à economia, à saúde e a democracia de seu povo

Na vida, dizem, existem as pessoas que abrem caminhos, que iluminam a estrada, que servem de guia; há também as que montam emboscadas, que bloqueiam a trilha e que escondem a luz.

No meio de um drama pandêmico, tudo de que precisaria uma população desnorteada, apavorada, sem rumo era alguém para fazer o papel das primeiras pessoas do parágrafo acima. Um líder que, com todo o cuidado e com os menores danos possíveis, pudesse conduzir o barco da nação durante a tempestade, até que se alcançassem águas mais tranquilas.

Pois o maremoto causado pela Covid-19 pegou o Brasil pela proa, tendo Jair Bolsonaro como capitão da embarcação. E é incrível a capacidade que o presidente tem de ser um anticomandante.

Bolsonaro conversa com apresentador de programa e equipe na TV A Crítica, em Manaus | Foto: Reprodução de TV

Nesta sexta-feira, 23, pela enésima vez, Bolsonaro usou o conforto de sua bolha bolsonarista, desta vez num estúdio de TV comandado por um comunicador aliado – Sikêra Jr., uma espécie de sub-Ratinho do Amazonas – para ameaçar governadores e prefeitos que estejam “impedindo” o ir e vir das pessoas com “lockdowns”, “toque de recolher”, “falta de liberdade”. As aspas são minhas, porque nada disso ocorreu no Brasil de fato, embora houvesse a letra morta dos decretos que quase sempre foram obedecidos por quem quis, enquanto os órgãos de fiscalização, por incapacidade ou vistas grossas, pouco fizeram para impor as restrições sanitárias.

Este sábado foi outro dia em que políticos de todas as ideologias tiveram novamente de criticar e repudiar as bravatas perigosas do presidente. Bolsonaro é tão anticomandante como é antigovernante. É a maior e também a única autoridade das esferas do Poder Executivo que sonha com o caos, que espera o povo passar fome e se revoltar para, a partir desse momento, ter uma desculpa para acionar “o nosso Exército”.

Tantas vezes vem repetindo isso que as declarações de afronta à Constituição, à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) – que, longe de tirar obrigações do governo federal sobre as condutas na pandemia, as dividiu com Estados e municípios – e às próprias Forças Armadas, colocadas na condição de bibelô de um sujeito que não tem a mínima noção do papel que lhe cabe.

Bolsonaro foi eleito, é bom lembrar, “para acabar com tudo isso que está aí”. Não se pode negar que tem alcançado êxito. Perto dele, o coronavírus é apenas um coadjuvante singelo na destruição da saúde, da economia, da democracia e da paciência de toda a Nação. Resta saber se ganhará o caos como presente de Natal por seu esforço de destruição.