Ascensão de Miguel Díaz-Canel ao poder traz mudanças a Cuba?
24 abril 2018 às 17h31

COMPARTILHAR
O que a posse do presidente representa para a Era Castro

Em 1959, Cuba vivia sob o comando do ditador Fulgêncio Batista, aliado e apoiado pelos Estados Unidos, que liderava uma agenda capitalista na ilha. O cenário muda quando um grupo de guerrilheiros revolucionários liderados por Fidel Castro toma o poder após a renúncia e fuga de Fulgêncio Batista, dando início à Revolução Cubana que acabou consagrando Fidel como presidente da República. Desde então, a ilha fora governada pela família Castro. Primeiramente, por Fidel, que se afastou da presidência em 2008 em função de problemas de saúde. Seu irmão, Raúl Castro, foi responsável pela sucessão até este ano, quando a Assembleia Nacional confirma o nome de Miguel Díaz-Canel como seu sucessor, finalizando quase 60 anos de liderança dos Castro em Cuba.
Perspectivas político-econômicas
A ascensão de Fidel ao poder afastou de vez os Estados Unidos da ilha, que não somente retiraram seu apoio, mas romperam as relações diplomáticas com Cuba, patrocinando um histórico embargo econômico por meio do boicote a todo e qualquer produto produzido naquele país. O embargo trouxe graves problemas à economia cubana que se viu estagnada e sem perspectivas por décadas. Fidel, desta forma, contava com o apoio dos colegas bolivarianos para enfrentar as dificuldades dentro de seu território, tendo seu principal aliado, mais recentemente, na Venezuela de Chávez e, posteriormente, de Maduro.
Raúl Castro, o primeiro líder pós-Revolução depois de Fidel, iniciou um governo discreto, mas que prometia dar início a uma série de reformas e aberturas. O discurso impressionou a comunidade internacional que, depois de anos de isolacionismo, via com esperanças a mudança. A onda de positividade chegou até Washington e acabou convencendo o então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, a reaproximar e reatar os laços com Cuba, em 2015. Na ocasião, uma visita oficial foi realizada e a embaixada dos EUA em Havana foi reaberta.
Desde que os laços foram reatados, houve muita expectativa em torno de mudanças no regime, aberturas, concessões e agilidade nas reformas, que previam estímulos à economia por meio da substituição de importações, fomento às cooperativas, descentralização administrativa e reformas constitucionais. Apesar da euforia, a reaproximação não coloca um fim ao embargo imposto há décadas, interpretado pela comunidade internacional, inclusive, como um embargo humanitário. Esta é uma prerrogativa que cabe exclusivamente ao Congresso dos Estados Unidos, onde a proposta enfrenta fortes objeções e críticas.
Com as eleições americanas de 2016 e a vitória do Partido Republicano, ficou evidente que os esforços empreendidos à época de Obama não encontrariam suporte na agenda política de Donald Trump. As preocupações do novo presidente deslocaram-se para a Coreia do Norte, para a região do Oriente Médio e também para a Rússia, protagonista da polêmica de intervenção nas eleições estadunidenses em que técnicos e especialistas questionam se o resultado implicou na vitória do republicano. Deste modo, na escala de prioridades, Trump não almeja e não considera uma reaproximação com Cuba, uma vez que o país tem um comportamento político que contraria sua base aliada, que atualmente é maioria no congresso americano.
Novo comando, velhas alianças
Apesar de a sucessão tardia implicar em um nome diferente para comandar Cuba, e este movimento despertar os ânimos da comunidade internacional na expectativa de aberturas constitucionais e democráticas, em termos práticos não apresenta novidade. Díaz-Canel esteve ao lado dos Castro por toda sua vida pública, inclusive foi vice-presidente de Raúl de 2013 a 2018.
As declarações de seu discurso de posse explicitam o tom do novo presidente e representam um balde de água fria na perspectiva de mudança que ansiava a comunidade internacional em assistir a guinada nos rumos políticos de Cuba, ao menos de imediato. Em repetidas referências ao legado comunista, o recém-empossado líder reforça: “Assumo a responsabilidade com a convicção de que todos nós, revolucionários, de qualquer trincheira, seremos fiéis a Fidel e a Raúl, atual líder do processo revolucionário”.
O novo presidente cubano, assim, expõe a mesma preocupação em manter viva a memória de uma revolução anti-imperialista que não se sujeita às demandas capitalistas do mercado internacional. Para tanto, o fato de Díaz-Canel ter recebido Nicolás Maduro, presidente da conturbada Venezuela, apenas dois dias após sua posse demonstra mais do que um simples ato de companheirismo, carregando um significado simbólico. Cuba precisa dar manutenção às velhas alianças para sobreviver. Sem capital, depende do petróleo venezuelano, bem como depende do apoio de Putin, na Rússia, e Xi Jinping, na China. Talvez, neste último, o governo cubano deposite boa parte de sua esperança, uma vez que as asas chinesas batem em direção à América Latina.
Contudo, não era de se esperar um discurso diferente no parlamento cubano, considerando que ali estavam as personalidades que formaram politicamente Díaz-Canel. Apesar de frisar que a política externa cubana permanecerá inalterada, seu mandato de cinco anos extrapolará o período de governo Trump, o que pode dar espaço a novas negociações e tentativas de reaproximação entre Cuba e um possível novo governo democrata, caso os republicanos não se reelejam em 2020.
De qualquer forma, as movimentações de Cuba frente aos desafios de um mundo cada vez mais interdependente e cosmopolita devem ser observadas, uma vez que a abertura comercial, mesmo que tímida, inflama na sociedade – sobretudo na parcela mais jovem – o desejo de transformação, principalmente no momento em que os expoentes do sistema revolucionário cubano não estiverem mais presentes para exercer seu poder e os caminhos e consequências do regime levarem o país, inevitavelmente, a uma economia de mercado, como no caso chinês.