Apesar das flexibilizações, Goiás chega ao fim de agosto dentro do melhor cenário projetado pela UFG

26 agosto 2020 às 14h26

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Para o biólogo José Alexandre Felizola Diniz Filho, que coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), nesse momento da pandemia, outros fatores passaram a ter mais importância que o isolamento social
Apesar do atraso na notificação de casos e de óbitos por Covid-19 em Goiás, o estudo divulgado pelo Grupo de Modelagem da Expansão da Covid-19, da Universidade Federal de Goiás (UFG), com a projeção de cenários alternativos de evolução da doença em Goiás até 31 de agosto corresponde ao cenário encontrado. Para o biólogo José Alexandre Felizola Diniz Filho, que coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), o isolamento teve um grande efeito, mas agora outros fatores se mostram até mais importantes.
Ele cita um estudo realizado na Paraíba que demonstra que, na fase inicial, o isolamento social foi de extrema importância, mas agora outras medidas como o uso da máscara e medidas de higiene são essenciais para a diminuição de casos. Isso pode explicar o motivo pelo qual Goiás se manteve no cenário verde mesmo após a flexibilização. “Após os decretos estaduais, as pessoas ficaram mais alertas, foram realizadas testagens em massa e o rastreamento de casos. Essas ações tiveram efeito e isso explica estarmos em um cenário verde e laranja”, explica Felizola.
Sobre a divulgação de novas notas técnicas, o pesquisador pontua que algumas mudanças que influenciam nas projeções precisam ser analisadas. Segundo Felizola, que compõe o Grupo de Modelagem juntamente com a médica e epidemiologista, Cristiana Toscano, e com o biólogo Thiago Rangel, existem incertezas acerca da parte imunológica, questão de imunidade cruzada e estrutura social.
“Estamos vendo que a contaminação está maior nas classes de baixa renda, isso cria uma mudança no número de suscetíveis na população, ou seja, das pessoas que estão potencialmente em contato com vírus”, explica Felizola. Ele acrescenta que, quando a epidemia está no começo, o número de transmissões depende da realidade do fluxo basicamente. Porém, quando o volume de pessoas infectadas passa a ser muito grande, o número de suscetíveis passa a ter muito efeito sobre o cenário.
Classes mais pobres estão mais suscetíveis ao vírus
O pesquisador explica que até 500 mortes foi mais fácil fazer as projeções, depois disso os cenários passaram a ficar mais instáveis e a exigir novas calibrações. “Isso começou a se intensificar a partir de julho, quando se passou a discutir a possibilidade de mais pessoas serem imunes ao vírus. Os testes sorológicos que usamos para a base do número de casos também podem estar subestimados, então se foi apontada uma taxa de 7%, isso pode chegar, na verdade, a 10 ou 12%. Isso diminui o número de suscetíveis e muda a forma da curva”, detalha.
“Estamos esperando uma definição melhor sobre todas essas questões. Já conseguimos chegar a um conjunto novo de parâmetros que leva todos esses pontos em consideração. Vamos testar, por exemplo, assumindo diferentes níveis de imunidade cruzada. Já conseguimos calcular o R (número de transmissões) para diferentes classes sociais. Nós vimos que nas classes A e B o R pode estar em torno de 1 ou menos, enquanto nas classes mais pobres pode ter alcançado 2. Então, preliminarmente, posso dizer que em vez de simular a população como um todo, podemos fazer por classe social”, adianta Felizola.
No entanto, apesar de explorar novas possiblidades em relação às projeções, as dificuldades em relação ao atraso de dados permanecem. Os pesquisadores insistem muito no fato de que não dá para pegar o modelo e simplesmente comparar com a os dados disponibilizados pela Secretaria Estadual de Saúde (SES-GO). “Na última semana, por exemplo, o número de óbitos suspeitos aumentou muito, saltando de uma média de 50 para mais de 200. E isso tem acontecido mais em relação à Goiânia, que não apresentava muitos atrasos”.
“Se a gente somar os óbitos confirmados e suspeitos em Goiânia, teremos mais de mil. Em relação a Rio Verde e Anápolis, que acompanhamos mais de perto, os dados estão muito atrasados. São cerca de 50 óbitos de diferença entre os dados confirmados pelos municípios com o portal da SES-GO. Levando essa questão em consideração, vemos que estamos dentro do cenário verde na última nota”, avalia o professor.
Média móvel
A respeito da média móvel, o pesquisador esclarece que ela serve apenas para corrigir flutuações dos dados no decorrer dos dias. “O padrão de atraso em relação ao número de óbitos em Goiás é de metade dos óbitos por semana. Então, os números divulgados na última semana correspondem, provavelmente, a metade dos óbitos que ocorreram de fato. Se pegar duas semanas, tem de 70 a 75%, e em três semanas até 85% do total de óbitos. Para se ter todos os óbitos leva mais de um mês”, esclarece.
Goiânia
De acordo com o professor, se pegarmos os dados de três semanas e compararmos com os da quarta semana teremos uma ideia sobre o aumento ou diminuição de casos. Em relação à capital, Felizola afirma que foram registrados 142 óbitos na semana 28 e agora tivemos um novo pico de óbitos na semana 32, ou seja, tivemos um buraco entre os picos. “Por isso, é preciso esperar para ver aonde serão encaixados esse alto volume de óbitos suspeitos. Não acredito que sejam todos recentes”, pondera.
“Não sabemos se o aumento no número de casos sem Goiânia é reflexo do aumento das testagens, ou se é realmente um aumento que irá se confirmar posteriormente em um aumento no número de óbitos. Parece que estamos em um momento linear em Goiânia. O R subiu, depois caiu e está em torno de 1 mas continua crescendo. Muitas pessoas acham que o R de 1 esta bom, mas o ideal é o R de 0, pois o 1 indica que vai começar a desacelerar, mas não acabou. Ela está constante”, encerra José Alexandre.