Apenas 2,8% dos estudantes da UFG têm renda familiar per capita acima de R$ 6 mil

31 maio 2022 às 07h34

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92,1% dos acadêmicos vivem em famílias cujos membros ganham até três salários mínimos por mês
Por Giselle Vanessa Carvalho e Ysabella Portela
Apenas 2,8% dos estudantes da Universidade Federal de Goiás (UFG) têm renda familiar bruta per capita acima de R$ 6 mil por mês, segundo a última Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação, realizada pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e entregue ao Ministério da Educação (MEC). O índice em Goiás é abaixo do nacional, onde a média de acadêmicos que vivem em famílias cujos membros ganham mais de cinco salários mínimos por mês chega a 4,3%. No Estado, tal qual acontece em outras localidades do país, a maioria dos estudantes é oriunda de clãs cujos integrantes ganham por mês até 1,5 salário mínimo. Aqui, os que ganham até R$ 1.818 mensalmente somam 74,8%. No Brasil essa taxa é de 70,2%.
O levantamento aponta também que 17,3% dos estudantes da UFG vivem em casas onde os moradores têm renda individual entre 1,5 e três salários mínimos, ou R$ 1.818 e R$ 3.636, por mês. Outros 5,1% têm familiares com rendimentos individuais entre R$ 3.636 e R$ 6.060. Já em 1,9% dos casos as remunerações oscilam entre esse último valor e R$ 8.484; em 0,6% variam entre sete e 10 salários mínimos e em 0,3% a disposição financeira vai de R$ 12.120 a R$ 24.240 por pessoa. No país, esses números são, respectivamente, 16,8%; 5,8%; 2,8%; 0,8% e 0,6%. Nas federais brasileiras ainda há 0,1% de acadêmicos oriundos de famílias onde a renda per capta ultrapassa os R$ 24,2 mil por mês. Na UFG, no entanto, não há registro de alunos onde os membros da família têm essa remuneração.
O fato de 92,1% dos acadêmicos da UFG viverem em famílias cujos membros ganham R$ 3,6 mil por mês reflete nos cursos. A pesquisa, entregue ao MEC em 2019 com base em números de 2018, mostra que os ricos são maioria apenas em sete dos 10 cursos mais concorridos. Por outro lado, os pobres lideram em 95 das 102 graduação ofertadas na universidade goiana. Como mostrou o Jornal Opção, no curso de Medicina, o mais concorrido da Federal de Goiás, 45,7% dos estudantes estão na faixa de vulnerabilidade; no de Direito, 31,7%; Odontologia, 68,1%; Psicologia, 29,5%; Arquitetura e Urbanismo, 53,6%; Engenharias: Civil, 44,3%; Mecânica, 68,5%; Veterinária, 41%; Ciências da Computação, 37,7% e Agronomia 46,9%. No total, 42,83% desses estudantes recebem algum auxílio da instituição e sobrevivem com uma renda familiar bruta per capita de até meio salário mínimo. No geral, o índice de acadêmicos vulneráveis chega a 44,3% nos 10 cursos mais concorridos. No total, considerando todas as graduações, 75,5% dos estudantes da UFG, ou seja, três quartos dos graduandos, são pobres, taxa acima da média nacional. O percentual também é o mais elevado da região Centro-Oeste.
Não por acaso, dificuldades financeiras são entraves na formação de parte substancial dos estudantes. Ainda de acordo com a pesquisa, que é realizada a cada quatro ano pela Andifes, quase 15% dos estudantes da UFG, contra cerca de 11% da média nacional, apontam que problemas econômicos são motivações para trancamento do curso. A questão financeira inclusive aparece no topo do ranking das razões que levam os acadêmicos a cogitarem abandonarem os cursos. Em Goiás, mais de 20% avaliam essa hipótese. No país, quase 35%. Em seguida aparecem o nível de exigência, aproximadamente 18% em Goiás e 29% no Brasil; e, entre outros, a dificuldade de conciliar trabalho e estudo, algo que afeta cerca de 14% dos goianos e 24% na média nacional.
O perfil socioeconômico afeta também o desempenho acadêmico dos alunos. O levantamento identificou que a escassez de recursos financeiros prejudica cerca de 29% dos estudantes da federal de Goiás e 24% dos brasileiros. Esse impacto só não é maior do que a falta de disciplina e hábitos para estudos, condição que afeta negativamente o desempenho para 33% da UFG, índice acima da média nacional, que é aproximadamente de 29%.
Dos acadêmicos da Universidade Federal de Goiás, que possui mais de 28 mil alunos e disponibiliza mais de seis mil vagas por ano nos 102 cursos de graduação, além de oferecer 78 pós-graduações, como mestrado, doutorado e especializações; 63,1% dos graduandos são oriundos de escolas públicas e 41,97% são cotistas. A quinta edição da pesquisa da Andifes revela também que em se tratando da realidade social familiar, a maior parte dos alunos é a primeira geração a entrar para o ensino superior.
No recorte da educação familiar, pais que têm Ensino Médio completo representam 62% dos que têm filhos matriculados na UFG, contra 58,4% de mães. Já quando se analisa a presença de pais com Ensino Superior concluído, esse o número cai drasticamente: pais têm 15,1% e mães 20,4%. Quando se trata de pós-graduação o cenário é ainda menor, com pais em 5,8% e mães com 10,7%, o que interfere diretamente na condição financeira familiar.
Cobrança de mensalidade
O perfil dos estudantes, que se mantém consolidado, com poucas variações ao longo das últimas pesquisas da Andifes, atesta que, além de falaciosa a crença de que universidades federais são redutos de ricos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Nº 206/2019, que tramita na Câmara dos Deputados com parecer favorável do deputado federal Kim Kataguiri (UB-SP) e objetivo de instituir a cobrança de mensalidades nas universidades federais de todo o Brasil, pode afetar grande parte da sociedade brasileira. Para a reitora da Universidade Federal de Goiás, Angelita Lima, as universidades atendem, na maioria dos casos, estudantes de baixa renda e classe média. Exatamente esse último grupo seria o mais penalizado pela cobrança.
“Os estudantes que estão sendo apontados como que podem pagar, são filhos da classe média, são trabalhadores. Em geral, a classe média será profundamente afetada por isso, e os riscos que podem pagar de fato, não estudam nas escolas brasileiras, eles estudam nas escolas estrangeiras”, avalia. Ela refuta também o argumento de que os recursos provenientes das mensalidades custeariam o ensino superior público. “Essa possibilidade de entrada de recursos não é suficiente para manter uma instituição. Um sistema público de ensino não se mantém com mensalidades, ele se mantém como política pública de Estado e com investimento em ensino, pesquisa e extensão. É falacioso achar que isso vai resolver o problema do financiamento das universidades, não vai, como não resolve o problema das universidades privadas, que muitas para existirem lançam mão de programas do Estado, como o Pro-Uni, por exemplo”, crava.
Perfil dos estudantes da UFG de cursos mais concorridos