Acusada de blasfêmia, Mangueira apresenta Jesus com a cara do povo oprimido do Brasil
02 fevereiro 2020 às 13h03
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“Jesus tem se tornado uma espécie de fiador de uma política que incita o ódio”, afirma carnavalesco. Samba também cita o presidente Jair Bolsonaro
Conhecida por sua tradição e narrativas com forte crítica social, a escola de samba Mangueira criou um samba-enredo que já tem tirado o sono de alas conservadoras da sociedade antes mesmo do Carnaval. Trata-se de uma narrativa sobre um Jesus que não está no retrato. Essa é a definição do carnavalesco da escola, Leandro Vieira, de 35 anos, em entrevista ao Estadão.
Com uma crítica a elementos da política, a verde-e-rosa busca alcançar o segundo título consecutivo. Enquanto isso, setores religiosos acusam a escola de blasfêmia.
Representatividade
Para o carnavalesco, a ideia é apresentar um Jesus humano, com a cara do povo oprimido do Brasil. “Mais recentemente, em nome de um avanço conservador e da representatividade política de determinados setores políticos da sociedade brasileira, Jesus tem se tornado uma espécie de fiador de uma política que incita o ódio”, defende.
Um Jesus de mãe humilde e pai desempregado, que desce e sobe as ladeiras da favela: esse é o Jesus da mangueira. Mas a polêmica não para por aí, o samba cita ainda o nome do presidente Jair Messias Bolsonaro e diz: “Favela, pega a visão. Não tem futuro sem partilha. Nem Messias de arma na mão”.
Confira o samba-enredo 2020:
Autores: Manu da Cuíca e Luiz Carlos Máximo
Mangueira
Samba teu samba é uma reza
Pela força que ele tem
Mangueira
Vão te inventar mil pecados
Mas eu estou do seu lado
E do lado do samba também
Eu sou da Estação Primeira de Nazaré
Rosto negro, sangue índio, corpo de mulher
Moleque pelintra no Buraco Quente
Meu nome é Jesus da Gente
Nasci de peito aberto, de punho cerrado
Meu pai carpinteiro desempregado
Minha mãe é Maria das Dores Brasil
Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira
Me encontro no amor que não encontra fronteira
Procura por mim nas fileiras contra a opressão
E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão
Eu tô que tô dependurado
Em cordéis e corcovados
Mas será que todo povo entendeu o meu recado?
Porque de novo cravejaram o meu corpo
Os profetas da intolerância
Sem saber que a esperança
Brilha mais na escuridão
Favela, pega a visão
Não tem futuro sem partilha
Nem Messias de arma na mão
Favela, pega a visão
Eu faço Fé na minha gente
Que é semente do seu chão
Do céu deu pra ouvir
O desabafo sincopado da cidade
Quarei tambor, da cruz fiz esplendor
E Ressurgi no cordão da liberdade
Mangueira