11 polêmicas da história das Copas
28 junho 2014 às 10h26

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De Garrincha a Suárez, passando por Maradona e Zidane, os fatos mais especulados da trajetória dos Mundiais
Elder Dias
A mordida do uruguaio Luis Suárez no zagueiro italiano Giorgio Chiellini já se consagrou como a maior polêmica deste Mundial e uma das que serão lembradas através dos tempos. Mas cada Copa do Mundo deixa histórias de memoráveis de todos os tipos. Inclusive irônicas, bizarras e antiéticas. O caso Suárez e outros dez estão registrados nestas páginas, por uma ordem subjetiva de importância.
1 – Um não gol que valeu um Mundial
Geoff Hurst já era o artilheiro da Copa de 66 e tinha feito dois gols naquela final de 1966 quando, aos 9 minutos do primeiro tempo da prorrogação, com o jogo empatado por 2 a 2, o inglês acertou um chute após cruzamento vindo da direita. Bola vai por cima do goleiro Tilkowski, atinge o travessão e cai no solo perto da linha do gol e volta. A seguir, é afastada pelo alemão Weber. Mas o árbitro validou o lance como gol e a Inglaterra, em seus domínios, conquistou assim seu único Mundial. Nenhuma imagem ou vídeo captou o momento exato em que a bola toca o chão, mas estudos garantem, pelos fotogramas, que a bola não ultrapassou a linha. O English Team foi campeão com um não gol. Por ironia, na Copa de 2010, o inglês Lampard acertou o travessão e a bola desceu além da linha, mas o juiz não validou o gol. O adversário? A mesma Alemanha, que ali eliminava os britânicos. Para concluir o “castigo”, foi Hurst quem sorteou a Inglaterra para o “grupo da morte” da Copa de 2014, com Costa Rica, Uruguai e Itália. O resultado já é conhecido.
2 – A ditadura foi madrinha do título
Futebol e política nunca caminharam longe um da outra na história. Mas também nunca estiveram tão umbilicalmente unidos como na Copa de 78. Foi o Mundial da ditadura. Enquanto 30 mil argentinos desapareciam, o general Jorge Videla utilizava-se do evento para promover o governo. Arbitragens suspeitas foram o de menos: o episódio mais contestado diz respeito ao jogo Argentina 6 x 0 Peru. Goleadas acontecem, mas não são tão comuns. Essa gerou uma alta desconfiança porque os “hermanos” jogaram sabendo que precisavam fazer pelo menos quatro gols para irem à final eliminando o Brasil. E foi muito fácil chegar ao placar. Boatos sobre a “entrega” do jogo pelo Peru surgiram, realçados pelo fato de que o goleiro Quiroga era argentino de nascimento. Mas algo maior do que pessoas poderiam “causar” o resultado: como explica o professor peruano Carlos Ugo Santander (Faculdade de Ciências Sociais/UFG), Argentina e Peru eram aliados políticos e militares. Há especulações de que uma visitinha militar pode ter intimidado os jogadores da terra dos incas. O fato é que a primeira Copa da Argentina é também a mais suspeita de todas as já conquistadas. Tanto que o Brasil, 3º colocado, ostenta o título (igualmente contestável) de “campeão moral”.
3 – Mão, “de Deus”; fair play, nem tanto
Diego Maradona foi um gênio em campo: tinha sempre soluções extraordinárias, para o bem e para o mal. Foi assim que, em um lampejo, nas quartas de final da Copa de 86, ele achou a saída ideal para uma bola mal cortada, jogada para o alto, pelo zagueiro Steve Hodge, da Inglaterra. Maradona correu para disputar a bola com o goleiro Peter Shilton, 20 centímetros maior, e “cabeceou” com o punho. O árbitro tunisiano Ali Bin Nasser validou o gol, que ficou conhecido como “La Mano de Dios”, batizado assim pelo próprio autor. Os “hermanos” ainda viviam a ressaca do vexame diante dos britânicos na Guerra das Malvinas e a vitória no futebol, apesar do gol de mão, foi festejada mais ainda por isso. O feito, moralmente indigesto, é reverenciado na Argentina, onde até uma igreja foi fundada, em 1998, para prestar uma paródia de culto ao craque. Cada um tem o bezerro de ouro que lhe convém.
4 – A convulsão e a conspiração
Faltavam poucas horas para a decisão contra a França quando o comunicado chegou à imprensa: Ronaldo estava cortado do jogo e seria substituído por Edmundo. Brasileiros e estrangeiros ficaram estupefatos com a nota. Mais ainda quando viram Ronaldo entrando em campo. E a estranheza continuou ao observar a apatia do Fenômeno — bem como de toda a seleção — durante o jogo. No final, uma goleada francesa por 3 a 0 com show de Zidane, além de uma suspeita no ar: o que estaria por trás de todo aquele episódio? Muitos não se convenceram até hoje da versão oficial — a que assegura que Ronaldo teve uma convulsão, e que isso levou apreensão a todo o grupo de jogadores, afetando o desempenho de todos no jogo decisivo. O que não faltam são “teorias de conspiração” sobre a final da Copa de 1998. Mas o fato, mesmo, é que a França jogou bem melhor.
5 -De volta ao topo, mas dopado
Aos 33 anos e após um escândalo por uso de cocaína que o levou a uma suspensão do futebol, Maradona queria provar que ainda podia conduzir a Argentina a um título mundial, como em 86. E jogou como em seu auge nas duas partidas iniciais da Copa de 94. Duas vitórias: 4 a 0 sobre a Grécia — jogo da célebre imagem de Dieguito correndo raivosamente em direção à câmera para comemorar seu gol — e 2 a 1 sobre a Nigéria. Depois desse jogo, a Fifa divulgou que um argentino havia sido pego no antidoping: era Maradona. Ele consumira cinco substâncias proibidas para o futebol, todas da família efedrina, presente em descongestionantes nasais e que também dão estímulo adicional aos atletas. Sem o “Diez”, a Argentina perdeu o último jogo da fase classificatória, para a Bulgária (2 a 0), e saiu do Mundial dos EUA em seguida, nas oitavas, derrotada pela Romênia (3 a 2). Até hoje tem argentino que acredita que foi complô. Alguns chegam a jurar que foi coisa da CIA.
6 – Suárez, o boca nervosa
Dacnomania. Isso foi a causa da saída de Luis Suárez da Copa de 2014. O jogo estava 0 a 0, já no segundo tempo, e o Uruguai precisava de pelo menos um gol para se classificar diante da Itália. Era, portanto, um mata-mata em partida classificatória. A partida já estava no último quarto do jogo quando, dentro da área, o atacante se agarra com o italiano Giorgio Chiellini e, ato contínuo, crava-lhe os dentes. Foi a terceira vez que Suárez, o maior craque da Celeste, cometia esse tipo de agressão na carreira. O Uruguai ganhou o jogo, mas “Luisito” perdeu para a dacnomania, um tipo de compulsão que faz o indivíduo morder alguém ou a si próprio.
7 – O segredo do “milagre”
A fantástica Hungria de Puskas era favoritíssima ao título de 54. Mas os húngaros, que na fase inicial massacraram a Alemanha Ocidental por 8 a 3, perderam a final para o mesmo adversário, no jogo que ficou conhecido como “o Milagre de Berna”. Em 2010, o historiador esportivo Erik Eggers achou uma explicação para o “milagre”: os alemães podem ter recebido uma ajuda extra de um programa secreto de doping. Havia conversas sobre essa especulação, que, com o estudo da Universidade de Humboldt, em Berlim, ganhou ares científicos. Existem indícios de que os atletas germânicos tenham recebido o metanfetamina pervitin, famoso estimulante da época, usado por soldados alemães durante a 2ª Guerra Mundial para evitar a fadiga. Na época, não havia testes antidoping. O título que simbolizou o renascimento do país — então dividido — após a devastação causada pela 2ª Guerra Mundial.
8 – A testemunha sumiu e o Brasil foi bi
Com Pelé contundido logo na segunda partida, contra a Checoslováquia, Garrincha era a grande estrela do Mundial de 62. Na semifinal contra o Chile, ele agrediu com um chute (ainda que leve, segundo testemunhas) o adversário Rojas. Acabou expulso. Desespero no Brasil. Como na época não havia suspensão automática, o craque teria de passar por um julgamento. Porém, a única testemunha oficial da agressão, o bandeirinha uruguaio Esteban Marino, não apareceu para depor. Garrincha, então, foi absolvido e o Brasil venceu os checos na final por 3 a 1 na decisão. Anos depois um ex-árbitro, Olten Ayres, suplente naquela Copa, disse que o sumiço de Marino foi uma manobra da então Confederação Brasileira de Desportos (CBD) para Garrincha jogar a decisão. Ele acusou o árbitro titular do Brasil, João Etzel, de levar dinheiro a Marino e também ter embolsado US$ 10 mil pela ação.
9 – Perdeu a cabeça usando a cabeça
No placar, Itália 1 x 1 França. De repente, no meio da final daquela Copa do Mundo de 2006, a cena bizarra: como um bode nervoso, o gênio da bola Zinedine Zidane, que havia o gol francês, de pênalti, atinge o italiano Marco Materazzi com uma cabeçada no peito. Expulsão imediata. A partida termina empatada e vai para os pênaltis. Itália campeã. Um dos maiores jogadores de todos os tempos encerrava ali e assim, com um episódio surreal, sua carreira no futebol. Mais tarde se descobriria a razão da agressão — Materazzi dissera, como provocação, palavras obscenas sobre a irmã do craque.
10 – Compadrio germânico
Alemanha e Argélia têm encontro marcado pela segunda vez em Copas do Mundo nesta segunda-feira, 30. O primeiro foi há 32 anos, na Espanha. Vitória surpreendente por 2 a 1 dos africanos, a sensação entre as estreantes daquele Mundial. Mas eles acabariam estranhamente eliminados na 1ª fase. Após ganhar do Chile abrindo a última rodada, precisavam que a líder Áustria não perdesse para a Alemanha, que logo fez um gol, com Hrubesch. Depois disso, as equipes fizeram pouco mais do que tocar a bola. E foi assim o restante do jogo. Ambas se classificaram e os jogadores, de países vizinhos e mesmo idioma, saíram de campo aos abraços, ante os protestos dos torcedores, até mesmo de alemães. O episódio ficou conhecido como a “Vergonha de Gijón”, cidade-sede da partida.
11 – Vistas grossas ao dono da casa
Como pôde a até então expressiva Coreia do Sul chegar às semifinais de uma Copa do Mundo? É verdade que isso ocorreu em casa — o evento de 2002 foi o único até hoje com dois países-sede, Coreia e Japão —, mas não há como não pensar que o feito só tenha ocorrido por ajuda clara da arbitragem. Nas oitavas de final, os sul-coreanos enfrentaram a Itália. Na prorrogação, o craque Totti foi expulso ao tomar o segundo cartão amarelo por supostamente ter simulado um pênalti. Depois, outro italiano, Tommasi, recebeu passe e fez o gol. O juiz marcou impedimento que não existiu. Ahn, que por coincidência jogava no Perugia, da Itália, fez então o gol que classificou a Coreia. Contra a Espanha, nas quartas de final, foi pior. Primeiro, o árbitro egípcio Gamal Ghandour viu falta inexistente no único gol, espanhol, no tempo normal. Na prorrogação, anulou o gol de Morientes que levaria a Espanha às semifinais, dizendo que a bola cruzada para ele passara além da linha de fundo. Por fim, na disputa de pênaltis, o goleiro Lee se adiantou escandalosamente para a única defesa de cobrança e o juiz fez vistas grossas. Se os erros foram culposos ou dolosos, não se sabe e talvez nunca se saberá.