“Falta de participação da mulher na política é reflexo da própria constituição da sociedade”

03 abril 2022 às 00h02

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Vereadora de Palmas e pré-candidata a deputada observa que, quando o sexo feminino ocupa o espaço de poder, enriquece o diálogo
A vereadora de Palmas e pré-candidata a deputada estadual professora Iolanda Castro (PTB) enxerga na crise de fechamento dos partidos para os deputados algo interessante que aponta para uma mudança importante na prática política que pode contribuir para mudar a velha tradição do carreirismo político, ainda bem forte no Tocantins. “Esse formato eu acho que é mais humano, mais justo, do ponto de vista do compromisso do mandato com os interesses sociais, da mudança, da renovação”, avalia a vereadora que entende que a decisão dos partidos pode ajudar a criar uma nova cultura política.
A vereadora defende que os partidos precisam repensar os espaços partidários das mulheres, que segundo ela, candidaturas femininas não dispõem de financiamento compatível. “Ainda é humilde a forma e participação financeira que se coloca numa campanha feminina. Não temos dificuldade nenhuma de administrar, de legislar, a nível de instituição política. Eu falo que quem consegue administrar uma casa, educar um filho, de estar ali no dia a dia, na hora que pare, amamenta, não vai ter dificuldade, porque aí são relações e conhecimentos que vamos precisar de ter. Isso a gente tira de letra’, comenta a parlamentar, entusiasmada com o projeto de disputar uma cadeira na Assembleia Legislativa.
Nesta entrevista ao Jornal Opção, Iolanda relembra que quando criança, levada pelos pais, participou de coleta de assinatura pela criação do Estado do Tocantins, episódio que a faz olhar para o Estado com um sentimento de pertencimento e desejo de contribuir com o seu desenvolvimento. “Quando eu vejo Palmas com 33 anos e o Tocantins fazendo 34 eu me recordo quando criança colocada pelo meu pai Antônio Comprido e a minha professora Maria do Bomfim, eles colocavam a gente para colher assinatura para dividir o Estado do Tocantins. E a gente conseguiu este feito. Não preciso repetir esta história porque ela é grandemente falada. Após a criação do Tocantins começa a implantação de Palmas que hoje virou este espetáculo de cidade. Esse diamante do cerrado, porque Palmas é uma cidade muito linda, muito acolhedora”, comenta.
Iolanda Pereira Castro é tocantinense de Porto Nacional. Com formação em Farmácia pela Universidade Federal de Goiás (UFG), em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) e em Psicologia pela Ceup/Ulbra, ela compreende a política como amor em ação, é caridade em maior alcance, e para que aconteça humanamente a participação é fundamental.
O que a motiva ser candidata a deputada estadual?
A motivação vem de um contexto maior, vem de um desejo coletivo. Você conhece a minha luta, estou na política desde de 2010, estudando a política do Tocantins, buscando compreender a política palmense. Em 2012 fui candidata, fiquei como primeira suplente. Em 2016 repetimos o mesmo desempenho ficando na primeira suplência e em 2020 resultado de todo um trabalho que desenvolvemos, formos agraciados com esta vitória. Em nossa atuação parlamentar abraçamos causa de cunho estadual e com isso nosso nome foi ganhando projeção. Principalmente na defesa do meio ambiente, regularização fundiária, saúde, educação, dentre outras áreas que temos atuado. Onde tiver oxigênio tem a vereadora Iolanda Castro com sua atuação na construção do bem comum e exercício da cidadania. Esse envolvimento gerou um convite para integrar um projeto político mais amplo a que tenho me dedicando. Agora é preciso criar as condições, pois não basta só querer participar, é preciso ter um grupo que possar dar sustentação e viabilidade ao projeto. Compreendo que a política é uma das atividades que não se faz sozinho. Levei o convite ao coletivo ao qual faço parte, que topou o desafio. Ainda temos algumas decisões a tomar, mas o mais importante já decidimos. Serei candidata a deputada estadual.
Tudo indica que essa será uma das eleições mais disputadas do Legislativo Estadual. O que foi determinante para a sra. aceitar o desafio de participar?
O contexto de desafios que Estado enfrenta e a importância de poder participar desse processo. Lógico que me entusiasma o chamamento que veio das pessoas que acompanham o meu trabalho. A nossa atuação como vereadora é que fez com que membros da comunidade que participam ativamente das decisões políticas percebessem que o nosso trabalho tinha um alcance estadual, o que nos deixa contente em poder fazer muito mais por Palmas e pelo Tocantins.
Como vereadora de Palmas, pela visibilidade que a cargo oferece representa alguma vantagem em relação aos demais candidatos na disputa por uma cadeira na Assembleia?
Quem é vereador em Palmas não leva nenhuma vantagem em relação a outros candidatos ao cargo de deputado. Quem leva vantagem nesse tipo de disputa é quem tem um brilho diferenciado, quem gosta de gente. Quem quer fazer o bem comum. Quem tem amor pelo povo. Esse ou essa leva vantagem em relação às demais pessoas. Quando você se dispõe a ser um candidato, quer seja a vereador, deputado ou presidente de bairro, qualquer que seja, o que você precisa para ter um brilho diferenciado na concorrência é gostar das pessoas. É constitucional, o poder é do povo. É ele quem constitui o poder que os políticos representam. Quem tem projeto de atuação em defesa dos interesses da coletividade, sai na frente.
Como a sra. avalia a postura de alguns partidos de restringir legenda para deputados, o que provocou uma crise na base do governo?
Nós estamos tendo modificações não apenas na estrutura do processo político, mas já começamos a perceber modificações na organização, no modo de pensar, no comportamento dos gestores, dos legisladores e legisladoras. Esta questão está aflorando agora, mas o movimento vem de longe. No pleito passado de 2020 nós participamos de uma inovação na forma de eleição para a Câmara de Palmas. Foi um paredão mesmo formado por novatos, onde percebemos uma renovação significativa. Isso se deu pelo desgaste do formato anterior, pois quando você entra num grupo que tem um político com mandato, quem ainda não participou não topa entrar. Isso aconteceu na eleição passada para vereador. hoje nós percebemos que este formato está acontecendo para deputado também. Isso é muito interessante. Hoje não basta ter apenas puxador de voto, que tem mandato, tem condições financeiras, mas não se elege sozinho. Hoje, o mais importante é ter grupo, onde ninguém seja desfavorecido em detrimento do outro. Aquele que tem menos é de extrema importância para aquele que está em primeiro lugar. Não basta o que está em primeiro lugar ter muita votação se os demais não forem contemplados também.
“Considero um formato mais humano do ponto de vista dos interesses sociais”
É o começo de uma transformação ainda que bem pequena, na forma de fazer política?
Esse formato eu acho que é mais humano, mais justo, do ponto de vista do compromisso do mandato com os interesses sociais, da mudança, da renovação. É um modelo que oportuniza mais a mais pessoas participar do processo. Pode ser o começo de uma grande mudança na forma de fazer política a partir de uma postura dos partidos que exigem maior comprometimento com os seus ideais. Uma mudança que vem das bases e que está alcançando todas as esferas de disputas de cargos eletivos.
Por que a participação da mulher na política tocantinense ainda é pouco representativa?
Essa pouca inserção não é só da mulher tocantinense. Eu falo da mulher brasileira. Fala-se muito, principalmente em datas comemorativas, do dia da mulher, mulher seu lugar é onde você quiser. A gente precisa ser mais pés no chão com esta história. Eu como filha de historiadora, minha mãe é professora, historiadora. Para explicar melhor essa pouca representatividade da mulher na política, precisamos voltar um pouco na história. Tem um pouco mais de 80 anos que nós mulheres conquistamos o direito ao voto. Um pouquinho atrás para a mulher votar só se fosse autorizada pelo esposo. Se estivermos numa corrida é como se, deu o sinal da largada, dispara-se alguém lá na frente para votar, para mandar no voto e nós (mulheres) ainda estamos tentando sair do ponto de partida. Então, essa falta de participação da mulher, não tenho dúvida que é um reflexo da própria constituição da nossa sociedade no reconhecimento desses direitos. Reconhecemos que tem havido um trabalho para ampliar a participação da mulher, mas, porém, a pedagogia da sedução ainda não alcançou suficiente as mulheres para participar dos espaços de poder.
As mulheres reclamam da falta de equilíbrio na realização das atividades domésticas que a sobrecarregam. A chamada tripla jornada é também um inibidor?
Quando uma mulher vai participar de uma reunião política ela tem que ter deixado pronto em casa, a comida, roupa lavada, casa lavada, o filho na escola e às vezes está lá reunião e lembra que tem que buscar o filho e precisa sair correndo. Então, nós temos um sequencial ainda no nosso cabide de atribuições que imposto às vezes até pelo costume social, tem muitas atribuições que temos que fazer de maneira simultânea, de forma paralela. Esse pode ser um dos fatores? Sim. Tem mudado? Tem. O que eu vejo que não é somente participar, é sentir a dor de fato do que é ser uma pessoa que não tem seus direitos garantidos, daquela mulher que precisa de projetos de lei para prevenir um abuso e uma violência doméstica, são mulheres que sentem no dia a dia a dor e a delícia de ser mulher e que precisa estar lá para defender o que lhe é cabível. Por que essa pouca participação? É um processo cultural, histórico, já vem mudando, mas o que a gente percebe é que quando o espaço de poder é ocupado por mulher o diálogo é enriquecido quando participado com os pares, que são os homens. Somos maioria da população, somos maioria dos eleitores, mas ainda precisamos de uma motivação para essa participação.

O que é mais difícil na política para as mulheres, enfrentar a estrutura partidária comandada por homens ou convencer a mulher a votar em mulher, uma vez que o eleitorado feminino confia mais nos homens?
No contexto atual é preciso uma estrutura mínima para se fazer uma campanha. Lógico, você pode até tentar, por idealismo, mas sofre muito mais. Do ponto de vista do partido, nós temos leis e não precisaria, que assegura um percentual de candidaturas femininas. Inclusive com sansões do ponto de vista eleitoral, caso não sejam cumpridas. Teoricamente não precisaríamos, mas na prática precisamos. Mesmo sendo desse jeito ainda é humilde a forma e participação financeira que se coloca numa campanha feminina. Se houver estímulo à participação quando ocupamos os espaços de poder e de decisão realçamos a estrela de maior grandeza que somos. Não temos dificuldade nenhuma de administrar, de legislar, a nível de instituição política. Eu falo que quem consegue administrar uma casa, educar um filho, de estar ali no dia a dia, na hora que pare, amamenta, não vai ter dificuldade, porque aí são relações e conhecimentos que vamos precisar de ter. Isso a gente tira de letra.
O Parlamento tem um rito próprio que às vezes parece uma farsa, onde tudo é muito urgente e importante, mas onde quase nada acontece. Como a senhora reagiu a este rito do Parlamento, chegou a se decepcionar?
Decepção a gente tem na vida. Risco a gente tem quando nasce. Quando a gente fala me decepcionei parece que a gente tira um pouco da nossa responsabilidade. Quando na verdade nós somos o todo, somos coletivo. Gosto dessa máxima africana, eu sou porque nós somos. Não tem decepção, tem muito aprendizado. Defendo a filosofia que na vida, algumas vezes eu ganho, outras vezes eu aprendo, mas nunca perdi. Então, hoje como vereadora dessa capital, na luta que foi, que não foi fácil, eu digo que estamos aprendendo muito.
Essa é a segunda vez que Palas é administrada por uma mulher. O que a gestão da Cinthia pode contribuir para uma maior participação da mulher na política tocantinense?
A questão não sei se está nas mulheres. Vemos que a prefeita Cínthia Ribeiro realiza uma gestão extremamente técnica com um olhar generoso, humano e tendo que enfrentar um desafio atrás do outro. Foi uma gestão que pegou um período atípico no mundo e diante de uma capacidade de analisar o que era melhor para aquele momento, para que vidas fossem salvas porque vidas importam, ela conseguiu gerir saúde, educação, infraestrutura, claro, priorizando algumas áreas para que vidas que importam fossem salvas. E digo a você, hoje nós estamos com destaque na educação, somos destaque na saúde, e outros setores. E veja bem, ela (Cinthia) além de gestora é mãe nova, tem bebê em casa, e em nenhum momento deixou a cidade de Palmas sair do patamar de crescimento e desenvolvimento econômico, social e político. A de convir que a prefeita está fazendo o dever de casa, com muita maestria.
No próximo mês Palmas completa 33 anos, o que significa a comemoração desta data para a jovem capital cada vez mais madura?
Sou muito emotiva quando falo de Palmas, porque sou bem bairrista. 33 anos de Palmas são muitas vitórias. Eu sou aquela que acredita que a felicidade está no dia-a-dia, de momento a momento e não somente lá ponto de chegada. Quando eu vejo Palmas com 33 anos e o Tocantins com um pouco mais eu me recordo quando criança colocada pelo meu pai Antônio Comprido e a minha mãe professora Maria do Bomfim, eles colocavam a gente para colher assinatura para dividir o Estado do Tocantins. E a gente conseguiu este feito. Não preciso repetir esta história porque ela é grandemente falada. Após a criação do Tocantins começa a implantação de Palmas que hoje virou este espetáculo de cidade. Esse diamante do cerrado, porque Palmas é uma cidade muito linda, muito acolhedora. Então quando eu vejo o número de pessoas que vem das mais diversas partes do mundo, e encontra respaldo profissional, emocional e político também aqui em Palmas; quando eu vejo os nossos índices de desenvolvimento, eu friso muito a saúde e educação que são áreas que estou sempre muito atenta, porque elas ramificam também; e quando eu vejo hoje um novo tempo, porque, me refiro agora ao Estado, de uma pessoa tentando trazer para o Tocantins esse sentimento de pertencimento, essa terra é nossa, vamos retomar isso daqui, podemos analisar que estes 33 anos foram de muitas vitórias. Desafios temos muitos, mas o que precisamos é ampliar o olhar e não somente criticar, mas cada um contribuir, seja como cidadão, como profissional liberal, seja como político, mas todos contribuir, porque essa terra é nossa. Fazendo que ela emerja cada vez mais trazendo oportunidades para todos. Oportunizando que a gente construa as oportunidades