Goiânia enfrenta uma das piores crises em sua rede de saúde nos últimos anos. O secretário de Saúde do Estado de Goiás, Rasível dos Santos, disse em entrevista ao Jornal Opção, sua preocupação com a situação. Segundo ele, o colapso na capital afeta não apenas os cidadãos goianienses, mas toda a estrutura de saúde estadual, que está sobrecarregada devido à ineficiência da administração municipal. O secretário destacou que a concentração de 21% da população do estado em Goiânia amplifica o impacto de qualquer crise local nos serviços estaduais de saúde.

O cenário caótico se deve, em grande parte, ao acúmulo de dívidas com instituições filantrópicas, hospitais privados e médicos terceirizados. A Prefeitura de Goiânia não tem conseguido honrar com os compromissos financeiros, e a dívida atual com esses prestadores de serviço supera os R$ 260 milhões. Apesar de o Secretário de Saúde de Goiânia, Wilson Pollara afirmar que já quitou 70% desse montante, restando R$ 80 milhões a serem pagos, diretores hospitalares e sindicatos questionam essas informações. 

“A falta de profissionais em Goiânia e a sobrecarga nos prontos-socorros e unidades de urgência está comprometendo a assistência em todo o Estado”, afirmou Rasível. Ele também mencionou que o mesmo número de leitos é utilizado tanto para emergências como para internações clínicas e epidemias, como a recente crise de Influenza, o que torna a situação insustentável.

Verbas federais e inoperância municipal

De acordo com o secretário, a capital goiana recebe mais recursos federais para a saúde do que o próprio Estado de Goiás. “Goiânia possui um teto de média e alta complexidade maior do que o de Goiás. Enquanto o Estado recebe cerca de 400 milhões de reais, Goiânia recebe mais de 500 milhões”, apontou. A questão levantada por Rasível é: para onde está indo todo esse dinheiro? “Só o Hospital Municipal da Mulher e Maternidade Célia Câmara recebe milhões de reais por ano. São mais de 10 milhões mensais para manter os serviços funcionando. Mesmo assim, a população enfrenta filas intermináveis e atendimentos precários”, questionou ele.

Além disso, o Estado já destina 14% de sua receita à saúde, e, segundo o secretário, não pode assumir mais responsabilidades que cabem ao município. “O Estado não pode ser responsabilizado pela inoperância da capital. A Prefeitura tem recursos, mas não os aplica onde deveria. Isso precisa ser investigado”, afirmou.

Investigação e insegurança na gestão municipal

A entrevista também abordou uma possível auditoria nas contas da saúde de Goiânia. O secretário afirmou que tanto o Tribunal de Contas do Município quanto o Ministério Público irão ser acionados para verificar a destinação dos recursos. “Algo não está batendo nessa questão. Goiânia coloca 27% de sua receita na saúde, mas os serviços essenciais não estão funcionando. Há uma disparidade entre o que é gasto e o que é oferecido à população”, disse Rasível.

Ele também mencionou que o governo estadual já acionou diversos órgãos de controle externo, como o Ministério Público e o Tribunal de Justiça, para assegurar que a Prefeitura cumpra suas obrigações. “O prefeito de Goiânia tem mandato até 31 de dezembro de 2024. Ele não pode abandonar a cidade por ter perdido a eleição. É responsabilidade dele garantir que os serviços de saúde continuem funcionando até o último dia de sua gestão”, alertou o secretário.

Outro ponto abordado na entrevista foram as demissões em massa no município logo após as eleições. Cerca de duas mil pessoas foram dispensadas, gerando ainda mais instabilidade nos serviços. Embora o prefeito tenha recuado nas demissões, a insegurança já estava instaurada. “Muitas dessas pessoas tiraram férias, desmobilizando ainda mais o sistema de saúde. Isso mostra uma falta de liderança e compromisso com a população”, criticou Rasível.

A falta de comando, segundo o secretário, não apenas impacta o atendimento imediato, mas também afeta o planejamento de médio e longo prazo. “A saúde é um serviço essencial. Não se pode abandonar a gestão dessa área tão vital para a sociedade”, enfatizou. 

Sobrecarga nos hospitais estaduais

A ineficiência da gestão de saúde em Goiânia tem forçado o governo estadual a assumir responsabilidades que, de acordo com Rasível, não cabem ao Estado. “Nossos hospitais estão sobrecarregados. As maternidades estaduais, como o Hospital Estadual da Mulher (HEMU) e o Hospital Estadual e Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, tiveram um aumento de 63% e 33% no número de atendimentos, respectivamente. Isso é reflexo direto da incapacidade do município de manter seus serviços em funcionamento”, explicou.

Além disso, segundo Rasível, Goiânia perdeu 117 leitos de UTI devido a irregularidades nos repasses do Fundo Municipal de Saúde. Esses leitos são essenciais para tratar pacientes em estado grave, especialmente em momentos de pressão sazonal, como surtos de dengue e influenza. “A cidade está um caos, suja, com aumento de casos de influenza e uma baixa cobertura vacinal. Sem leitos suficientes e com a ineficiência da atenção primária, estamos enfrentando uma verdadeira tempestade perfeita para o colapso total”, lamentou o secretário.

Maternidades em colapso e dívidas milionárias

Outro ponto da crise em Goiânia são as maternidades. De acordo com Rasível, a Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc), responsável pela gestão de três maternidades da cidade, enfrenta uma dívida de R$ 127 milhões com a Prefeitura. Desse valor, R$ 86,5 milhões são referentes a obrigações vencidas, enquanto o restante inclui passivos trabalhistas. A dívida está comprometendo até mesmo a alimentação dos pacientes e acompanhantes. “Faltam insumos básicos, como luvas e máscaras, o que torna a situação ainda mais crítica”, disse o secretário.

Ele também mencionou que há negociações em andamento entre a Fundahc e a Prefeitura, com a expectativa de que até o fim da semana um repasse de R$ 10 milhões possa ser feito para aliviar parte da dívida.

A vereadora Aava Santiago também faz parte da tentativa de ação e informou ao Jornal Opção, que, na última segunda-feira, 21, o documento entregue ao vice-governador de Goiás, Daniel Vilela, não solicitava uma intervenção na crise da saúde, mas sim medidas imediatas para evitar a paralisação das UTIs das maternidades gerenciadas pela Fundahc. Durante o encontro, Daniel Vilela entrou em contato com Rasível e Aava também conversou com o secretário de Saúde sobre a urgência do repasse de recursos.

Segundo Rasível, o Estado está trabalhando no limite de sua capacidade para absorver a demanda crescente, mas que essa não é uma solução sustentável a longo prazo. “A responsabilidade pela saúde é compartilhada, mas o município precisa fazer sua parte. Não podemos continuar sobrecarregando os hospitais estaduais enquanto a Prefeitura de Goiânia não cumpre suas obrigações”, afirmou.

Além disso, o secretário reforçou a importância de ações preventivas, como a vacinação, especialmente em um momento em que os casos de influenza estão aumentando. “Temos vacinas suficientes, mas faltam profissionais para vacinar. As salas de vacinação estão sem equipe, o que é inaceitável em um momento tão crítico”, alertou.

Para o secretário Rasível dos Santos, a solução passa pela responsabilização do município e pela atuação dos órgãos de controle. “Os hospitais de Goiânia estão colapsando porque a Prefeitura não está fazendo os repasses necessários. Estamos em constante contato com os órgãos de controle para garantir que o dinheiro chegue onde precisa chegar”, finaliza.

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