O diabetes tipo 1 e 2 são condições que afetam milhões de brasileiros, mas, por trás dos números, estão vidas reais — cheias de desafios, medos e também coragem. Nesta reportagem, reunimos relatos concedidos ao Jornal Opção nesta quinta-feira, 13, por mulheres de diferentes idades e profissões, que compartilham como descobriram a doença e como ela transformou suas rotinas, suas relações e sua forma de viver.

Marialva de Jesus, 47 anos, aposentada, descobriu o diabetes tipo 2 ao tentar seguir uma dieta mais saudável. Durante anos, usou metformina, mas precisou iniciar o tratamento com insulina. Apesar de nunca ter sido internada por complicações, admite dificuldade em manter uma alimentação equilibrada.

“Eu gosto de massa, pão e doce. Não compro, mas, quando tenho, eu como. Às vezes meço a glicemia só quando sinto que exagerei. O diabetes só vem aumentando, mas vou procurar medir todo dia pra ver se está controladinho”, relata.

Marialva de Jesus, 47 anos | Foto: Raunner Vinicius Soares/Jornal Opção

Vanusa Dias Gonçalves, 57 anos, doméstica, descobriu o diabetes tipo 2 após um desmaio e alteração de pressão. Desde então, sua vida mudou completamente. “É uma doença que vai acabando com a gente aos poucos. Não pode subir demais nem abaixar demais. Eu não posso comer arroz e macarrão no mesmo dia, nem doces ou refrigerante. Isso causa desconforto, até na família, porque se eu vejo doce eu como, mas não posso. Já perdi dois empregos por conta das crises. É muito difícil, mas a gente tem que se adaptar”, desabafa.

Vanusa Dias Gonçalves, 57 anos | Foto: Raunner Vinicius Soares/Jornal Opção

Zuleide Lima Matãn, 53 anos, cozinheira, descobriu o diabetes tipo 2 já em estágio avançado, com problemas de visão. Desde 2018 faz aplicações nos olhos. “Minha vida é de cuidados. O diabético não pode facilitar. Eu tive conjuntivite e os médicos disseram que era sintoma de diabetes. No começo não acreditei, mas depois confirmei. Recebi a notícia sem me entristecer. É preciso ter bom ânimo, porque se você não cuidar, a doença detona a vida. Eu encaro com segurança e ânimo, porque sei que preciso lutar”, afirma.

Zuleide Lima Matãn, 53 anos | Foto: Raunner Vinicius Soares/Jornal Opção

Luciana Camargos, 47 anos, dona de casa, encarou o diagnóstico de pré-diabetica com serenidade. “Mudei bastante a alimentação, mas não impactou muito minha vida. Sempre tratei com normalidade. Essas coisas temos que tratar com normalidade, não podemos precipitar”, diz, mostrando uma postura tranquila diante da condição.

Luciana Camargos, 47 anos | Foto: Raunner Vinicius Soares/Jornal Opção

Rosani Gomes Almeida, de 39 anos, cozinheira, descobriu a pré-diabetes há oito meses em um exame de rotina. O impacto foi imediato. “Fiquei com medo. Cortei açúcar e carboidrato. Antes eu comia arroz, feijão e macarrão. Hoje, se como arroz, não como macarrão. São os alimentos que mais sinto falta”, confessa.

Rosani Gomes Almeida, de 39 anos | Foto: Raunner Vinicius Soares/Jornal Opção

Marilene Nascimento Rodrigues, 63 anos, aposentada, carrega o peso da hereditariedade. “Na minha família todo mundo tem diabetes, parece que é hereditária essa praga. Descobri aos 58 anos. A médica disse que eu não estava descompensada, mas estava obesa. Me deu uma lista de alimentação. Fiquei muito chateada com o diagnóstico, mas depois que meu pai morreu, fiquei pior”, conta emocionada.

Marilene Nascimento Rodrigues, 63 anos | Foto: Raunner Vinicius Soares/Jornal Opção

Ana Lúcia, 54 anos, doméstica, descobriu ser pré-diabetes após sentir tontura e dor de cabeça. “Tive que tomar insulina três vezes. Descobri recentemente, já mais velha. Quando eu era nova, não tinha isso. Mudou muito minha alimentação, eu comia muito doce. É engraçado, quando morava na roça não tinha nada disso. Quando vim pra cidade, mudou. Minha pressão e diabetes aumentaram muito depois que minha irmã faleceu”, relata com emoção.

Ana Lúcia, 54 anos | Foto: Raunner Vinicius Soares/Jornal Opção

Um retrato coletivo

Essas histórias revelam que o diabetes não é apenas uma condição clínica: é um divisor de águas na vida das pessoas.

– Para algumas, como Luciana, o diagnóstico foi encarado com naturalidade.

– Para outras, como Rosani e Marilene, trouxe medo, tristeza e mudanças bruscas na alimentação.

– Já Marialva, Vanusa e Zuleide mostram o peso das restrições, das perdas e da necessidade de disciplina constante.

– Ana Lúcia associa a doença às mudanças de ambiente e às perdas familiares, mostrando como fatores emocionais também influenciam.

Hospital Geral de Goiânia aposta em tecnologia

O Centro Estadual de Atenção ao Diabetes (CEAD), instalado no Hospital Geral de Goiânia (HGG), tornou-se referência no atendimento de pacientes com diabetes tipo 1 e tipo 2 que apresentam complicações ou dificuldades de controle. Sob a coordenação do endocrinologista Dr. Nelson Rassi, o espaço reúne tecnologia de ponta e uma equipe multiprofissional para oferecer cuidado integral. Ao Jornal Opção, o especialista concedeu uma longa entrevista sobre o HGG e o diabetes.

Dr. Nelson Rassi | Foto: Divulgação

O CEAD recebe pacientes encaminhados pela central de referência, geralmente aqueles cujo controle glicêmico é mais difícil ou que apresentam particularidades que não podem ser tratadas nos centros de atenção primária e secundária. “O paciente chega até nós quando o tratamento convencional não é suficiente”, explica Rassi.

A estrutura é composta por endocrinologistas, enfermeiros, nutricionistas, cardiologistas, oftalmologistas, psicólogos, assistentes sociais e pediatras. “O paciente não recebe apenas o tratamento médico, mas uma atenção global, que envolve todas as áreas relacionadas ao cuidado com o diabetes”, destaca o especialista.

Entre os avanços implementados está o CGMS (Continuous Glucose Monitoring System), dispositivo que mede a glicemia em tempo real. Trata-se de um pequeno disco colocado de forma indolor na pele, geralmente no ombro, que transmite os dados para o celular do paciente.

“O sistema permite que a criança, adolescente ou adulto jovem saiba naquele instante como está sua glicemia. Se está alta ou baixa, pode tomar uma atitude imediata, sempre orientada pelo médico ou pelos pais”, explica Rassi.

Os dados ficam disponíveis na nuvem, permitindo que familiares acompanhem os níveis mesmo à distância. Além disso, o aparelho dispara alarmes em caso de hipoglicemia ou hiperglicemia, inclusive durante a noite, evitando situações de emergência.

Apesar da eficácia, o custo do monitoramento contínuo, cerca de R$ 600 por mês, limita o acesso da população mais carente. “Ele é acessível para a classe média e alta, mas para a população carente é um custo muito elevado. Não é acessível no SUS. Mas o CAD provê esse aparelho para todas as crianças atendidas lá, de cinco a 15 anos”, afirma o médico.

Outro recurso são as bombas inteligentes, capazes de medir a glicemia e aplicar insulina automaticamente. No Brasil, apenas o sistema 780 CGS está disponível, com custo inicial de R$ 20 mil e manutenção mensal de R$ 3 mil. “É um avanço, mas inviável para a maioria das pessoas”, reconhece Rassi.

Para pacientes de baixa renda, o SUS passou a disponibilizar insulinas de nova geração, como a glargina e insulinas de ação rápida. “Depois de uma longa luta, conseguimos que essas insulinas modernas fossem oferecidas. Isso facilita muito o controle glicêmico das crianças”, celebra.

O especialista ressalta que o controle da doença depende também da disciplina e da personalidade do paciente. “Há crianças que encaram o problema com seriedade e superam dificuldades socioeconômicas. Outras, mesmo com conforto financeiro, são revoltadas ou indisciplinadas. É fundamental ter suporte médico adequado”, observa.

O diabetes tipo 1, antes quase exclusivo de crianças e adolescentes, hoje tem prevalência crescente em adultos jovens. “Estamos vendo cada vez mais essa doença em pessoas de 25 a 40 anos”, alerta Rassi.

No tipo 1, as células do pâncreas que produzem insulina são destruídas pelo sistema imunológico, tornando o uso da insulina indispensável. Já no tipo 2, há produção de insulina, mas ela não consegue exercer sua função plena devido à resistência insulínica, cujo principal fator é a obesidade.

Segundo o endocrinologista, a perda de peso é a principal forma de vencer a resistência insulínica, seja por dieta, cirurgia bariátrica ou medicamentos. Mas outros fatores também influenciam: uso de determinados medicamentos, sedentarismo, cigarro, álcool, estresse crônico e genética. “Controlar todos esses fatores evita complicações”, explica.

O mau controle do diabetes pode levar a amputações, cegueira, insuficiência renal, transplante, AVC ou infarto. “Essas complicações aparecem depois de muitos anos de mau controle. Mas hoje é possível viver uma vida normal com diabetes tipo 1 ou 2, desde que haja disciplina e acompanhamento médico”, afirma.

Paradoxalmente, a doença pode estimular hábitos mais saudáveis. “Várias crianças com diabetes tipo 1 se tornam atletas de alta performance. Um dos meus sobrinhos tem diabetes e é o mais atleta da família. Muitas vezes, a doença leva a uma vida mais saudável, com mais atividade física e alimentação controlada”, relata Rassi.

Ao final, o médico destacou a importância das decisões políticas para garantir acesso aos tratamentos, mencionando a discussão recente sobre vetos presidenciais relacionados ao fornecimento de medicamentos e tecnologias. “Essas medidas podem definir se os avanços chegam ou não à população mais carente”, conclui.

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