A França se tornou nesta segunda-feira, 4, o primeiro país do mundo a incluir na Constituição a liberdade e direito da mulher em optar pelo aborto. A mudança na Carta Magna foi aprovada em uma sessão conjunta das duas Casas legislativas, a Assembleia Nacional e o Senado, e deve ser promulgada pelo presidente Emmanuel Macron na próxima sexta, 8, data onde se celebra o Dia Internacional da Mulher.

Dos 852 deputados e senadores reunidos, 780 votaram a favor e 72 contra. Segundo o jornal Le Monde, “uma explosão de alegria saudou o anúncio em frente à Torre Eiffel”. No local, havia um telão gigante, iniciativa da Câmara Municipal e da Fundação da Mulher, onde se podia acompanhar os trabalhos do Parlamento. Os alto falantes tocavam a música “Run the World (Girls)”, de Beyoncé.

Minutos após o anúncio, Macron expressou sua satisfação com a decisão nas redes sociais, descrevendo-a como um “orgulho francês” e convidando a população a participar de um evento no dia 8 de março. A medida abrange todas as mulheres que desejam acessar o procedimento na França, não se restringindo apenas às cidadãs francesas.

A inclusão da interrupção da gravidez na Constituição foi uma prioridade legislativa do governo Macron, que mobilizou sua base no Parlamento em resposta a uma decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos, que revogou o direito ao aborto em nível federal no país em junho de 2022.

Histórico da conquista na França

O aborto é descriminalizado na França desde 1975, quando foi aprovada a lei Simone Veil, batizada com o nome da ministra da Saúde de centro-direita que propôs o texto. A legislação permite que as mulheres se submetam ao procedimento até a 14ª semana de gestação, mas a prática não tinha proteção constitucional, o que a colocava sob risco de ser derrubada pela Justiça, como temiam apoiadores do projeto.

No século XV, Christine de Pizan defendeu a educação das mulheres. Mais tarde, em 1789, Olympe de Gouges criticou sua exclusão da “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” durante a Revolução Francesa. Em 1949, Simone de Beauvoir delineou as bases do feminismo moderno em “O Segundo Sexo”, discutindo a opressão das mulheres em uma sociedade dominada pelos homens.

A França, desde o início do século passado, adotou a Lei da Laicidade em 1905, que separou a Igreja do Estado, afastando a religião das questões políticas. Essa história influencia o apoio maciço dos franceses à constitucionalização do aborto, com 86% de aprovação, segundo uma pesquisa de 2022.

Esse índice é significativamente maior do que no Brasil, onde apenas 39% são a favor do aborto. Com o forte respaldo da população francesa, os senadores admitiram que apoiaram o projeto para evitar críticas. Em 28 de fevereiro, o Senado francês, predominantemente de direita, aprovou o texto com ampla maioria: 267 votos a favor e 50 contra.

Aborto no Brasil

No Brasil, o aborto é legal em casos de estupro, risco de vida para a gestante e anencefalia fetal, conforme determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012. Fora dessas circunstâncias, o aborto é considerado crime, sujeito a penalidades legais.

A descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez começou a ser julgada virtualmente pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 22 de setembro de 2023, gerando debates acalorados entre diferentes grupos sociais e políticos.

Enquanto os setores mais conservadores, incluindo grupos religiosos como os evangélicos, se opõem à legalização do aborto, os movimentos de esquerda e progressistas defendem a ampliação dos direitos reprodutivos das mulheres, incluindo o acesso ao aborto seguro e legal.