Trajetória do assassino de advogados em Goiânia é marcada por crimes, prisões e fugas

29 novembro 2020 às 00h00

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Pedro Henrique Martins Soares, de 25 anos, já foi preso diversas vezes e condenado por tráfico e homicídio, mas sempre acabava em liberdade

No dia 28 de outubro de deste ano, uma quarta-feira, os advogados Marcus Aprígio Chaves, de 41 anos, filho do desembargador Leobino Valente Chaves, ex-presidente do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), e Frank Alessandro Carvalhaes de Assis, de 47 anos, foram executados a tiros em seu escritório localizado na Rua 9-A, no Setor Aeroporto, em Goiânia, por dois homens que se passaram por clientes para encontrar os profissionais e matá-los.
Poucos dias depois, a prisão de um autor e a morte de outro, ocorrida durante uma troca de tiros com a Polícia Militar do Tocantins, trouxe à tona um impressionante esquema de crime mandado e contratação de pistoleiros. Ao longo das apurações, descobriu-se que que o agricultor Nei Castelli, de 58 anos, havia encomendado o duplo homicídio após perder uma ação na Justiça que envolvia o trabalho dos advogados.
A ação se arrastava desde a década de 1980 e se referia à disputa por uma propriedade rural no pequeno município de São Domingos, na divisa de Goiás com a Bahia. Após a atuação dos advogados no caso, a Justiça decidiu que a fazenda, avaliada em R$ 46 milhões, pertencia aos clientes de Marcus e Frank e determinou que Castelli desocupasse as terras e arcasse com as custas processuais.

A insatisfação fez com que Castelli apelasse ao extremo. O elo entre o agricultor e os assassinos foi o empresário Cosme Lompa, preso no dia 9 de novembro, no Tocantins. Segundo a Polícia Civil, Cosme foi fundamental na execução do crime contra os advogados.
O empresário é revendedor de carros e dono de um estabelecimento de lazer chamado Balneário Recanto Verde, em Porto Nacional, no Tocantins. Amigo de Nei Castelli, Cosme recebeu o desejo do agricultor para a morte de Marcus e Frank e, como um intermediador, o empresário procurou o matador de aluguel Pedro Henrique Martins Soares. O rapaz, de 25 anos, foi a peça-chave para a solução do crime.
Criminoso profissional
Pedro Henrique foi preso no dia 30 de outubro, em Porto Nacional, dois dias após o assassinato dos advogados. Juntamente com Jaberson Gomes, Pedro Henrique estudou por dias a rotina de Marcus e Frank até a execução do crime, chegando a almoçar por alguns dias no restaurante localizado em frente ao escritório dos advogados.
O pagamento pelo crime chegou a ser acertado: Nei Castelli pagaria R$ 100 mil caso os suspeitos do assassinato saírem impune e R$ 500 mil caso fossem pegos pela polícia. Todavia, o valor combinado nunca chegou a ser pago.
Ao ser preso, Pedro confessou ter sido ele o autor dos disparos que mataram os dois profissionais. Quando questionado, o rapaz revelou: contando com as duas últimas vítimas, havia matado 12 pessoas ao longo de uma vida de crime.
Em entrevista à uma TV, a mãe de Jaberson contou, chorando, que não sabia que o filho estava na vida do crime. Já Pedro Henrique tem um histórico bastante conhecido no Tocantins, chegando a ser referido como um dos maiores matadores de aluguel do estado.
Apelidado de Dirico, Pedro Henrique responde a vários processos criminais – a maioria corre em segredo de Justiça, devido à natureza criminal. Conforme apurado pelo Jornal Opção, há nove processos em andamento em que o rapaz consta como réu. Alguns deles tramitam no Tribunal de Justiça do Tocantins, e outros no Tribunal de Justiça de Goiás e São Paulo.
Em novembro de 2016, o homem foi preso em Goiânia, no Setor Criméia Oeste. Junto com ele, foram presos Ronie Von Pereira da Silva, Absahi Oliveira Madeira e um menor de 17 anos – todos por envolvimento assassinato do jornalista Mateus Júnior, em Palmas, em setembro de 2016. Na época, o laudo sobre a morte apontou que Francisco Mateus da Silva Júnior morreu por enforcamento. O corpo da vítima foi encontrado próximo de Lajeado, a cerca de 65 quilômetros de Palmas, no dia 7 de setembro, depois de ficar quatro dias desaparecido.

Pedro Henrique foi encontrado em Goiânia três meses após fugir da Casa de Prisão Provisória de Porto Nacional. Na época, ele já respondia por oito homicídios e um roubo. No dia 8 de agosto, ele e outros sete detentos serraram a grade da cela onde estavam e pularam o muro da unidade usando uma corda feita de lençóis. Junto com ele, Ronie Von Pereira também escapou. Um mês depois, em setembro, estariam participando da morte do jornalista Mateus Júnior.
Ao serem capturados em Goiânia, Pedro Henrique e Ronie Von portavam duas pistolas e uma arma de brinquedo. Na ocasião, Pedro foi encaminhado para a Central de Triagem até ser transferido para a Casa de Prisão Provisória. Algum tempo depois, em 2017, Pedro Henrique foi recambiado para o Tocantins.
No entanto, o fato que chama atenção é que Pedro Henrique seguia em liberdade até ser preso, novamente, pela Polícia Civil de Goiás, em parceria com a Polícia Civil do Tocantins, em seu estado de origem, em 2020, pela morte dos advogados na capital de Goiás.
A reportagem do Jornal Opção chegou a questionar o fato junto à Secretaria da Cidadania e Justiça do Estado do Tocantins (Seciju). Porém, em resposta, a pasta declarou que os dados da ficha criminal, assim como do histórico de Pedro Henrique, são sigilosos e somente podem “ser acessados por policiais (em favor do serviço) ou pela Justiça, em processos envolvendo o interessado”.
Julgamentos e condenações
Os crimes cometidos por Pedro Henrique no Tocantins e em outros estados são vários e de diversas naturezas – indo do homicídio qualificado, passando por roubo até o tráfico de drogas que, inclusive, Pedro Henrique comandava de dentro da cadeia, quando esteve preso.
Em julho de 2017, Pedro Henrique foi submetido ao júri popular em Porto Nacional, acusado pelo crime de tentativa de homicídio contra Ricardo Pereira Félix, baleado em julho de 2016, no mesmo município tocantinense. O caso se tratava de um crime planejado. Pedro Henrique teria, inclusive, contratado Manoel Rodrigues da Silva Filho e oferecido R$ 3,3 mil em dinheiro vivo para o assassinato.
Já em dezembro do mesmo ano, 14 pessoas, incluindo Pedro Henrique, que haviam sido presas em 2016 durante uma operação contra tráfico de drogas também foram condenadas. A organização criminosa a qual pertencia Pedro Henrique era responsável, segundo o juiz titular da 4ª Vara Criminal de Palmas à época, Zilmar dos Santos Pires, por trazer entorpecentes do cartel goiano para o Tocantins.

De acordo com a decisão proferida na época, os integrantes da quadrilha desarticulada pela Operação Hórus foram condenados por tráfico de drogas e/ou associação para o tráfico, além de lavagem de dinheiro ou ocultação de bens.
A polícia, conforme informações do Tribunal de Justiça do Tocantins, mapeou o esquema da quadrilha a partir da prisão do chefe do grupo, Antônio Gomes Boaventura, em janeiro de 2016, em Paraíso do Tocantins. Conhecido como Meu Rei, Boaventura era responsável pelo comando e gestão dos trabalhos, articulação da compra, transporte, armazenamento, distribuição, vendas de drogas, armas e cobranças.
Entre os condenados, Pedro Henrique Martins Soares, Gilson Junior Ferreira de Souza, Elizeu Santiago Freire, William Bandeira, Elias Pereira da Silva, Maurício Coelho Ranzi e Warley Pereira Borralho pegaram cinco anos de reclusão e 900 dias-multa por associação ao tráfico. O cumprimento da pena foi determinado, à época, para o regime fechado, sem o direito de recorrer da decisão em liberdade.
Frieza
Em entrevista, um dos delegados que conduziram as investigações do caso dos advogados Marcus Aprígio e Frank Alessandro, Rhaniel Almeida, se referiu a Pedro Henrique como uma pessoa “tranquila e fria”, mesmo diante da confissão de seus crimes.
De acordo com Rhaniel, Pedro Henrique, durante o depoimento em que deu detalhes da execução dos advogados, não demonstrou alterações no comportamento ou qualquer sinal de remorso. O delegado contou que o rapaz, inclusive, confessou o crime e explicitou a tentativa de proteger os demais envolvidos.
No último dia 26 de novembro, quinta-feira, a Polícia Civil e peritos técnicos fizeram a reconstituição do duplo homicídio dos advogados, no Setor Aeroporto, em Goiânia.
Pedro Henrique, Nei Castelli e Cosme Lompa seguem presos.
