Foi só o ex-homem de toga surgir entre os pré-candidatos a presidente no Datafolha de domingo (15/4) com 8% a 10% do eleitorado que adversários ligaram o alerta

Escalada do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa na pesquisa Datafolha deixou outros pré-candidatos muito preocupados | Foto:Nelson Jr.

Augusto Diniz

Relator da ação penal 470, mais conhecida co­mo mensalão do PT, o ex-ministro do Su­pre­­mo Tribunal Federal (STF) Joa­quim Barbosa se tornou o pré-can­didato a presidente da Repú­bli­ca temido por todos seus possíveis adversários nas urnas em outubro. Depois da divulgação do resultado da pesquisa Datafolha no domingo, 15, o primeiro negro a ocupar uma cadeira no STF saiu dos 3% na rodada do levantamento da “Fo­lha de S. Paulo” — divulgado em 30 de janeiro —, quando ainda estava sem partido, para percentuais que va­riam de 8% a 10% em todos os ce­nários apresentados de intenção de votos.

Com confiança de 95%, margem de erro de 2 pontos porcentuais para mais ou menos, o Da­ta­fo­lha ouviu 4.194 eleitores de 227 mu­nicípios brasileiros entre os dias 11 e 13 de abril, com registro no Tri­bunal Superior Eleitoral (TSE) sob o número BR 08510/2018. E é justamente essa a pesquisa que tem colocado o “Batman de toga” co­mo o coringa da pré-campanha. Fi­liado ao PSB desde o dia 6 de abril para tentar se viabilizar como can­didato a presidente da Repú­bli­ca, Joaquim Barbosa já despertou o incômodo do líder das intenções de votos nos cenários em que o ex-presidente Lula da Silva (PT), que está preso desde 7 de abril, não aparece.

O deputado federal Jair Bol­so­na­ro (PSL), que lidera com 17% das intenções de votos no primeiro tur­no em seis cenários diferentes, apa­rece na segunda colocação nos três quadros estimulados — em que o nome dos pré-candidatos é apresentado aos eleitores — nos quais Lu­la é uma das opções. O petista fi­ca no primeiro lugar com 30% a 31%. Mesmo assim, o pré-candidato do PSL começa a mostrar in­sa­tisfação com o crescimento percentual do ex-presidente do STF. Na úl­ti­ma semana, Bolsonaro, considerado a opção da extrema direita pa­­ra as urnas em outubro, começou a dizer que algumas das pautas apresentadas por Joaquim Barbo­sa, como a redução da maioridade pe­nal e o porte e posse de arma de fo­go facilitados, são propostas comuns.

Se o primeiro colocado na corrida eleitoral quando o ex-presidente petista não está entre as opções — quadro mais possível de consolidar após a prisão de Lula — de­monstra certo desconforto com o crescimento do ministro aposentado do Supremo, imagine os pré-can­didatos que estão empatados com Joaquim Barbosa ou aparecem abaixo dele na intenção de vo­tos. Ciro Gomes (PDT), em cinco das possibilidades de cenário eleitoral sem Lula, surge empatado em 9% com o magistrado aposentado. Em um dos casos Ciro fica um ponto porcentual atrás dos 10% de Barbosa.

A situação é ainda pior para Ge­raldo Alckmin (PSDB), ex-go­ver­nador de São Paulo, que não con­segue decolar nem quando Lu­la fica fora da disputa. O tucano pau­lista não sai dos 7% a 8%, sempre na quinta posição. Tanto para os pré-candidatos de centro como os considerados da direita, Joa­quim Barbosa surge como uma ameaça real. E parece ter entendido muito bem isso. Ao ponto de botar o bloco na rua e já ter a aceitação de grande parte dos caciques do PSB, que começam a dar sinais de que podem mesmo lançar o ex-ministro do STF como candidato na convenção nacional.

Novo na política

Com a marca da condenação de 25 réus no caso do mensalão do PT, Joaquim Barbosa se apresenta com um liberal que se preocupa com a redução das desigualdades so­ciais no País. Favorável a uma re­forma da Previdência menos per­versa do que a proposta fracassada do presidente Michel Temer (MDB), o “batman da toga” desafia a sustentação de novidade frente aos corruptos de sempre defendida por Bolsonaro. Além de ter mais legitimidade do que o nome do PSL para reivindicar o direito de se dizer um combatente da corrupção — até porque tem serviços pres­tados nesse sentido à frente do STF como presidente e relator na Corte —, o ministro aposentado é um novato que vem de fora do mun­do tradicional da política. In­clu­sive conhecido por ter criticado diversas vezes o modelo de sus­tentação dos velhos conhecidos ocu­pantes de cargos eletivos.

Na busca por tornar competitivas as ainda fracas pré-candidaturas do centro, Alckmin, o ex-mi­nis­tro da Fazenda Henrique Mei­re­lles (MDB), o presidente da Câ­ma­ra dos Deputados Rodrigo Maia (DEM) e até Michel Te­mer, que respira por aparelhos com 6% de aprovação e 70% de re­provação, todos eles enxergam em Barbosa a ameaça real de ver qual­quer possibilidade de crescimento nas pesquisas naufragar an­tes mesmo de uma dessas candidaturas se consolidar. Defensor das pri­vatizações e do Estado mínimo, o ex-ministro do STF renova o dis­curso do não-político. O relator do mensalão do PT não é apenas um novato no sistema partidário-elei­toral. Ele vem do Judiciário, úni­ca das esferas de poder que ain­da goza de certo prestígio e respeito — mesmo com os recentes arranhões em sua imagem pública — junto à opinião pública.

O ex-ministro do STF, que se tor­nou o coringa eleitoral, só parece não incomodar — ao menos pu­bli­camente — a ex-ministra dos go­ver­nos Lula, Marina Silva (Rede). Em 2014, a pré-candidata, que ten­de a ser quem mais lucraria com a saí­da de Lula do páreo, concorreu à Presidência da República pelo PSB, partido de Barbosa. Assim que a Rede foi criada, em 2015, co­me­çou a ter problemas com a sigla que acabou de receber o ministro apo­sentado do Supremo de braços abertos. Mas não nega a possibilidade de uma reaproximação.

Dona de 10% das intenções de vo­tos nos três cenários com Lula na disputa e na segunda posição — com percentual que varia de 15% a 16% — quando o petista não surge en­tre os concorrentes, Marina teria ho­je condições de vencer dois dos três possíveis segundo turnos — se­ria derrotada apenas pelo ex-presidente na reta final —, de acordo com o Datafolha. Herdeira de 19% a 21% do eleitorado de Lula no caso de impedimento à candidatura do nome defendido hoje pelo PT nas urnas, a pré-candidata pela Rede pode se unir a Joaquim Barbosa até agosto com os dois jun­tos na chapa.

O articulador desta união é o ex-ministro do STF Carlos Ayres Brit­to, que faz de tudo para ver Ma­rina e Barbosa unidos. O problema, até o momento, é que nenhum deles aceita ser o vice e abrir mão da cabeça da chapa para o outro. Como Marina é apontada pe­lo levantamento da Datafolha co­mo a possível maior beneficiada da saída de Lula da disputa presidencial e o ex-ministro tem conquistado eleitores de praticamente to­dos os pré-candidatos — o que de­ve se intensificar a partir do mo­men­to em que Barbosa começar a ganhar mais espaço na mídia —, a junção das duas pré-candidaturas em uma só chapa teria o poder de fortalecer os dois na disputa pelo Pa­lácio do Planalto.

Obama brasileiro

Cinco meses e meio antes da vo­tação no primeiro turno, em 7 de outubro, Nilo Peçanha continua a ser o único negro a ocupar o car­go de presidente da República. Ni­lo não foi eleito, assumiu em 14 de junho de 1909 com a morte de Afonso Pena. Joaquim Barbosa, que já é tratado por alguns como o Oba­ma brasileiro, pode ser o primeiro presidente negro eleito no Brasil — se conseguir manter o crescimento surpreendente apresentado na última pesquisa Data­fo­lha.

Como são 62% os que acreditam que Lula não poderá disputar as eleições deste ano, o discurso me­nos radicalizado tende a atrair par­te do eleitorado do petista, que am­plia o coro daqueles que pretendem votar em branco ou nulo sem o petista nas urnas. Nos cenários em que o ex-presidente aparece, es­se percentual varia entre 13% e 14%. Quando o pré-candidato do PT não está entre as opções, os vo­tos descartados (não válidos) dis­param dez pontos porcentuais, de 23% a 24%.

Se o Partido dos Trabalhadores não aproveitar logo o poder de transferência de votos, que hoje é de 66% entre os lulistas, essa força de indicar um candidato do petista continuará a cair ao passar do tem­po, assim como as intenções de vo­tos declaradas em Lula já diminuíram dos 37% em janeiro para 31% no dia 15. E sem o ex-presidente na disputa, a tendência é a de que o radicalismo do discurso per­ca cada vez mais força, o que po­de favorecer o nome de Joa­quim Barbosa, o novato inimigo dos políticos corruptos. Resta sa­ber se o discurso será bem aproveitado. l