Quem tem medo do Joaquim Barbosa?
22 abril 2018 às 00h00
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Foi só o ex-homem de toga surgir entre os pré-candidatos a presidente no Datafolha de domingo (15/4) com 8% a 10% do eleitorado que adversários ligaram o alerta
Augusto Diniz
Relator da ação penal 470, mais conhecida como mensalão do PT, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa se tornou o pré-candidato a presidente da República temido por todos seus possíveis adversários nas urnas em outubro. Depois da divulgação do resultado da pesquisa Datafolha no domingo, 15, o primeiro negro a ocupar uma cadeira no STF saiu dos 3% na rodada do levantamento da “Folha de S. Paulo” — divulgado em 30 de janeiro —, quando ainda estava sem partido, para percentuais que variam de 8% a 10% em todos os cenários apresentados de intenção de votos.
Com confiança de 95%, margem de erro de 2 pontos porcentuais para mais ou menos, o Datafolha ouviu 4.194 eleitores de 227 municípios brasileiros entre os dias 11 e 13 de abril, com registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob o número BR 08510/2018. E é justamente essa a pesquisa que tem colocado o “Batman de toga” como o coringa da pré-campanha. Filiado ao PSB desde o dia 6 de abril para tentar se viabilizar como candidato a presidente da República, Joaquim Barbosa já despertou o incômodo do líder das intenções de votos nos cenários em que o ex-presidente Lula da Silva (PT), que está preso desde 7 de abril, não aparece.
O deputado federal Jair Bolsonaro (PSL), que lidera com 17% das intenções de votos no primeiro turno em seis cenários diferentes, aparece na segunda colocação nos três quadros estimulados — em que o nome dos pré-candidatos é apresentado aos eleitores — nos quais Lula é uma das opções. O petista fica no primeiro lugar com 30% a 31%. Mesmo assim, o pré-candidato do PSL começa a mostrar insatisfação com o crescimento percentual do ex-presidente do STF. Na última semana, Bolsonaro, considerado a opção da extrema direita para as urnas em outubro, começou a dizer que algumas das pautas apresentadas por Joaquim Barbosa, como a redução da maioridade penal e o porte e posse de arma de fogo facilitados, são propostas comuns.
Se o primeiro colocado na corrida eleitoral quando o ex-presidente petista não está entre as opções — quadro mais possível de consolidar após a prisão de Lula — demonstra certo desconforto com o crescimento do ministro aposentado do Supremo, imagine os pré-candidatos que estão empatados com Joaquim Barbosa ou aparecem abaixo dele na intenção de votos. Ciro Gomes (PDT), em cinco das possibilidades de cenário eleitoral sem Lula, surge empatado em 9% com o magistrado aposentado. Em um dos casos Ciro fica um ponto porcentual atrás dos 10% de Barbosa.
A situação é ainda pior para Geraldo Alckmin (PSDB), ex-governador de São Paulo, que não consegue decolar nem quando Lula fica fora da disputa. O tucano paulista não sai dos 7% a 8%, sempre na quinta posição. Tanto para os pré-candidatos de centro como os considerados da direita, Joaquim Barbosa surge como uma ameaça real. E parece ter entendido muito bem isso. Ao ponto de botar o bloco na rua e já ter a aceitação de grande parte dos caciques do PSB, que começam a dar sinais de que podem mesmo lançar o ex-ministro do STF como candidato na convenção nacional.
Novo na política
Com a marca da condenação de 25 réus no caso do mensalão do PT, Joaquim Barbosa se apresenta com um liberal que se preocupa com a redução das desigualdades sociais no País. Favorável a uma reforma da Previdência menos perversa do que a proposta fracassada do presidente Michel Temer (MDB), o “batman da toga” desafia a sustentação de novidade frente aos corruptos de sempre defendida por Bolsonaro. Além de ter mais legitimidade do que o nome do PSL para reivindicar o direito de se dizer um combatente da corrupção — até porque tem serviços prestados nesse sentido à frente do STF como presidente e relator na Corte —, o ministro aposentado é um novato que vem de fora do mundo tradicional da política. Inclusive conhecido por ter criticado diversas vezes o modelo de sustentação dos velhos conhecidos ocupantes de cargos eletivos.
Na busca por tornar competitivas as ainda fracas pré-candidaturas do centro, Alckmin, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB), o presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (DEM) e até Michel Temer, que respira por aparelhos com 6% de aprovação e 70% de reprovação, todos eles enxergam em Barbosa a ameaça real de ver qualquer possibilidade de crescimento nas pesquisas naufragar antes mesmo de uma dessas candidaturas se consolidar. Defensor das privatizações e do Estado mínimo, o ex-ministro do STF renova o discurso do não-político. O relator do mensalão do PT não é apenas um novato no sistema partidário-eleitoral. Ele vem do Judiciário, única das esferas de poder que ainda goza de certo prestígio e respeito — mesmo com os recentes arranhões em sua imagem pública — junto à opinião pública.
O ex-ministro do STF, que se tornou o coringa eleitoral, só parece não incomodar — ao menos publicamente — a ex-ministra dos governos Lula, Marina Silva (Rede). Em 2014, a pré-candidata, que tende a ser quem mais lucraria com a saída de Lula do páreo, concorreu à Presidência da República pelo PSB, partido de Barbosa. Assim que a Rede foi criada, em 2015, começou a ter problemas com a sigla que acabou de receber o ministro aposentado do Supremo de braços abertos. Mas não nega a possibilidade de uma reaproximação.
Dona de 10% das intenções de votos nos três cenários com Lula na disputa e na segunda posição — com percentual que varia de 15% a 16% — quando o petista não surge entre os concorrentes, Marina teria hoje condições de vencer dois dos três possíveis segundo turnos — seria derrotada apenas pelo ex-presidente na reta final —, de acordo com o Datafolha. Herdeira de 19% a 21% do eleitorado de Lula no caso de impedimento à candidatura do nome defendido hoje pelo PT nas urnas, a pré-candidata pela Rede pode se unir a Joaquim Barbosa até agosto com os dois juntos na chapa.
O articulador desta união é o ex-ministro do STF Carlos Ayres Britto, que faz de tudo para ver Marina e Barbosa unidos. O problema, até o momento, é que nenhum deles aceita ser o vice e abrir mão da cabeça da chapa para o outro. Como Marina é apontada pelo levantamento da Datafolha como a possível maior beneficiada da saída de Lula da disputa presidencial e o ex-ministro tem conquistado eleitores de praticamente todos os pré-candidatos — o que deve se intensificar a partir do momento em que Barbosa começar a ganhar mais espaço na mídia —, a junção das duas pré-candidaturas em uma só chapa teria o poder de fortalecer os dois na disputa pelo Palácio do Planalto.
Obama brasileiro
Cinco meses e meio antes da votação no primeiro turno, em 7 de outubro, Nilo Peçanha continua a ser o único negro a ocupar o cargo de presidente da República. Nilo não foi eleito, assumiu em 14 de junho de 1909 com a morte de Afonso Pena. Joaquim Barbosa, que já é tratado por alguns como o Obama brasileiro, pode ser o primeiro presidente negro eleito no Brasil — se conseguir manter o crescimento surpreendente apresentado na última pesquisa Datafolha.
Como são 62% os que acreditam que Lula não poderá disputar as eleições deste ano, o discurso menos radicalizado tende a atrair parte do eleitorado do petista, que amplia o coro daqueles que pretendem votar em branco ou nulo sem o petista nas urnas. Nos cenários em que o ex-presidente aparece, esse percentual varia entre 13% e 14%. Quando o pré-candidato do PT não está entre as opções, os votos descartados (não válidos) disparam dez pontos porcentuais, de 23% a 24%.
Se o Partido dos Trabalhadores não aproveitar logo o poder de transferência de votos, que hoje é de 66% entre os lulistas, essa força de indicar um candidato do petista continuará a cair ao passar do tempo, assim como as intenções de votos declaradas em Lula já diminuíram dos 37% em janeiro para 31% no dia 15. E sem o ex-presidente na disputa, a tendência é a de que o radicalismo do discurso perca cada vez mais força, o que pode favorecer o nome de Joaquim Barbosa, o novato inimigo dos políticos corruptos. Resta saber se o discurso será bem aproveitado. l