Quem se envergonha do apresentador são os mesmos sem-vergonha que não se envergonham de ter votado em Dilma e Aécio, Cabral e Pezão, Maluf e Pitta, nos coronéis do Nordeste

Luciano Huck é muito superior, tanto política quanto moralmente, do que a maioria dos políticos que estão pleiteando mandatos no país. Mas todos querem vetá-lo com argumentos que são, acima de tudo, antidemocráticos
NILSON GOMES
Especial para o Jornal Opção
O apresentador Luciano Huck anunciou na quinta-feira, 15, que desistiu de ser candidato a presidente da República. A decisão o teria levado às lágrimas. Realmente, não é pra rir.
Os adeptos do estilo tradicional de fazer política e gestão pública, essa coisa horrenda que impele o Brasil a patinar há mais de século, vibraram com a saída de Huck.
Nas mídias sociais, as viúvas esquerdistas comemoram a derrota prévia “do filhote da Globo”, essa encarnação do mal que teria derrubado os enviados de Deus ao planeta – sim, eles mesmos, Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Em WhatsApp, Twitter, Face, Insta, Snap, os tucanos (e aqui se pedem desculpas aos belíssimos pássaros por reafirmá-los símbolos do PSDB) sorriem pelo afastamento. Teria sido uma loucura do ex-presidente FHC conversar com Huck sobre candidatura. Garantem que política é para profissionais.
Profissional em que essa cambada é? Só se for em roubar e seus sinônimos: desviar, nomear, articular, compor, aderir.
Na verdade, o País perde quando um jovem, um artista, um empresário, um empregado, enfim, alguém de fora da bandalheira abre mão da política.
Seria maravilhoso, para a política e o País, se mais gente igual a Huck aportasse em massa nos partidos, inclusive em PT, PSDB, DEM, PTB, PMDB e demais siglas e termos que os políticos transformaram em palavrões: Podemos, Avante, Progressistas. Quanto mais amadores, mais esperança; quanto mais profissionais, mais lambança. Mas os gênios juram que Huck é um mauricinho (sem ser Macrizinho), um bebê mimado, um outsider. Isso não pode, é anormal.
O filho de Jader Barbalho é ministro — e isso é normal.
O filho de Renan Calheiros é governador — e isso é normal.
Os filhos de Jair Bolsonaro entopem Legislativos — e isso é normal.
O filho de Siqueira Campos é deputado e foi senador, uma filha foi senadora — e isso é normal.
Filhos de Garotinho e Cabral são congressistas — e isso é normal.
O senador Eduardo Braga saiu para ser ministro do PT, deixou a mulher no lugar — e isso é normal.
O senador Garibaldi Alves Filho saiu para ser ministro do PT, deixou Garibaldi Alves pai no lugar — e isso é normal.
O senador Edison Lobão saiu para ser ministro do PT, deixou Edison Lobinho no lugar — e isso é normal.
Sarney tem filho ministro, filha ex-governadora — e isso é normal.
Ciro Gomes pôs o irmão no governo do Ceará e a ex-mulher no Senado — e isso é normal.
Iris Rezende saiu do Senado e largou a vaga para o irmão, além de impingir a mulher em vaga de capacho no mesmo Senado — e isso é normal.
Um Genro era ministro do PT e uma Genro berrava a oposição, pai e filha dos dois lados da vitrine — e isso é normal.
Dois dos atuais senadores gaúchos vieram da TV, assim como Hélio Costa, de Minas Gerais — e isso é normal.
Anormal é um rapaz sem parentesco com bandidão da política tentar a Presidência da República.
É novo demais. Inexperiente. Despreparado. Sem grupo. Não pode. Alckmin, o chuchu, pode. Serra, dos 53 milhões roubados, pode. Gleisi Hoffaman, dos 23 milhões gatunados, pode. Huck, dos 17 milhões emprestados, não pode.
Que preparo tinham Itamar Franco e FHC? Nenhum. Haviam sido senadores, cargo que não prepara ninguém para coisa nenhuma.
Que preparo tinha Lula? Nenhum. Havia sido deputado, cargo que não prepara ninguém para nada.
Itamar foi ótimo presidente. FHC, mesmo comprando votos para parir a reeleição, deu à economia a estabilidade que persiste. Lula, apesar da demagogia, melhorou programas sociais e educacionais já existentes.
Por que Huck seria pior que eles?
Reagan saiu das telas de cinema para a política e se revelou tão exitoso que acabou com a guerra fria, vencendo o comunismo.
Huck tem o nariz grande, não seria um Reagan, seria uma vergonha sair do Projac para o Jaburu, com a Angélica de primeira-dama desfilando pela Praça dos Três Poderes num táxi reformado pelo Lata Velha.
Quem se envergonha de Huck são os mesmos sem-vergonha que não se envergonham de ter votado em Dilma e Aécio, Cabral e Pezão, Maluf e Pitta, nos coronéis do Nordeste, nos ladravazes do Norte, no lucrativo silêncio dos comparsas do Centro-Oeste, na bancada BBBB (bala, boi, biba e Bíblia), em Gleisi e Bernardo no Paraná, nos seguidos governadores incompetentes do Rio Grande do Sul, na petista Ideli e no casal Amin em Santa Catarina, em tantos outros casais por Estados, prefeituras e câmaras municipais, no filho do Fulano, na mulher do Sicrano, no marido da Beltrana. Isso é normal. Vergonha é chorar vendo o Extraordinário. Vergonha é chorar vendo o programa do Huck. Vergonha é o Huck chorar ao desistir da candidatura.
Afinal, Bolsonaro quer matar bandidos e é mito; Huck não deseja a mitificação, queria só o direito de tentar e os bandidos já o mataram.
Lula, condenado a 12 anos por apenas um dos crimes, lidera a corrida e isso é normal. Huck tem menos de 1/3 de seu índice e isso não pode.
Se Huck reconsiderasse (e deveria reconsiderar) e fosse candidato, seria eleito? Possivelmente, não. E por que não? Porque não tem grupo. O sinônimo desse grupo era quadrilha, a lei mudou o dicionário, agora é organização criminosa.
Se fosse eleito, não governaria, pois o diálogo com o Congresso é para profissionais. Ou seja, é normal a Nação viver ajoelhada diante de tipos execráveis como os diversos assaltantes enrolados nas denúncias da Lava Jato e que, em vez de irem para a cadeia, vão para as sessões do Congresso.
Anormal é ter alternativa que não é centro, nem direita, nem esquerda. É apenas um cidadão exigindo cidadania enquanto os mais dos mesmos ladram que é preciso ser filiado a um ismo, socialismo, capitalismo. Se não pertencer à tribo, não pode ser cacique e a política não prescinde dos caciques.
Anormal é querer escapar dos políticos tradicionais. Isso não pode. O Brasil precisa continuar sendo roubado pelos políticos de sempre. É assim mesmo, pregam os religiosos aos fiéis em busca de voto nos capetas que infernizam a população: nosso galardão está no Céu e nesta terra o que resta é ir para as mídias sociais xingar o adversário e afagar o bandido de estimação. Aleluia!
Anormal é enxergar num empreendedor a luz que falta à sombria política tradicional.
Ah, ele nunca foi votado, nunca foi prefeito, nem congressista, nem ministro, então, não vai dar conta de administrar um país destamanhão.
E quem falou que esses políticos dão conta de alguma coisa além de afanar?
Quanto menos político desse naipe o sujeito for, melhor. Quanto menos envolvido for com político, maior a possibilidade de prestar. Quanto mais políticos xingarem a sua participação na campanha, menor o risco de ser marginal igual a eles.
Sobram dedos na mão do Lula ao se somarem os gestores competentes que o Brasil teve. Pré-república, Dom Pedro II. Após a proclamação, JK e FHC. Mais ninguém. Itamar ficou tempo de menos. Lula ficou tempo demais, foi populismo do início ao fim, com o único mérito de manter os pilares da economia implantados por Itamar e FHC. Mais nada.
Os primeiros presidentes da República foram seres monstruosos, incompetentes, ladrões, ditadores. Vieram as atrocidades militares a partir de 1964. Descambaram em Sarney e Collor. Eis o resumo dos estadistas deste bananal.
Quem dessa turma é melhor que Huck?
Tá, que não seja ele, pois da Globo ninguém pode, só pode o Silvio Santos, que é do SBT e já foi candidato sem ser e acabou sendo e restou por não ir.
Que não seja o Huck, mas será que o Brasil só tem os carnicentos de todas as eleições?
Cadê opção? Em meio a milhões de pessoas com mais de 35 anos de idade, será que presidente só pode ser gente do mal?
Ah, isso é maniqueísmo! Um professor da USP, uma cientista social com pós-graduação stricto sensu não sei onde e um intelectual com dezenas de livros vão dizer que outsider não se sustenta, política é para os fortes, tiremos do caminho as excentricidades, vamos parar de brincadeira, quem comanda programa de TV não pode comandar o Executivo, mesmo com executivos vitoriosos na política daqui (Dória em São Paulo) e de lá (Trump nos EUA).
Para esses idiotas da academia, o correto é não mudar nada para ver como é que fica, é reeleger o filho do Renan em Alagoas, botar o filho do Jader no governo do Pará, e povoar o Senado com o filho do José Richa e o neto do Tancredo. O Huck? Não, o Huck não pode porque é da Globo e, você sabe, na Globo passa novela com travesti, a Globo subverte a moral, a Globo desintegra a religião, a família e a propriedade. Vai, malandra, que eu só chamo o Pablo Vittar de a Pablo Vittar se eu vir a ressonância magnética do útero dela — epa!, dele.
Com o Lula na cadeia e o Huck na TV, as urnas conterão o mito Bolsonaro, o siliconado Álvaro Dias, um chuchu do PSDB para levar pepino aos brasileiros, um comparsa petista, a messiânica Marina com seu discurso pré-colombiano, talvez Ciro sem o irmão governador e a ex-mulher senadora, um ou outro figurante dando uma de Enéas sem cérebro…
E tchau, o jeito é tocar um tango argentino — sem Macri, sem Macron, sem nada. Tchau. Quem gostou faz barulho no caldeirão. E silêncio na panelinha.
Nilson Gomes é advogado e jornalista
MUITO BOM ESSE TEXTO.
Surpreso! Não é comum encontrar qualquer verdade no jornalismo deste País. Há tempos não leio e muto menos comento artigos de profissionais nacionais porque agridem minha inteligência e meu espirito pela parcialidade e comprometimento óbvios com tudo que simulam criticar em suas pseudoanálises. Sou obrigado a buscar notícias sobre o Brasil em inglês, espanhol ou francês a fim de ter acesso a informações e avaliações dignas. Existe luz no fim do túnel? Sou obrigado a me render à perspicácia de suas considerações, jornalista e ter convicção de poder chamá lo assim. Mas, fiquei curioso: Você se formou no Brasil? E me perdoe se injusta parecer a indagação. Obrigado, muito obrigado, por me oferecer o prazer de jornalismo nobre em português.
Ah não Nilson, toma tipo! Luciano Hulk??? Melhora, Paraíba!