Faltou estratégia para candidatos e partidos derrotados em Goiás, diz especialista

09 outubro 2022 às 00h00

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A eleição deste ano foi uma surpresa para vários partidos. Muitos deles não conseguiram repetir o desempenho de 2018. Após a apuração no domingo, 2, dos 32 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), apenas 13 deles conseguiram cumprir os critérios exigidos pela nova legislação eleitoral. Em Goiás, tiveram bom desempenho o Partido Liberal (PL), que elegeu quatro deputados federais; o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), Progressistas (pP), União Brasil (UB) e a federação PCdoB–PT–PV, que conquistaram duas cadeiras cada um. Republicanos, Partido Social Democrático (PSD), Partido Democrático Trabalhista (PDT) e federação Cidadania–PSDB conseguiram apenas uma vaga na Câmara dos Deputados. Ou seja, dos 32 partidos oficiais, somente 10 estarão representados na Casa. No final das apurações, Patriota, Solidariedade e Partido Socialista Brasileiro (PSB) ficaram de fora.
Promessas para a eleição e reeleição neste ano não conseguiram atingir os votos necessários para conseguir o sucesso nas urnas. Os deputados federais Elias Vaz (PSB), Lucas Vergílio (Solidariedade), Francisco Júnior (PSD) e Alcides Rodrigues (Patriota) não se reelegeram. Ligada ao telejornalismo, a apresentadora Silvye Alves (UB) foi a líder de votos; no entanto, no mesmo segmento, o apresentador Matheus Ribeiro (PSDB) não conseguiu se eleger. Diferente de 2018, candidatos representando o militarismo e a chamada “bancada da bala” não obtiveram sucessos. Nesse sentido, vale citar o coronel Edson Raiado (Avante), policial militar das Rondas Ostensivas Táticas (Rotam). Ele teve a campanha voltada para a caçada e morte do criminoso mais procurado do Estado na última década: Lázaro Barbosa.
Para o cientista político Guilherme Carvalho, vários fatores contribuíram para a derrota de nomes que eram apostas de vitória. “Eu acho que, para esses candidatos que não conseguiram se eleger, houve uma série de fatores. Pode ser falta de estratégia, inclusive do parlamentar em primeiro lugar, quanto à filiação. Isso é algo que eu falei muito na imprensa, no início do ano: o partido que o candidato se filia determina se ele não será eleito. Se será eleito, aí precisa de estratégia pessoa”, pontua. Ele indica como riscos, as legendas que já possuem candidatos definidos para receberem recursos. “Teve muita gente fazendo movimentos errados de filiações, caindo em partidos que os recursos já estavam plenamente direcionados para um candidato, e a pessoa não era o candidato da predileção dos caciques da direção partidária ou foram para o partido, onde a formação da chapa não ajudou a fazer cadeira”, define.

Deputado federal à reeleição, com destaque na imprensa como um dos parlamentares mais atuantes no Congresso Nacional, Elias Vaz (PSB) não se reelegeu. “No caso do Elias Vaz, especialmente, ele teve um problema, a base política dele foi rachada com o PT, que teve duas candidaturas fortes. Eu acredito que parte dos votos dele migraram para a Adriana Accorsi, por exemplo. Antes ele só tinha o Rubens Otoni no campo da esquerda. Ficou mais difícil para ele fazer a cadeira dele como um deputado ideológico”, comenta Carvalho.
Outra aposta de reeleição, considerando o segmento religioso e o bolsonarismo, era o deputado federal Francisco Júnior. No entanto, neste ano, a força religiosa, embora evangélica, favoreceu a candidatura do deputado estadual Jefferson Rodrigues (Republicanos). Ele foi eleito com 56.026. De acordo com o cientista político, o partido de Francisco Júnior trabalhava para a eleição de um único nome, do ex-secretário Ismael Alexandrino, que foi o mais votado do PSD com 54.791. Ele era mais ligado ao governador Ronaldo Caiado (UB), apesar de na campanha ter manifestado apoio à candidatura de Marconi Perillo para senador, o que causou um desconforto na base, que contava com três candidaturas majoritárias para o Senado: deputado federal Delegado Waldir Soares (UB), ex-ministro das Cidades Alexandre Baldy (pP) e Vilmar Rocha (PSD).
Acerca do jornalista Matheus Ribeiro, que obteve 46.961 votos, e do coronel Edson, com 19.811, o especialista aponta como problema a chapa fraca, com poucas candidaturas competitivas. “No caso do Matheus Ribeiro, ele tem um problema adicional. No partido, ele já tinha a Lêda Borges [51.346 votos], que era mandatária, e que em tese estaria à frente, porque já tem um trabalho um pouco mais consolidado, o que foi demonstrado nas urnas. Só que a chapa para deputado federal foi extremamente fraca. Fora que o desempenho do Mateus também não foi bom”, compara Carvalho com a projeção da campeã de votos, Silvye Alves, que bateu os 254.653 votos.
O PSDB ainda teve um problema adicional, que foi o fato do Marconi, que resolveu sair candidato ao Senado
Cientista político Guilherme Carvalho
Embora tenha a mesma carreira da primeira colocada, segundo Carvalho, o tucano não conseguiu ter um diferencial estratégico. “Por outro lado, ele teve um outro problema, ele é jornalista, mas não conseguiu se diferenciar da grande campeã que foi a Silvye Alves. Assim, o problema do Matheus é que tinha muita gente parecida com ele no final das contas. Fazer campanha eleitoral não é só uma questão estética, não é uma questão só de bandeira, porque a mesma bandeira várias pessoas podem ter. Eleição proporcional é estratégia. É 95% de estratégia e outros 5% são de conteúdo. Ele não conseguiu entender isso. Ele fez o inverso, teve 95% de conteúdo e 5% de estratégia”, destaca.
Prova disso, foi que Matheus apresentou uma campanha de plataforma de centro-esquerda, que contava com muitas candidaturas já consolidadas. “Ele tem um outro problema, tem algo que a gente chama na ciência política de diferencial partidário, ele teve uma plataforma basicamente de centro-esquerda para a campanha dele. Ele acabou não conseguindo se diferenciar seja da Adriana [delegada Adriana Accorsi (PT) eleita com 96.714], seja da Aava Santiago [vereadora do PSDB, que obteve 13.387 votos], que não foi bem, mas tinha a plataforma parecida e do mesmo partido. Não conseguiu se diferenciar do Rubens Otoni [deputado federal petista reeleito com 83.539]. Não conseguiu se diferenciar do próprio Elias Vaz [deputado federal do PSB não reeleito com 30.411]”, analisa.
Já o partido, assim como em 2018, conquistou apenas uma cadeira, com o parlamentar Célio Silveira, que na janela partidária mudou para o MDB. Carvalho calcula que se houvesse estratégia era possível para a sigla ter conseguido três cadeiras, caso o ex-governador Marconi Perillo tivesse se candidatado para a Câmara dos Deputados. “O PSDB ainda teve um problema adicional, que foi o fato do Marconi, que resolveu sair candidato ao Senado. Se ele tivesse saído candidato a deputado federal, como eu circulei na imprensa, falei isso várias vezes, ele teria levado [a eleição] e talvez teria ajuda a fazer mais uma cadeira. Isso, muito provavelmente, teria acontecido e o PSDB, provavelmente, neste momento, estaria com três deputados federais, ao invés de apenas uma [deputada]”, avalia.
Já para o coronel Edson, a questão partidária teve grande peso na busca por votos e para a consolidação do quociente eleitoral. “Um partido como Avante, por exemplo, é um partido que no máximo conseguiria fazer um deputado federal, com uma chapa razoável, porque ele tem pouco recurso para fazer campanha. Então, ele é pouco atrativo para bons nomes com bastante projeção de voto e ao mesmo tempo, como ele junta pouca gente com intenção de voto razoável, não é suficiente para bater o quociente eleitoral de 180 mil votos”, analisa.

Representatividade
Com o mau desempenho do domingo, 2, só 10 dos 32 partidos elegeram deputados federais em Goiás, sendo que apenas nove deles atingiram a cláusula de barreira. Já em todo o País, só o PL, União Brasil, Progressistas, Republicanos, MDB, PSD, PDT, PSB, Avante, Podemos e as federações PT/PCdoB/PV; PSDB/Cidadania e Federação PSOL/Rede conseguiram sucesso nas urnas e terão direito a recursos do fundo partidário, tempo de TV e rádio. Do total de legendas, seis elegeram deputados federais. Foram eles: PSC, Patriota, Solidariedade, Pros, Novo e PTB. Na sexta-feira, 7, as cúpulas do Pros e Solidariedade se reuniram para buscar a incorporação ou fusão. Outros nove partidos não atingiram o número mínimo de votos e não elegeram nenhum nome para a Câmara dos Deputados. São eles: PCB, PCO, PMB, PRTB, PSTU, UP, Agir, DC e PMN.
Adotada pela primeira vez em 2018, a cláusula de barreira tem previsão legal de aumentar os critérios para as legendas terem direito a recursos públicos, o parlamentar eleito tem direito a participar de comissões e outras regalias. Neste ano, para alcançarem as regras de desempenho foram necessários que cada partido atendesse uma de duas alternativas. A primeira foi obter 2% dos votos válidos para deputado federal, distribuídos em ao menos nove estados, com ao menos 1% de votos válidos em cada estado. A outra exigência era eleger ao menos 11 deputados federais, distribuídos em ao menos nove Estados. Esses critérios têm o intuito de reduzir a fragmentação partidária. Assim, progressivamente, até 2030, os critérios para atingir a cláusula vão ficando mais rigorosos.
Guilherme Carvalho pontua que houve correlação direta entre a redução de partidos no Congresso Nacional e a cláusula de desempenho, uma vez que muitos partidos, a partir de 2018, já não tiveram acessos aos recursos do fundo partidário e eleitoral, tendo de optar pela federação e com poucos recursos para tocar as campanhas. “Isso também potencializou os partidos que tiveram muito recursos. Vide o PT, o União Brasil (fusão do PSL com o Democratas), vide o próprio PL, que tinha recursos interessantes; o pP, o MDB, enfim, são partidos que continuaram mantendo uma tendência de uma bancada mediana para grande. Isso se deve, justamente, ao efeito da cláusula de barreira de 2018 e tem um outro fenômeno que é já a junção entre alguns partidos nanicos, já com partidos maiores, e gradualmente, como era uma tendência como a gente vinha apontando como algum tempo, tende a cada vez mais sumir partidos do espectro político brasileiro, até chegar a um número algo entre sete e partidos, muito provavelmente no final da cláusula, lá para 2030”, estima.
Cabe ressaltar que o não atendimento às pré-exigências da cláusula de barreiras não determina o fim dos partidos, porém, compromete seriamente o funcionamento deles. Dentre as questões, estão: o funcionamento financeiro, isso porque ficam sem acesso ao fundo eleitoral e partidário, bem como ao tempo de transmissão de rádio e televisão. Essa é considerada a principal moeda de troca das legendas nanicas para possíveis apoios eleitorais, formando coligações, que atualmente são autorizadas apenas para chapas majoritárias. Por outro lado, em exercício, esses partidos ficam incapazes de segurar os parlamentares, que ficam autorizados a mudar de sigla sem perda de mandato. Para escapar das restrições, há duas alternativas para eles: uma era a federação cujos partidos concorrem juntos, somam os votos e podem atender à cláusula. Optaram por isso o PV e o PCdoB, formando a federação com o PT, o Cidadania ao se unir ao PSDB; e o PSOL com a REDE. Entretanto, eles perdem autonomia, passando a se comportando como um único partido e com uma única liderança, embora preservem o registro e acesso a recursos públicos para a sobrevivência.
Após as eleições, ao não atender às regras, a única alternativa é a fusão ou incorporação entre os partidos. Isto é, de pequenas legendas sendo anexadas a outros para ficar do tamanho suficiente para a sobrevivência, como tem sinalizado o Pros e o Solidariedade. Nesse caso, a decisão é permanente, podendo até formar outro partido. Essa foi a solução adotada pelo antigo PHS, incorporado pelo PCdoB na última legislatura, e o antigo PRP, fundido com o Patriota.
Assembleia Legislativa

Diferente da Câmara dos Deputados, a Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) aumentou a quantidade de partidos. A Casa, a partir do próximo ano, terá a representação de 15 partidos. São eles: MDB, com 7 cadeiras; União Brasil, 6; Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), 4; federação PCdoB–PT–PV, 3; PL, 3; pP, 3; Agir, 2; Avante, 2; federação Cidadania–PSDB, 2; Patriota, 2; PSD, 2; Republicanos, 2; e PSB, PSC e Solidariedade, que elegeram um deputado estadual cada. Os partidos novos foram: Agir e Avante.
Foram reeleitos para mais um mandato os seguintes nomes: Bruno Peixoto (UB), Lucas Calil (MDB), Antônio Gomide (PT), Amauri Ribeiro (União Brasil), Amilton Filho (MDB), Major Araújo (PL), Delegado Eduardo Prado (PL), Cairo Salim (PSD), Charles Bento (MDB), Paulo Cezar Martins (PL), Thiago Albernaz (MDB), Talles Barreto (UB), Wilde Cambão (PSD), Gustavo Sebba (PSDB), Virmondes Cruvinel (UB), Henrique Cesar (PSC), Karlos Cabral (PSB) e Coronel Adailton (PRTB).