Em 1998, Caiado disse que jamais subiria no palanque do PMDB
10 março 2018 às 23h10

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Hoje aliados, senador do DEM e Iris Rezende parecem ter esquecido das eleições daquele ano, quando se atacaram mutuamente

Em uma matéria publicada pelo jornal “Diário da Manhã”, em 26 de junho de 1998, uma fala de Ronaldo Caiado, então candidato a deputado federal pelo PFL, chama a atenção. Um dos principais nomes da oposição centro-liberal ao governo estadual — que teve Marconi Perillo (PSDB) na cabeça da chapa —, Caiado foi categórico ao afirmar que jamais defenderia uma coligação com o PMDB — hoje MDB.

“Você até poderá botar em dúvida o comportamento de algumas pessoas, mas jamais me verá defendendo uma coligação com o PMDB. Independentemente de ser presidente do PFL ou não, eu jamais irei ao palanque do PMDB porque as minhas posições são contrárias aos métodos usados para administrar o Estado e de fazer política”, disse o atual senador pelo DEM.
O discurso foi feito em um contexto específico: ventilava-se a ideia das oposições não lançarem chapa e se unirem ao MDB. Caiado, no entanto, era contrário. Mas, de qualquer forma, a fala não deixa de ser contraditória, haja vista que o senador está, atualmente, próximo de Iris Rezende e, portanto, subentende-se que a opinião de Caiado sobre os tais métodos de administrar o Estado e de fazer política tenha mudado, tornando-a incoerente.
O pleito daquele ano foi marcado por uma virada histórica de Marconi Perillo (PSDB), que, antes da definição de sua candidatura, se preparava para a reeleição à Câmara Federal. O candidato de oposição ao governo do MDB, que estava no poder desde 1983, tinha tudo para ser Roberto Balestra, então filiado ao PPB — hoje no PP —, cujo nome não empolgou, como ele mesmo admitiu ao renunciar.
Para Iris, à época senador, o objetivo não era só vencer no primeiro turno, mas também ser o mais bem votado do Brasil. E a indefinição da oposição o ajudava. As pesquisas de intenção de voto logo após a oficialização de Marconi davam a entender que o emedebista alcançaria seu objetivo. Contudo, a acomodação em virtude da vantagem folgada refletiu nas urnas e o cenário foi se alterando.
Pesquisa Serpes de 7 de julho dava Iris com 66,1% e Marconi com 6,5%. Em 2 de agosto, o emedebista chegou a atingir 67,6% das intenções de voto. O tucano foi crescendo pouco a pouco — em setembro, a diferença já era de aproximadamente 10%. Em 4 de outubro — data do primeiro turno —, a surpresa: Davi venceu Golias por 48,59% a 46,91%.

Iris não só fracassou na intenção de ser o governador mais bem votado do País, como também teve que enfrentar um segundo turno saindo na desvantagem.
Na edição 1.191 do Jornal Opção, o emedebista argumentou que “as oposições estão em decadência em Goiás justamente porque não são capazes de sentir a realidade e perderam a capacidade de renovação”. A fala de 20 anos atrás pode servir para a conjuntura política atual. Talvez sem saber, Iris fez uma previsão certeira, mas não conseguiu prever mais uma derrota no segundo turno de 1998. Ele estava crente que iria sair vitorioso. Porém, o Tempo Novo de Marconi ganhou com 53,28% ao final das urnas apuradas.
Ataques
Outro presságio que Iris não faria naquele ano era o de que, décadas mais tarde, se aliaria a Ronaldo Caiado. Caso contrário, teria poupado críticas àquele que, em 1998, chamava de “força do atraso”, conforme mostra capa da última edição do Jornal Opção antes do primeiro turno.

Também na capa, mas desta vez do “Diário da Manhã”, de 10 de outubro, um informe especial da campanha de Iris classificava Marconi de ser “a face jovem das velhas oligarquias que tentam restaurar seus privilégios”.
O emedebista batia pesado tanto em Marconi quanto em Caiado. Uma semana antes do segundo turno, Iris alegou que o tucano tinha o apoio de coronéis, como Ary Valadão, Otávio Lage e o próprio Ronaldo Caiado. Para o atual prefeito de Goiânia, Marconi deveria ter vergonha de caminhar ao lado de políticos como estes, que, segundo ele, perseguiram, prenderam e torturaram pessoas durante a ditadura militar.
“Marconi deveria ter vergonha de andar com políticos como Ronaldo Caiado, que representa ‘as forças do atraso'”
Iris Rezende
Iris parecia gostar deste discurso, pois dizia que a imagem que a oposição à época defendia era de voltar ao tempo dos Caiado, “que só nos trazem imagem de destruição”.
E mais: “Ronaldo Caiado apareceu anunciando medidas e mais medidas, como se fosse ele o governador. Aí ficamos pensando como seria um hipotético governo deles. Seria um verdadeiro balaio de gato, com todos querendo mandar, cada um puxando para o seu lado”, sublinhou Iris em entrevista ao Jornal Opção (edição 1.215).
“A união forçada deles já não está dando resultado na Prefeitura de Goiânia. A vice-prefeita [de Nion Albernaz, Maria Valadão (PTB)] renunciou antes mesmo de assumir”, complementou na mesma entrevista — aqui, cabe destacar mais um paralelo na fala de Iris com o futuro: eleito prefeito em 2016, seu vice, Major Araújo (PRP), também renunciou antes de assumir.
Por fim, o emedebista denunciava a coligação de Marconi por praticar “familiocracia”, citando os exemplos de Ronaldo Caiado e do ex-deputado estadual Luiz Antônio Caiado. Mas é impossível não lembrar que a sua esposa, Iris Araújo, foi suplente do senador Maguito Vilela (MDB) — que enxergava Caiado como cacique e acusava Marconi de comandar o atraso — naquelas mesmas eleições.
O troco
Ao seu melhor estilo, o senador Ronaldo Caiado não deixava barato as criticas que recebia de Iris Rezende e atacava tanto a figura do hoje prefeito de Goiânia quanto do MDB como um todo.
Caiado expressava, na edição 1.199 do Jornal Opção, não conseguir entender por que o povo continuava votando no MDB, que, na sua opinião, tinha feito “governos nefastos”. “A prática adotada por eles é a do massacre, da prepotência.”
“Não estamos lutando contra apenas um PMDB, nós estamos lutando é contra a venda de Cachoeira Dourada e do BEG [Banco do Estado de Goiás], contra candidaturas de pessoas que não tem nenhum nome na política do Estado e que, de repente, acha que pode leiloar e comprar a consciência do povo goiano”, externou Caiado (“Diário da Manhã”, 27 de junho).
Já após o resultado final (Diário da Manhã, 27 de outubro), o deputado federal eleito pelo PFL se preocupava com a maneira com que Marconi receberia o governo. “O governador Marconi Perillo vai receber o governo, no dia primeiro de maio, em estado de terra arrasada como resultado dos desmandos praticados pelos governos do PMDB ao longo dos anos.”
Vídeos
Um vídeo disponível no YouTube, intitulado “Ronaldo Caiado em entrevista ao programa Goiânia Urgente, em 1998”, evidencia as divergências do senador com o MDB.
“O PFL deu uma lição a nível nacional que não só é o maior partido do País. É um partido competente que sabe governar essa Nação. Quando o PMDB reúne, tem que levar polícia. Na reunião do PMDB executivo, dá polícia. Palavrões, agressão, desrespeito à população, sem proposta nenhuma, fisiologismo total”, ataca Caiado.
“Quando o PMDB reúne, tem que levar polícia. Na reunião do PMDB executivo, dá polícia. Palavrões, agressão, desrespeito à população, sem proposta nenhuma, fisiologismo total”
Ronaldo Caiado
https://www.youtube.com/watch?v=gSWAKuH65G0
Em outro vídeo, também encontrado no YouTube, chamado “Eleições 1994 para o Governo de Goiás”, o pré-candidato ao Palácio das Esmeraldas critica a família Vilela, que havia feito um acordo com os Carvalho no passado para terem todas as terras banhadas por águas afluentes do Rio Ariranha.
A família de Maguito e seu filho, Daniel, acabou não ficando com as terras. No debate das eleições de 1994 — marcadas por fortes ataques de todos os lados —, Caiado não mediu esforços para tentar abalar a imagem dos Vilela. “Vossa Excelência não teve a terra. Isso é incompetência, congênita e geneticamente determinada.”
Vinte anos depois…

Em 1998, se alguém dissesse que Ronaldo Caiado e Iris Rezende seriam aliados no futuro seria taxado como louco. Mas foi justamente o que ocorreu. Em 2014, o emedebista saiu candidato ao governo e o democrata ocupou a vaga única da chapa para o Senado.
Dois anos mais tarde, o apoio permaneceu. Iris concorreu à Prefeitura de Goiânia com o respaldo do senador, cuja filha, Anna Vitória Ramos Caiado, foi nomeada à Procuradoria-Geral do Município pelo emedebista.
Agora, o desenho político para a eleição deste ano se encontra da seguinte maneira: o vice-governador José Eliton, do PSDB, está consolidado como o candidato da base; na oposição, há quem defenda a união, mas, no momento, tanto Daniel Vilela quanto Ronaldo Caiado se apresentam como postulantes ao governo.
Um dos políticos que defendem tal união é o próprio Iris Rezende. Além dele, o senador conta com o apoio de outros emedebistas importantes Goiás afora, como Adib Elias, Ernesto Roller e Paulo do Vale, prefeitos de Catalão, Formosa e Rio Verde, respectivamente.
Vinte anos depois, Iris e Caiado parecem mesmo ter esquecido da campanha agressiva de 1998, especialmente o primeiro em relação a uma entrevista à edição 1.215 do Jornal Opção.
Nela, o prefeito de Goiânia diz que sempre estimulou o jovem a participar da política. “Nesses 40 anos de vida pública, nunca estive distante dos movimentos jovens. Na política, só incentivei e apoiei os jovens.”
Nos bastidores, circula a informação de que Iris quer convencer Daniel a apoiar Caiado. Por coerência, não seria natural que o emedebista apoiasse seu correligionário, de 34 anos, ao invés de seu antigo rival, de 68? Difícil é cobrar coerência de quem não se envergonha em andar com aquele que já chamou de “força do atraso” e, dessa forma, tende a passar a impressão para o eleitor de que o grau de confiabilidade da aliança é praticamente nulo.