15 de outubro é o Dia do Professor. Mas, afinal, o que se tem a comemorar? Uma pesquisa realizada pelo instituto de pesquisa Ipec no segundo semestre de 2022 revelou que pelo menos 71% dos professores estão estressados pela sobrecarga de trabalho. Esse levantamento ouviu 6.775 profissionais de escolas públicas (municipais e estaduais) de todo o país.

De acordo com a pesquisa, os professores estão mais preocupados com a necessidade de apoio psicológico (18%) do que com o aumento de salário (17%). O desinteresse dos estudantes é um problema comum a 31% dos professores entrevistados, mais do que a defasagem na aprendizagem dos alunos (28%).

Segundo a deputada estadual Bia de Lima (PT), que já foi presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego), os “ataques contínuos” à categoria nos últimos anos trouxeram consequências. Uma delas seria a falta de interesse da juventude pela profissão: “Ninguém mais quer ser professor. Ninguém quer ter como opção a carreira do magistério. Aquilo que outrora era motivo de orgulho, de prestígio, hoje é um trabalho exaustivo, estressante e que tem adoecido a categoria. Precisamos mudar isso urgentemente, senão o preço é muito caro”, apontou.

A parlamentar reclama ainda que, ao longo dos anos, o professor perdeu a perspectiva de carreira. “Estudar deixou de ter importância”, disse. Segundo ela, o profissional com pós-graduação não é valorizado e recompensado financeiramente por isso na rede pública. E para isso, segundo ela, não basta sói a mudar a lei. “Hoje a gente tem uma plataforma de denúncia para criar mecanismos que prejudicam o professor, mas não temos uma plataforma de mérito, de mostrar os grandes feitos, a inovação, o trabalho dedicado e compromissado de quem trabalha na educação”, comentou.

E Bia destaca ainda que a falta de reconhecimento – e respeito – social atrapalha muito a vida do professor. “Ao longo dos tempos foi havendo um desprestígio da profissão e isso veio acompanhado de descapitalização. Num pais capitalista, você vale quanto você ganha. Hoje todo mundo fica muito à vontade pra desrespeitar o professor. Se o governo não respeita, automaticamente a sociedade faz a mesma coisa”, pontuou.

Deputada Bia de Lima lamenta desvalorização dos professores | Foto: divulgação

A deputada lamenta que não se vê “ninguém enaltecendo os professores”. “Você vê mãe de aluno que entra na escola e agride o professor. Aluno, autoridades, todo mundo se acha no direito de culpar os professores”. E esse desprestígio atinge até os professores aposentados: “não têm reconhecimento nem social nem profissional”, acrescentou.

E Bia denuncia ainda que o professor é condenado por pregar a pluralidade de ideias. “O professor está refém. Dos políticos, dos alunos e da sociedade. Alguns segmentos sociais não compreendem o papel múltiplo do professor e criam um sistema terrorista que o oprime”, afirmou.

Homenagem aos professores na Assembleia será no fim do mês

A deputada Bia, que não é de hoje que levanta a bandeira da Educação, já agendou uma sessão solene em comemoração ao Dia do Professor para o dia 30 de outubro, às 9h, no plenário Iris Rezende da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego). Segundo ela, professores receberão na ocasião a comenda Paulo Freire. “Não teve como ser antes por falta de agenda na Assembleia”, explicou a parlamentar.

E a escolha dos homenageados já está ocorrendo de forma democrática, uma vez que é feita pelas próprias unidades escolares. Até a próxima sexta-feira, 20, as escolas devem encaminhar para a Alego o nome de alguém que tenha se destacado. E a deputada garantiu que todas as unidades de ensino pode ter um profissional homenageado.

De acordo com a Secretaria de Estado da Educação (Seduc), a rede estadual de ensino emprega hoje 28.367 professores, espalhados em mil escolas. Em Goiânia, segundo a Secretaria Municipal de Educação (SME), a rede municipal de ensino conte hoje com cerca de 8,2 mil professores em sala de aula, distribuídos 378 unidades educacionais (sendo 197 destinadas exclusivamente ao atendimento da educação infantil e 176 que também oferecem o ensino fundamental, além de outras cinco que trabalham apenas com educação especial e apoio à inclusão).

Professor cego forma professores em Goiânia

Professor Romeu perdeu a visão sete anos depois de começar a dar aulas | Foto: arquivo pessoal

Romeu Fernandes de Lima começou a trabalhar como professor em 2000, ainda enxergando, dando aulas de Matemática e Física. Sete anos mais tarde, depois de um glaucoma, ficou cego. De lá pra cá, sua motivação profissional não mudou: contribuir com o próximo. Atualmente, ele está lotado da Gerência de Formação de Professores da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia, onde ministra cursos de formação continuada nas áreas de Matemática e Inclusão.

E é com muito entusiasmo que Romeu conta sobre sua rotina de trabalho: “a gente está com a formação voltada para professores do quinto ano do ensino fundamental. Ensino diferentes formas de abordar a Matemática em sala de aula para que o estudante tenha um maior aproveitamento da disciplina”, explicou.

Na visão de Romeu, a formação continuada de professores é essencial. “Eles chegam nas instituições sem conhecer a política da rede e até mesmo com defasagem de conceitos. E a formação continuada vem pra suprir essas dificuldades que eles têm no sentido de qualificá-los para que o conteúdo das disciplinas seja apresentado para os estudantes de uma forma mais satisfatória”, afirmou.

Depois que ficou cego, o professor já chegou a trabalhar com estudantes com deficiência visual, mas nunca com alunos regulares. “Voltar pra sala de aula regular seria um grande desafio. Eu iria precisar de uma pessoa pra me auxiliar. Consigo trabalhar o conteúdo com os estudantes, mas para acompanhar o desenvolvimento das atividades, alguém teria que acompanhar”, detalhou. No entanto, Romeu não descarta a possibilidade: “Quem sabe no futuro?”

Para o professor, o maior desafio é a falta de acessibilidade. Não ter um conteúdo adaptado à sua realidade ainda é uma grande barreira. “Às vezes preciso ler um material e não tem ele de forma acessível pra mim. É preciso adaptar esse material pra minha realidade. Precisa ser digitalizado da forma correta para quem um software específico consiga ler o conteúdo pra mim”, disse.

Sobre a inclusão nas escolas, Romeu acredita que apesar dos avanças, ainda há muito a ser feito. “Precisa ter mais investimentos, mais qualificação para os profissionais. Até mesmo porque o público da inclusão é muito heterogêneo. Por isso, o atendimento precisa ser diverso e isso acaba dificultando uma inclusão”.

E o professor é a favor de colocar os alunos de inclusão junto com os estudantes regulares. “A diversidade ajuda na formação. A troca de experiências é importante para evoluirmos como sociedade”, arrematou Romeu.

Um professor homossexual num colégio militar

Túlio Carmo, professor: “Nunca me senti desrespeitado por ser gay nem nunca escondi isso de ninguém” | Foto: arquivo pessoal

Túlio Carmo Conceição é professor de Biologia no Ensino Médio da rede pública de ensino. Há quatro anos, dá aula no Colégio Estadual da Polícia Militar, unidade Cabo Edmilson de Sousa Lemes, em Palmeiras de Goiás. Homossexual, ele relata que nunca sofreu preconceito no exercício de sua profissão, mesmo em um colégio onde a educação é militarizada. Já até foi agredido verbalmente por um aluno, mas não por causa de sua sexualidade.

“Nunca me senti desrespeitado por ser gay nem nunca escondi isso de ninguém. Já tiveram discussões sobre a questão da homossexualidade e acabei me posicionando, mas as pessoas foram bastante receptivas comigo. Na escola isso é uma questão pacificada e bem resolvida. Os alunos respeitam a minha sexualidade”, comenta o professor.

Sobre a militarização do ensino, Túlio afirma que entende as críticas que esse modelo de educação sofre, mas também reconhece os pontos positivos dos colégios militares. “Cada escola tem uma realidade diferente. E trabalhamos para que todos tenham acesso à educação de qualidade, sem restrição”, pontua.

Como lida diretamente com os jovens, o professor ressalta que a grande dificuldade no processo de ensino-aprendizagem hoje em dia se dá por conta da falta de interesse da maioria dos estudantes nos estudos. “A pandemia agravou a situação, mas isso é algo que já existia antes. Os alunos chegam na escola com um desinteresse tremendo. E é muito difícil falar de um assunto que a pessoa não está aberta a aprender”, explica.

Túlio reforça ainda que as redes sociais roubam a atenção dos alunos, mas o problema vai além disso, porque elas moldaram toda uma geração no imediatismo e superficialidade. “A sala de aula não funciona como rede social. Para aprender um conteúdo na escola, é preciso de mais foco na atenção. E os jovens não estão acostumados a prestar atenção por um período longo de tempo”, destaca.

O professor pondera que os adolescente têm muita habilidade com os smartphones, mas não o entendem como uma ferramenta para além do lazer. “Dá prazer muito mais coisa com o celular. Se fosse mais usado no processo de ensino-aprendizagem, seria muito útil, a escola até tenta, mas é muito difícil mudar uma cultura”, completa.