Contas de Alcides Rodrigues estão há quatro anos à espera de julgamento
17 maio 2014 às 12h07
COMPARTILHAR
Balanço Geral do Estado referente ao exercício de 2010 ainda não foi julgado pelo Palácio Alfredo Nasser. Relatório do TCE apontou várias irregularidades e manifestou parecer recomendando a rejeição. Deputados da base governista estariam travando a pauta que decidiria o destino político do ex-governador
Frederico Vitor
O balanço geral do Estado referente ao exercício de 2010, último ano de gestão do ex-governador Alcides Rodrigues (à época PP, atualmente no PSB), ainda não foi julgado pela mesa diretora da Assembleia Legislativa de Goiás. Quase quatro anos depois do último período do governo anterior, ainda não existe nenhuma previsão de quando as contas do ex-chefe do Executivo goiano passará por julgamento no Palácio Alfredo Nasser. Curiosamente, deputados tucanos estariam travando a realização da pauta que julgaria o destino político do ex-pepista.
Em março de 2012, a Comissão de Tributação, Finanças e Orçamento da Assembleia Legislativa votou pela rejeição das contas, acompanhando a sugestão do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que emitiu parecer prévio pela rejeição do balanço referente ao ano de 2010. Desde então, a pauta que julgaria as contas do último ano de Alcides Rodrigues no comando do governo estadual tem sido postergada.
De acordo com o ditame prévio do TCE, que teve como relatora a conselheira Carla Cíntia Santillo, foram detectadas cinco irregularidades e três improbidades administrativas. Desde sua criação em 1953, esta foi a primeira vez em que a corte de contas do Estado emitiu parecer recomendando a rejeição das contas de um governador.
Entre os pontos do primeiro item, está o atraso da folha de dezembro de 2010 dos servidores públicos do Estado, a partilha das receitas tributárias entre os municípios, inferior à obrigatória, o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em vários quesitos — entre eles, a queda crescente do superávit e o aumento do déficit —, ausência de controle de precatórios pendentes de pagamento e o não repasse dos 0,25% da receita de impostos à pesquisa agropecuária e difusão tecnológica.
Das impropriedades, há casos relatados pela corte de contas em que houve erros na escrituração contábil que impactam na análise e mensuração dos índices, dificultando a visualização da real situação financeira do Estado. Existiu também a omissão de dados e descumprimento da lei no que diz respeito à educação, saúde, transportes e execução de obras. O parecer desfavorável à aprovação das contas relacionadas a 2010 foi encaminhado pelo TCE à Assembleia Legislativa em 2011, quando a presidência da Casa era exercida pelo atual prefeito de Catalão, Jardel Sebba (PSDB).
A rejeição das contas de Alcides Rodrigues chegou a estimular discussões acaloradas no plenário da Assembleia. As reuniões da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou as irregularidades ficou conhecida como a “CPI do rombo”. Logo após o parecer prévio do TCE, o ex-secretário da Fazenda Simão Cirineu visitou o Legislativo e reafirmou que recebeu o Tesouro Estadual com um déficit de R$ 2,113 bilhões em janeiro de 2011, sendo que R$ 641 milhões eram de restos a pagar e R$ 382 milhões referentes à folha de pagamento de servidores.
Sem previsão
Segundo o presidente da Assembleia Legislativa, Helder Valin (PSDB), a responsabilidade por colocar a pauta em votação é do líder do governo no Legislativo estadual, ou seja, do deputado Fábio Sousa (PSDB). O tucano diz que a votação é nominal e que já ordenou sua colocação na pauta juntamente com as contas relacionadas a 2011 e 2012 — já na gestão do governador Marconi. “Eu apenas presido, minha responsabilidade neste assunto vai até aí. A condução da matéria, como é de interesse governamental, é por parte do líder do governo. Não a coloquei na pauta antes porque não houve solicitação.”
Por sua vez, o deputado Fábio Sousa afirma que a responsabilidade de colocar a matéria em pauta é do presidente Helder Valin, e que, recentemente, houve uma oportunidade de realizar o julgamento do parecer prévio do TCE, mas não foi adiante por falta de quórum qualificado. “Isso depende do presidente Valin, é a mesa diretora quem decide quais pautas vão à votação.”
Enquanto o presidente do legislativo goiano e o líder do governo na Casa batem cabeça, o deputado Francisco Gedda (PTN), que foi presidente da Metrobus durante o governo Alcides, afirma que a base aliada estaria esperando um momento propício para fazer o julgamento para confirmar ou não o parecer das contas de Alcides referentes ao ano de 2010. Segundo ele, a base do governo estaria cautelosa em julgar tais balanços em ano eleitoral.
Na lógica de Gedda, caso o parecer do TCE, que é de recomendação à rejeição das contas do último ano da gestão de Alcides no governo, seja julgado procedente pela Assembleia Legislativa, haveria um precedente perigoso ao governador tucano. “A oposição pode ter a maioria na próxima legislatura e tudo caminha para isso. Eles estão com medo do tiro sair pela culatra, por isso que a Casa não tem agilidade e autonomia para julgar tais contas.”
Risco de inelegibilidade
Dalmy Alves de Faria, especialista em Direito Eleitoral e Público de Goiás, em 2012 chegou a ser nomeado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Seção Goiás, como advogado dativo do ex-governador Alcides, quando da instauração da Comissão de Tributação, Finanças e Orçamento da Assembleia, que acompanhou a recomendação do TCE pela rejeição das contas de 2010. O presidente da Comissão determinou 30 dias para que Dalmy de Faria elaborasse a ampla defesa do ex-governador. Contudo, o ex-deputado e secretário de Segurança Pública de Goiás na gestão do então pepista, Ernesto Roller, foi habilitado no processo para fazer a defesa de Alcides.
Dalmy de Faria explica que se a Assembleia confirmar o parecer pela rejeição das contas relacionadas ao ano de 2010, o ex-governador ficaria imediatamente inelegível por oito anos, segundo a Lei Complementar 64/90 alterada pela 135, mais conhecida como a Lei da Ficha Limpa. Caso, por exemplo, o Legislativo goiano não julgar o parecer do TCE neste mês e vier a realizar o julgamento em agosto, mesmo se o ex-chefe do Executivo estadual estiver com candidatura registrada — o prazo vence no dia 5 de julho —, Alcides estaria em situação de inelegibilidade sobreveniente. “Se o ex-governador registrar candidatura e for condenado por rejeição de contas, se tornará inelegível e perderá seu registro.”
As decisões da Assembleia Legislativa de rejeição de contas de governadores não podem ser questionadas na Justiça. Como se trata de um julgamento político/administrativo não pode ter o seu mérito questionado. Neste caso, o Poder Judiciário só entraria se existir a chamada ofensa ao processo legal, ou seja, se o réu não tiver condição ou for impedido de exercer sua ampla defesa no julgamento. “Se o Legislativo seguir corretamente o que manda a Constituição, dando o direito de ampla defesa, uma vez ajeitada, não há instância na Justiça que mudaria tal decisão.”
Irregularidades apontadas pelo TCE nas contas de 2010 do governo Alcides Rodrigues
1 — O não repasse de recursos financeiros do Poder Executivo aos demais Poderes do Estado, Tribunais de Contas e Ministério Público para pagamento das despesas com pessoal e encargos sociais no mês de dezembro de 2010, conforme prevê as Constituições Estadual e Federal. Segundo TCE, o ocorrido implicou transtornos de ordem social e econômica às famílias dos servidores públicos do Estado e ao comércio em razão das festas natalinas e de ano-novo.
2 — Descumprimento das regras constitucionais de repartição obrigatória das receitas tributárias com os municípios, porquanto houve repasse a menor em 0,61%. No exercício de 2010, o Estado repassou aos municípios, a título de destinações tributárias constitucionais, o valor de R$ 2.234.314.790,051, tendo sido constatado um repasse a menor de R$ 13.682.186,06, equivalente a 0,61%, posto que o valor devido aos municípios era de R$ 2.247.996.976,57.
3 — Infringiu a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em quatro pontos:
a) quociente da situação financeira: demonstrando superávit financeiro de R$ 8,957 milhões em cuja apuração se considera, no realizável, um saldo de R$ 908,091 milhões, referentes aos créditos de contribuições previdenciárias, para os quais o Estado é também devedor. Dessa forma, ao desconsiderar as contribuições previdenciárias o Estado apresentaria déficit financeiro.
b) quociente do resultado dos saldos financeiros: demostrando déficit de R$ 438,084 milhões, em contrapartida ao superávit de R$ 161,570 milhões encontrado em 2009, demonstrando queda crescente e significativa de 2007 a 2010 e evidenciando, em 2010, gastos orçamentários e extraorçamentários maiores que as disponibilidades arrecadadas. Esse quociente atingiu 0,74, verificando-se uma queda crescente e significativa de 2007 a 2010.
c) quociente do resultado da execução financeira negativo em 2010: demonstrando elevadas despesas orçamentárias e extraorçamentárias sem os devidos recursos. Esse quociente atingiu 0,98, que indica elevada despesas sem os devidos recursos.
d) quociente da execução orçamentária deficitário em R$ 667 milhões: As receitas e despesas previstas na Lei de Diretrizes Orçamentárias foram R$ 12,433 bilhões e R$ 10,822 bilhões, respectivamente. No entanto, o Estado obteve uma receita de R$ 13,899 bilhões e uma despesa de R$ 14,566 bilhões, resultando em um déficit na execução orçamentária de R$ 667,400 milhões. Esse quociente atingiu 0,95.
4 — Descumprimento do parágrafo 5º do artigo 100 da Constituição Federal, pela ausência de controle dos precatórios pendentes de pagamento, apresentados até o dia 1º de julho de cada exercício, cujos valores devem ser considerados na mensuração da dívida consolidada.
5 — Descumprimento do disposto no inciso IV, artigo 158, da Constituição Estadual, que determina a aplicação de 0,25% da receita de impostos em pesquisa agropecuária e difusão tecnológica. No exercício de 2010, essa aplicação representou 0,11%, ou seja, 0,14% abaixo do determinado.
Impropriedades apontadas pelo TCE nas contas de 2010 do governo de Alcides rodrigues
1 — Inconsistências contábeis e procedimentos inadequados que afetaram a evidenciação do patrimônio do Estado nas demonstrações financeiras do exercício de 2010. Os erros na escritura contábil refletem negativamente nas análises, na mensuração dos índices e na apuração das disponibilidades, prejudicando a visualização real da real situação financeira do Estado. Houve evidência de fragilidade nos controles de bens, direitos, haveres e obrigações do Estado.
2 — Omissão na classificação das disponibilidades por fonte de recursos no Demonstrativo da Disponibilidade de Caixa, infringindo ao preconizado pelo inciso I do artigo 50 da LRF. O demonstrativo visa dar transparência ao montante disponível para fins da inscrição em restos a pagar, demonstrando se o ente possui liquidez para arcar com seus compromissos financeiros.
3 — Reincidência no descumprimento de pendência da execução do convênio firmado com a Agetop para cumprimento dos índices relativos ao exercício de 2008 na educação, com 14,75% de obras executadas em 2010 e na saúde, com 4,37% de obras executadas no mesmo ano. Nas duas áreas, educação e saúde, não foram cumpridas as recomendações feitas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).