Comércio, cultura e moradia impulsionam nova fase do Centro

27 setembro 2025 às 21h00

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Catherine Moraes e Kamylla Rodrigues
Especial para o Jornal Opção
Sexta-feira, 6 horas da tarde. O vai e vem de carros é substituído por mesas, cadeiras e gente. Há mais de um mês, a Rua 8, no Centro de Goiânia, passou por uma mudança simples que transformou o cenário e os ânimos de quem vive e trabalha ali. A rotina ganhou um novo ritmo. Aliás, vários: MPB, pop rock, rock e samba. Os comerciantes notaram aumento de frequentadores e, consequentemente, de faturamento. Para eles, uma esperança de que o coração histórico e comercial da capital mostre sinais concretos de retomada econômica.
O trecho que vive esse novo momento fica entre a Avenida Anhanguera e a Rua 4 e abriga além do tradicional Cine Ritz, dois bares, quatro distribuidoras e um estúdio de tatuagem. Vinícius Gade Rossi é sócio-proprietário do Casa Libertè, que está no Centro desde 2018 e, especificamente na Rua 8, desde 2021. “Com essa mudança aqui na rua aos finais de semana, a movimentação aumentou em média 20%. Em algumas ocasiões pontuais eu aumento o número de mesas aqui fora de 20 para 40. Pra gente, essa foi uma forma até de sobrevivência”, afirma o empresário.
E não é só o comércio que agradece. Com mais espaço para mesas, feiras criativas e até apresentações artísticas, o Centro revive não apenas como endereço de lojas e escritórios, mas como lugar de memória e pertencimento. “Eu lembro de vir aqui na infância com minha mãe pra resolver problemas em banco, lojas. Passei muito tempo sem voltar e hoje trazendo meus filhos é como se eu voltasse no tempo. É um respiro pra todo mundo”, comemora o autônomo Alexandre Davos, que mora na região noroeste de Goiânia e adicionou na agenda de folga da família a visita ao Centro.
A medida faz parte do projeto Ocupa o Centro, de autoria da vereadora Aava Santiago (PSDB), que foi apresentado em 2021 e se tornou lei (Nº11.293) no final de 2024. O trecho da Rua 8 fica bloqueado às sextas-feiras e sábados a partir das 18 horas, e durante todo o dia aos domingos e feriados. “Essa lei vem também como forma de manutenção permanente para a região, como a iluminação pública, instalação de banheiros químicos, força tarefa de limpeza. Além disso, abre portas de possibilidades para que outros espaços do Centro recebam iniciativas semelhantes”, reforça a vereadora ao citar um projeto de lei já em tramitação na Câmara que torna o trecho da Rua 8 em um calçadão permanente, assim como a Rua do Lazer.
Até quem não está no trecho beneficiado com a interdição, saiu ganhando. O Central Rock Bar fica na Rua do Lazer – continuação da Rua 8 – e foi inaugurado há quatro meses por Thiago Cavalcante de Oliveira, empresário que atua há 15 anos na região. Apesar de o bar ser recente, a escolha pelo endereço foi estratégica e simbólica. “A gente sempre acreditou na volta do Centro como um ponto de encontro que um dia já foi. O Centro é rico em cultura e entretenimento e com mais gente vindo, mais faturamento, mais valorização, mais história preservada”, ressalta Thiago.
O Centro tem atualmente 14.980 CNPJ e MEIs ativos, segundo levantamento da Junta Comercial do Estado de Goiás (Juceg). A média da arrecadação mensal de ICMS dos últimos oito meses do Centro girou em torno de R$14 milhões, o que corresponde a 2,58% da arrecadação total de Goiânia, de acordo com estimativas da Secretaria de Economia do Estado. Gerente de negócios e relacionamento da Câmara de Dirigentes Lojistas de Goiânia (CDL Goiânia), Wanderson Lima é enfático ao dizer que o Centro é uma grande potência econômica. “O Centro não morreu. Ele só precisa de atenção. A Rua 8 e a Rua do Lazer são provas de que, com projetos bem pensados, é possível trazer vida de volta. Essas ações pontuais podem ser replicadas em outras áreas da região. A visão de futuro é clara: transformar o Centro de Goiânia em um lugar atrativo não apenas para o comércio, mas também para moradia, turismo, cultura e inovação. Queremos que as pessoas voltem a morar no Centro, que queiram empreender lá. Com segurança, mobilidade e incentivos, isso é totalmente possível”, explica.
“Mais do que um bairro, o Centro de Goiânia é uma síntese da identidade da cidade. É ali que estão as raízes da capital: na geometria das calçadas, nas fachadas desenhadas dos prédios, nos detalhes dos vitrais, nos bancos antigos das praças e nos coretos que ainda guardam histórias de encontros e manifestações. Revitalizar o Centro é mais do que uma questão econômica, é um ato de preservação da memória coletiva”, Wanderson Lima, Gerente de negócios e relacionamento da CDL Goiânia.
A CDL Goiânia tem atuado como ponte entre os empresários e o poder público. Por meio do departamento de Relações Institucionais e Governamentais (RIG), a entidade acompanha projetos de lei e participa do debate sobre as mudanças necessárias para o bairro. “Levamos as pautas dos pequenos e grandes lojistas à Câmara e à Prefeitura. Sugerimos, opinamos tecnicamente e acompanhamos os desdobramentos”, ressalta Wanderson. Recentemente, uma audiência pública reuniu representantes de entidades como a CDL de Goiânia, empresários e autoridades para discutir caminhos viáveis para a revitalização e reocupação do Centro. “Nosso objetivo é elevar o movimento no bairro, manter as empresas que estão lá e atrair novos empreendimentos. Nós apresentamos sugestões e reforçamos o compromisso com a revitalização do Centro, que inclui desde questões de mobilidade e segurança até incentivos fiscais e preservação do patrimônio cultural”, pontua Wanderson Lima.
A Prefeitura de Goiânia enxerga essa movimentação como parte de um projeto mais amplo para reativar a vida no centro histórico da cidade. A expectativa é de que outras vias da região também passem a ser reurbanizadas ou fechadas ao trânsito em dias específicos, ampliando o potencial cultural e econômico da área. Uma das ideias é ampliar o horário de funcionamento dessas lojas para que os visitantes também da noite possam movimentar a economia não só dos restaurantes e do cinema.

Novo cenário, mas com problemas antigos
Vinícius Gade Rossi, sócio-proprietário do Casa Libertè e Thiago Cavalcante de Oliveira, dono do Central Rock Bar, assim como os frequentadores dos bares veem com bons olhos a retomada da região, mas ainda não são tão otimistas quanto aos problemas que ainda permanecem. O principal deles: Segurança Pública. O policiamento da região, que além do Centro conta com outros 64 bairros, é feito pelo 38º Batalhão da Polícia Militar. Apenas no mês de setembro (de 1º a 22) foram registradas 122 ocorrências. A mais comum, furto a comércio com 47 registros. O levantamento feito pela PM aponta ainda que 47% dos furtos a comércio são cometidos por pessoas em situação de rua, outro ponto levantado pelos comerciantes como um problema da região central.
O prefeito de Goiânia, Sandro Mabel (União Brasil), afirma que tem trabalhado para acolher e encaminhar as pessoas em situação de rua não só do Centro, mas de toda a cidade. “Não é possível apontar uma única medida, porque cada pessoa tem uma demanda individual e precisa ser atendida dentro dessa individualidade. Por isso nosso plano é amplo. Tem gente que quer voltar para casa, muitas vezes em outro estado. Nesses casos, fazemos o contato com a família, verificamos a possibilidade do retorno e damos a passagem. Outras pessoas querem um emprego. Já encaminhamos dezenas de interessados para vagas de empregos. Também temos apoio do governador Ronaldo Caiado (União Brasil) para oferecer o aluguel social. Ainda temos muitos irmãos nas ruas, que se recusam a sair. Entendemos que essas pessoas talvez não estejam em consciência plena e nosso trabalho é permanente porque não é digno morar na rua”.
Mabel reforça que está fortalecendo as parcerias da Guarda Civil Metropolitana com a Polícia Militar. “Teremos um cinturão de câmeras de monitoramento. Vamos implantar uma central para que nossos agentes possam acompanhar os acontecimentos da cidade e buscar, junto das demais forças de segurança, evitar crimes e, caso ocorram, a garantia de soluções rápidas”, garante o prefeito.
Preservação da arquitetura e da história
Além da economia, há um apelo forte à valorização da cultura e patrimônio. A região central abriga 22 edifícios e monumentos públicos tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), símbolos da história de Goiânia. A ideia defendida é que o centro seja um espaço onde o antigo e o novo convivam: arquitetura histórica e empresas de tecnologia, turismo e serviços atuando lado a lado. “Não adianta passar uma tinta num prédio histórico e, no dia seguinte, ele ser pichado de novo. É preciso manutenção contínua, segurança e políticas de preservação. Um centro bem cuidado atrai turistas, gera renda e emprego”, reforça o gerente de negócios e relacionamento da CDL, Wanderson Lima.
É no Centro de Goiânia que se encontra o maior acervo de arquitetura art déco do Brasil, fora do eixo Rio-São Paulo. Prédios como o Teatro Goiânia, o Grande Hotel, a antiga Estação Ferroviária, o Palácio das Esmeraldas e a residência do fundador Pedro Ludovico Teixeira são testemunhas da ambição moderna dos anos 1930 e 1940. Esse conjunto arquitetônico é tão relevante que, em 2024, foi tombado pelo Iphan, garantindo proteção federal a mais de 20 edifícios e ao próprio traçado urbano da região. A medida reconhece o Centro de Goiânia como um patrimônio cultural brasileiro não apenas por sua estética, mas pelo valor simbólico na história da urbanização moderna no país.

Hoje, a arquitetura se mistura às fachadas de lojas e a enorme quantidade de pichações. De acordo com o prefeito de Goiânia, Sandro Mabel, imóveis históricos nessa situação serão restaurados. “Queremos fazer do nosso Centro um ponto de visitação mundial, integrando turismo, eventos e requalificação urbana. Estamos estabelecendo incentivos fiscais, linhas de crédito e medidas para revitalizar o Centro, como a requalificação do Jóquei Clube, da Rua do Lazer e a recuperação de fachadas históricas. Temos feito mobilização por um projeto de lei que está em tramitação na Câmara dos Deputados e que pode nos dar o título de Capital Nacional do Art Déco. A iniciativa é das deputadas federais Flávia Morais (PDT) e Adriana Accorsi (PT) e relatoria de Lêda Borges (PSDB). O parecer do projeto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. “A capital goiana conta com o maior acervo do estilo no Brasil e o segundo maior do mundo, perdendo apenas para Miami, nos Estados Unidos”, afirma o prefeito.
O desafio de devolver o Centro ao povo
Uma entrevista longa que mal caberia nas páginas do jornal e uma mistura de amor e sensação de fracasso. É assim que Sérgio Duarte, historiador e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) descreve a história do Centro de Goiânia. De estrada que ligava Campinas ao que hoje conhecemos como Senador Canedo às inúmeras propostas de requalificação. “Os centros das capitais concentram a memória da população de cada Estado e aqui foram inúmeras as tentativas de revitalizar e repovoar. Toda a história de Goiás pode ser contada a partir do Centro. Todo mundo que mora em Goiânia tem uma história do Centro pra contar. Eu começo a falar sobre isso e sinto que é uma prova da nossa incompetência. Essa bronca que eu dou em todos nós talvez seja o elemento mais importante dessa luta. Mas nós nunca vamos desistir não!”, garante.
Sérgio explica que Goiânia segue um padrão de desenvolvimento urbano brasileiro e não é a única capital que tenta reviver. Outras capitais como Salvador, São Paulo, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e Manaus estão com programas de requalificação. Prefeito de Goiânia, Sandro Mabel afirma que mesmo antes de assumir a prefeitura já se interessava pelo assunto e que uma das cidades que visitou depois de eleito foi Salvador (BA). “Lá eles implantaram o Renova Centro, programa que reúne ações voltadas à requalificação do Centro Histórico de Salvador. As intervenções têm como objetivo fomentar o desenvolvimento urbano, incentivar a moradia e promover a requalificação de estruturas históricas da região central. O programa também oferece incentivos tributários para estimular a aquisição, reforma e restauração de edifícios e casarões antigos”
O prefeito explica que além dos benefícios fiscais, a iniciativa incentiva obras de edificação, recuperação e reforma na modalidade retrofit, que promove a atualização de imóveis preservando suas características arquitetônicas originais. O objetivo é estimular a ocupação do centro histórico e manter viva a memória urbana. “O pacote de ações inclui ainda medidas de ordenamento público, assistência social, zeladoria, cultura e turismo, além de projetos voltados ao desenvolvimento urbano e à geração de emprego e renda”.
Muitas das ações eram previstas pelo Centraliza, programa de revitalização do centro histórico de Goiânia que foi lançado pela gestão do ex-prefeito Rogério Cruz (Republicanos) em outubro de 2023. O objetivo era atrair moradia e negócios para a região – o que está acontecendo. O programa foi “fatiado” pela nova gestão e está sendo enviado em etapas para a Câmara Municipal com implantações pontuais. E todo esse trabalho acaba se unindo a outros projetos que têm finalidade similar.
“Não é mais o Centraliza, não é uma questão de nome, mas de muito trabalhado em todas as áreas. Temos um grupo grande de pessoas de várias pastas trabalhando para dar vida novamente para o Centro. Veja só, apenas uma simples mudança na Rua do Lazer já permitiu uma virada da percepção do Centro. Já tivemos várias lanchonetes, bares abertos. Temos movimento em uma pequena área. Independente de nome, vamos trabalhar para permitir que os comerciantes possam receber bem, as pessoas se sintam e tenhamos, principalmente, mais pessoas morando. Participei recentemente do lançamento de um empreendimento imobiliário da EBM na região. Depois disso, outros empresários me procuraram demonstrando interesse. É disso que o Centro precisa: de incentivo, pessoas e movimento”, completa Mabel.
Foi também em maio de 2023 que teve início o Viva Centro, idealizado pela vereadora Kátia Maria (PT). O programa é estruturado em cinco eixos: patrimônio material e imaterial; economia, arte , cultura e lazer; mobilidade e sustentabilidade; segurança e dignidade humana e trabalho e emprego. Desde maio de 2023, já foram realizadas 24 edições do projeto, reunindo mais de 166 mil pessoas. “Já destinei quase R$ 1 milhão em emendas parlamentares especificamente para o Centro. Esses recursos foram aplicados em diversas frentes: revitalização e zeladoria urbana (ruas, praças, postes, calçadas e vielas), iluminação, mobiliário urbano e ações de cultura e lazer, ações do Pop Rua Cidadã. Foram essas emendas que ajudaram, por exemplo, na recuperação da Praça da 15, da Rua do Lazer e na reforma da Catedral Metropolitana”, explica Kátia.
Compositor, jornalista e produtor de eventos culturais, Carlos Brandão, faz do Centro sua moradia há 30 anos. Atualmente, divide o apartamento com três amigos. Apesar de enxergar o bairro em estágio de abandono, ele não esconde a paixão pelo lugar. “O Centro é mais um bairro, mas ele tem um charme todo especial, porque foi o primeiro da cidade. Então existe uma mística, né? Mesmo abandonado — de maneira bem cruel — ele continua tendo essa importância.”
Carlos Brandão relembra ações pontuais que, em outros tempos, conseguiram movimentar a área central, ainda que por um período limitado. “O Centro sempre esteve na mira dessa coisa de revitalização. Vários prefeitos tiveram esse discurso, mas até agora isso não foi emplacado,” afirma. “Em outras épocas, outros empreendimentos também ocuparam o Centro e fizeram algum sucesso, como o Goiânia Ouro, com jazz, com o chorinho, uma série de atividades que ocuparam o Centro.”
Ele cita, como exemplo, a criação de um corredor cultural que interligava importantes espaços da cidade: “Criaram o corredor cultural que saía do Teatro Goiânia, passava pelo Goiânia Ouro, pelo Grande Hotel, pelo Teatro Sonhus e chegava no Teatro Sesc. Fizeram um circuito de teatro. Tudo isso aconteceu pela cidade.”
Para Carlos, o que falta é uma política pública mais firme e uma compreensão real da importância cultural e turística do bairro. Carlos também sugere iniciativas para dar nova vida à região, como a reativação de espaços históricos e a criação de centros culturais. “A prefeitura podia pensar em desapropriar o antigo Cine Casablanca e transformar em um centro cultural, ou mudar o Goiânia Ouro para cá. Aproveitar o embalo da Rua do Lazer e fazer um centro cultural bem na Rua do Lazer.”

Depois de 22 anos, novos imóveis voltam a ser lançados no Centro
Durante mais de duas décadas o Centro de Goiânia não recebeu novos empreendimentos residenciais. Entre os anos de 2000 e 2022, o número de moradores chegou a cair quase 25% no bairro. Prefeito de Goiânia, Sandro Mabel afirma que a estimativa atual é de 9 mil moradores, mas que o bairro já chegou a abrigar 25 mil pessoas. “Para que o Centro de uma cidade tenha vida, ele precisa de pessoas. Precisamos devolver o prazer de morar, comprar e se relacionar com o centro. Para isso temos buscado bons projetos para todas as áreas. A antiga gestão tinha um projeto, mas decidimos ampliar para fomentar a moradia, principalmente”, afirma Mabel.
Presidente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi-GO) Felipe Melazzo afirma que desde 2022 já foram entregues seis empreendimentos e que isso mostra um bom potencial de crescimento e investimento para a região. “O ponto de partida para essa nova fase foi justamente a sinalização do poder público de criar novos investimentos. A isenção do IPTU está no co-tributário municipal, que foi uma lei complementar, e essa foi a primeira sinalização de incentivo do poder público para novas ocupações do centro de Goiânia. E já está valendo para as habitações serem construídas, entregues, a partir da vigência do Código Tributário Municipal”, completa.
Em agosto, a EBM lançou o Now 111, primeiro lançamento no Centro de Goiânia com unidades 100% dentro do programa Minha Casa Minha Vida. Ele está localizado na esquina da Avenida Paranaíba com a Rua 72, composto por uma única torre, com unidades de 39 a 45 metros quadrados. Os modelos novos de apartamentos são completamente diferentes dos já existentes na região que é famosa pelos apartamentos grandes, com salas que reuniam amigos e famílias em festas, em uma época que o lazer era feito nos clubes e não nas áreas comuns.
Diretor de Incorporação da EBM, Marco Túlio Campos explica que a compra tem sido feita por famílias que já têm relação com o Centro. “O perfil de comprador é de primeira moradia – solteiros, recém-casados, casais com um filho ou desejando o primeiro filho; uma média de idade entre 33 e 35 anos. Ou seja, é um público jovem que acredita em um centro mais vivo, em que pode se estar próximo ao trabalho, comércios, opções de lazer e diversas outras facilidades que implicam em maior qualidade de vida. Temos feedback de pessoas que já moram na região de aluguel, ou em um imóvel mais velho sem opções de lazer (e sem muita infraestrutura), ou ainda que moraram com os pais durante a infância no Centro e depois saíram por falta de opções para investir… todos esses perfis estavam buscando uma opção de imóvel com bom custo-benefício no próprio setor para investir/morar.”
O assessor parlamentar Vitor Cadillac se mudou para o Centro em setembro do ano passado, mas sua relação com o bairro é antiga. O perfil é bem parecido com o descrito pela EBM. “Morei aqui na infância, entre 1991 e 1999, na Rua 70. Minha bisavó também vivia no Centro e, quando eu era criança, passava muito tempo na casa dela. Morar aqui carrega um valor afetivo: é parte da minha história e da memória dos meus antepassados”, conta.
Vitor destaca que escolheu voltar ao Centro não só por esse vínculo familiar, mas também pelo que o bairro representa em termos de cultura, diversidade e convivência. “Aqui encontramos de tudo. Há o Mercado Municipal com sua enorme variedade de produtos, uma cena gastronômica diversa, centros culturais e museus com programações de qualidade, dois cinemas, além de bares, igrejas e barbeiros tradicionais que atravessam gerações. Sempre tive vontade de voltar, justamente pela riqueza cultural que o diferencia dos demais bairros. O Centro talvez seja o bairro mais completo da cidade quando pensamos em diversidade e vida cultural.”
Ele mora nas proximidades da Rua do Lazer e da Rua 8 e observa de perto as mudanças recentes. “Desde que a Rua 8 foi fechada, a sensação de segurança aumentou. Antes, a Rua do Lazer estava perigosa; agora, com a reocupação, a dinâmica mudou.” Para ele, o papel da cultura nesse processo é fundamental: “A programação cultural ser o carro-chefe da reocupação dos espaços públicos é essencial. Ela democratiza o acesso, garante o direito ao lazer e, sobretudo, enriquece a comunidade com diversidade, convivência e encontros.”
Como nasceu o Centro?
Planejado para ser o símbolo da modernidade nos anos 1930, o Centro carrega até hoje a memória viva da fundação da cidade. Muito antes de Goiânia se tornar a metrópole que é hoje, com mais de 1,5 milhão de habitantes, foi no seu Centro que tudo começou. Criada para ser a nova capital do estado de Goiás, a cidade nasceu de um projeto urbanístico ousado: construir, no coração do Brasil, uma cidade moderna, planejada, com infraestrutura e arquitetura alinhadas às tendências mundiais do século XX. E o ponto de partida dessa visão foi o Centro.
Idealizado por Atílio Corrêa Lima, um dos primeiros urbanistas brasileiros formados, o plano diretor de Goiânia foi inspirado no modelo das cidades-jardins europeias. Ruas amplas, avenidas bem traçadas, praças arborizadas e edifícios públicos grandiosos deram forma à nova capital. O epicentro dessa urbanização foi a Praça Cívica, cercada por prédios governamentais, culturais e administrativos, muitos deles em estilo art déco, um dos maiores legados arquitetônicos da cidade. Durante décadas, o Centro foi o principal polo econômico, social e político da cidade. Foi ali que surgiram os primeiros comércios, hotéis, cafés, cinemas, sedes de jornais e repartições públicas. A região era o ponto de encontro da elite política, empresarial e cultural goiana.