Autoridade monetária do Brasil, o Banco Central (BC) é fundamental para a estabilidade econômica e financeira do país. A instituição trouxe a evolução econômica do país em tempos de hiperinflação com reformas e inovações.

O Banco Central foi criado em 31 de dezembro de 1964 no governo Castello Branco, primeiro ano da ditadura militar. Antes da criação do BC, a política monetária e econômica ficava a cargo do Banco do Brasil através da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc). O BC foi criado por conta da necessidade de modernização e centralização da política monetária do Brasil, se adequando às práticas internacionais.

A década de 60, marcada pelo início da ditadura militar, foi um período de instabilidade no Brasil. A ditadura buscava promover o crescimento econômico e a estabilidade financeira. Por conta disso, o BC tinha como responsabilidade controlar a inflação, regular o sistema financeiro e promover a estabilidade da moeda.

Com o início da década de 70, a crise econômica do país piorou com a crise do petróleo que causou, também, a alta inflação global, que teve consequência no país. O Banco Central, na ocasião, teve que lidar com o aumento da inflação e da dívida externa.

Os anos 80 não trouxeram melhora. A estagnação econômica, somada a hiperinflação e crises fiscais colocaram ainda mais pressão na instituição que foi obrigada a implementar diversas medidas para tentar controlar o caos econômico do país.

Porém, apenas na década de 1990 a instituição conseguiu trazer benefícios reais para a vida da população com a criação do Plano Real, que tinha como objetivo estabilizar a economia e controlar a inflação. O Plano Real, que completou 30 anos em 2024, introduziu o real e uma série de reformas fiscais e monetárias.

Na ocasião, o BC foi crucial para a implementação do Plano Real e passou a adotar uma política monetária mais rigorosa, o que promoveu a estabilização da inflação. Com isso, a instituição focou as metas de inflação, taxa de juros e o controle da economia, consolidando a imagem do Banco Central como mais técnica.

Lei de Responsabilidade Fiscal

Em 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) foi aprovada e sancionada, estabelecendo diretrizes para a gestão fiscal dos governos federal, estadual e municipal. A LRF promoveu transparência e responsabilidade na administração pública.

Já em 2021, com a autonomia técnica do Banco Central, houve a independência técnica da instituição. Por conta disso, a política monetária passou a ser gerida com base em critérios técnicos e objetivos, sem interferência políticas.

De acordo com a economista Christiane Schmidt, essa autonomia faz com que o Banco Central possa ter mais foco nos objetivos. “Quando você tem um Banco Central autônomo, ele tem completa autonomia ou independência do Executivo, do Legislativo e do Judiciário para implementar a política monetária que ele acha mais pertinente para seguir aquele objetivo. O objetivo principal é controlar a inflação para que ela chegue a meta determinada”.

‘o BC também é uma agência reguladora do sistema financeiro nacional’, diz Christiane Schmidt | Foto: Fábio Costa/Jornal Opção

“Essa autonomia é para que não tem nenhuma interferência de nenhum poder. Isso serve para que você leve de fato a inflação a ter o patamar previamente fixado. Então, você vai aumentar a taxa de juros quando você acha que a inflação está subindo e você vai diminuir a taxa de juros quando você quer expandir a base monetária e, portanto, sua inflação está abaixo daquela meta. Então, você tem que ter essa autonomia para poder fazer essas movimentações”, continua.

“Os bancos centrais no mundo, e o Brasil não é um caso à parte, são extremamente técnicos, eles têm na sua equipe técnicos muito competentes, muito capacitados, muito comprometidos com o objetivo do Banco Central. Banco Central, no Brasil em particular, tem uma função e é uma instituição de muito prestígio. Além de ser a autoridade monetária, o BC também é uma agência reguladora do sistema financeiro nacional”.

Inovação

Nos últimos anos, o Banco Central do Brasil se destacou no mundo todo por sua capacidade de inovação. A iniciativa mais significativa foi o lançamento do PIC, sistema de pagamentos instantâneos que revolucionou as transações financeiras no país. O PIX, hoje, é adotado por grande parte da população.

Christiane Schmidt avalia que muitas dessas inovações ainda não foram implementadas por falta de autonomia do Banco Central. “A introdução do PIX foi um evento fantástico para a sociedade. Além disso, novas inovações estão por vir: o Open Finance e o DREX, nossa moeda digital que vai estar para ser lançada no ano que vem. O cronograma de implementação do DREX já foi atrasado duas vezes por falta do corpo técnico. O Banco Central é uma instituição positiva para a economia, mas precisa de mais autonomia”, explica.

O Open Finance promove integração e compartilhamento de dados entre instituições financeiras e o DREX é uma moeda digital que ainda está em fase de desenvolvimento. As medidas são modernizações feitas para a promoção da inclusão financeira.

PEC

Tramita no Senado Federal a PEC 65/2023, que concede autonomia orçamentária e financeira ao Banco Central. A PEC está em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Na sessão da última quarta-feira, 17, os senadores da comissão anunciaram um acordo para adiar a votação.

A proposta do senador goiano Vanderlan Cardoso (PSD), na visão de Christiane Schmidt, é positiva para a economia brasileira. “Pense em todos os países desenvolvidos. Pense no Bank of England, que é um dos mais antigos, o Banco do Japão, o Banco da França, o Banco da Austrália, o Banco Europeu, o Banco dos Estados Unidos. Então, todos esses países desenvolvidos, inúmeros países desenvolvidos, têm essas autonomias. Cada um tem uma legislação um pouco diferente, mas todos eles preservando a questão dos mandatos, não coincidentes com o do presidente da República, e a questão orçamentária alguns têm, outros não têm. Acho importante o Brasil, em particular, ter, porque é somente no Brasil que a gente tem uma rigidez orçamentária do orçamento público da forma com que temos”, explica.

Ao Jornal Opção, o senador Vanderlan Cardoso afirmou acreditar que a proposta permite melhor funcionamento da instituição. “O modelo é adotado com sucesso em diversos países. A PEC permite que o Banco Central volte a funcionar normalmente sem as grandes restrições orçamentárias e financeiras de hoje, que atrapalham todo trabalho de pesquisa, estudo, operações, projetos, TI, etc. Todos os trabalhos relevantes do Banco, que resultam em melhores subsídios para o exercício de todas atribuições, incluindo política monetária, cambial, supervisão e regulação do sistema financeiro e de pagamentos, entre outros, terão garantias de funcionamento, sem restrições orçamentárias, financeiras e administrativas”, disse.

Vanderlan Cardoso: “O modelo é adotado com sucesso em diversos países” | Foto: Leoiran/Jornal Opção

O texto, no entanto, só deve ser votado na CCJ após o recesso parlamentar. O adiamento ocorreu por conta da construção de entendimentos em torno da matéria. “O Senado Federal é reconhecido por ser a casa do diálogo. A grande maioria dos projetos que passam por ali são aprovados de forma consensual. Então, o adiamento da votação da PEC do Banco Central tem como objetivo construir um texto de consenso entre todos. O projeto é importante para o País, tenho defendido isso sempre. Mas sei que é melhor debatermos e chegarmos a um consenso do que termos uma votação dividida”, afirma Vanderlan.

A proposta, que tramita na Casa há cerca de seis meses, recebeu voto favorável do relator, senador Plínio Valério, na forma de um texto alternativo. Depois da CCJ, a matéria seguirá para dois turnos de votação no Plenário do Senado, onde precisará de 49 votos favoráveis em cada um deles para ser aprovada.

A PEC insere na Constituição a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira do Banco Central, já estabelecida pela Lei Complementar 179, de 2021, e acrescenta a autonomia orçamentária. Além disso, a PEC transforma o BC (hoje autarquia de natureza especial sem vinculação com nenhum ministério nem subordinação hierárquica) em instituição de natureza especial organizada como empresa pública fiscalizada pelo Congresso Nacional com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU).

Na sessão da última quarta-feira, 17, grande parte dos senadores presentes declararam apoio à PEC, mas reconheceram a importância do diálogo para que se chegue a um consenso.

Outros parlamentares, no entanto, anteciparam voto contrário à matéria. Um deles foi o senador Jorge Kajuru que disse, ao Jornal Opção, que se a PEC for aprovada durante a gestão do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, atrapalhará o desenvolvimento.

“Eu acho um absurdo, eu acho que o senador que votar a favor disso é porque não gosta do Brasil igual ao Roberto Campos Neto. Isso não tem cabimento, não tem cabimento que você dá autonomia para um cara que é anti-Brasil, que é anti-Lula”, disse. Para Kajuru, Campos Neto atrapalha o desenvolvimento do país com os juros altos. “Ele quer acabar com o pais com os juros mais altos da história. O juro dele é um juro criminoso porque ele é anti-Lula. Eu tenho nojo dele”, afirmou.

Kajuru havia falado ao jornal Folha de S.Paulo que Campos Neto age politicamente. “Uma coisa é você oferecer autonomia a um Banco Central que tenha um presidente que não age politicamente, não trabalhe contra o Brasil por odiar o presidente Lula, essa é a verdade. Algo pessoal, desprezível é, na minha opinião, Roberto Campos Neto”, disse.

Em resposta à Kajuru, Vanderlan afirmou que o projeto se trata de uma pauta de Estado, independente de quem presidir o Banco Central. “Primeiro é preciso esclarecer que esta é uma pauta de Estado e independe de quem é o presidente do Banco Central. Mesmo que a PEC seja aprovada e promulgada até o final do ano, só tem validade efetiva após a edição da lei complementar que vai regulamentar a PEC. Então, só o próximo presidente do BC irá usufruir da autonomia orçamentária e financeira do Banco Central. Isso já estava claro desde o princípio”, disse.