Dados oficiais da Comissão Mista de Orçamento, atualizados até 12 de julho, mostram que apenas R$ 53,7 milhões dos R$ 596 milhões indicados pelos deputados federais foram efetivamente pagos, o equivalente a apenas 9% do total autorizado. No relatório da Comissão de Mista de Orçamento da Câmara não constam os dados de emendas do deputado Gustavo Gayer (PL).

A maior parte das emendas permanece empenhada ou em fase preliminar de análise técnica nos ministérios. A situação se repete ano após ano, mas neste ciclo orçamentário de 2025 tem se agravado diante do contingenciamento adotado pelo governo federal. O motivo, segundo apuração do Jornal Opção, é a expectativa do Palácio do Planalto por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que deve redefinir o alcance das emendas de comissão e de bancada — o que tem atrasado a liberação geral dos recursos.

As emendas individuais, por sua vez, são protegidas pela Emenda Constitucional nº 100/2019, que garantiu sua execução obrigatória. Ainda assim, mesmo aquelas previstas como “impositivas” seguem enfrentando entraves. Isso tem ampliado o desgaste entre o Legislativo e o Executivo e provocado críticas de parlamentares de diversos partidos.

A deputada Adriana Accorsi (PT) afirmou, ao Jornal Opção, que as emendas de seu mandato são definidas com base em critérios técnicos, sociais e econômicos, sempre com foco nas áreas mais sensíveis da administração pública. “Nosso objetivo é fortalecer as políticas públicas e cuidar da população em todo o estado, especialmente nas áreas de saúde, educação, agricultura familiar, segurança pública e cultura. Cada centavo destinado é pensado com responsabilidade, ouvindo as demandas da população e buscando soluções concretas para melhorar a vida das pessoas”, afirmou.

José Nelto (União Brasil) explica que adota como critério principal o tamanho da população dos municípios goianos. “Se uma cidade tem 5 mil habitantes, eu coloco no máximo R$ 500 mil. Catalão, por exemplo, pode receber até R$ 10 milhões. Um deputado que coloca R$ 10 milhões numa cidade pequena quer fazer rachadinha. Eu não aceito isso”, declarou. Ele também reforçou o cuidado com a transparência: “Todos os meus repasses são enviados ao TCU, AGU, Ministério Público, Câmara de Vereadores e até para a delegacia de polícia. Transparência total”.

A deputada Silvye Alves (União Brasil), por sua vez, afirma que segue as demandas encaminhadas diretamente pelas prefeituras e organizações sociais. “Não é um critério de seleção. Foram atendidas demandas dos próprios municípios, principalmente causas sociais e saúde, que sempre defendi”, pontuou. Ela destaca que os repasses podem ser acompanhados publicamente por meio do Portal da Transparência.

Já o deputado Célio Silveira (MDB), destacou o papel dos parlamentares na articulação dos recursos, mas responsabilizou os ministérios e as gestões municipais pela execução. “Os municípios estão com uma grande dificuldade. A maioria deles se socorre, leva saúde para a comunidade, leva infraestrutura por meio das emendas. As emendas são a forma mais rápida do dinheiro chegar aos municípios. Um convênio com ministério demora demais e os prefeitos sofrem”, afirmou.

Ele explicou ainda que suas indicações seguem os pedidos feitos diretamente pelos prefeitos. “Depois que a gente destina, fica totalmente de responsabilidade do Executivo municipal. O deputado não entra nisso.”

A demora também afeta as emendas da bancada goiana na Câmara, que somam R$ 528,8 milhões e estão completamente travadas. Nenhum centavo foi pago até o momento. Os projetos contemplados nessas emendas envolvem obras de infraestrutura urbana, aquisição de ônibus escolares, recuperação de drenagem. Embora os valores tenham sido autorizados na LOA, todos seguem em estágio inicial e sem movimentação orçamentária.

Disputa institucional

O cientista político Guilherme Carvalho avalia que o cenário atual reflete uma disputa institucional mais ampla, intensificada pelo esvaziamento das ferramentas clássicas de governabilidade. Segundo ele, desde que as emendas se tornaram impositivas, o Executivo perdeu a capacidade de usar a liberação de verbas como instrumento de negociação com o Congresso. “A não execução das emendas pode ser entendida como violação da Lei de Responsabilidade Fiscal. O governo está segurando os pagamentos, contando com uma decisão futura do STF. Isso tem gerado um estresse enorme na base”, explica.

Para Carvalho, a independência crescente do Legislativo transformou o papel dos deputados e enfraqueceu o poder do presidente. “Antes, o Executivo usava cargos em ministérios e a liberação de emendas para construir sua base. Hoje, o deputado não precisa mais disso. A emenda virou direito. Isso tirou poder do Planalto e gerou um novo tipo de tensão institucional”, analisa.

Ele também explica que o modelo atual compromete a lógica do presidencialismo. “O presidente não controla dois quartos do orçamento. Isso não é um sistema presidencialista. A gente vive um regime híbrido, com traços parlamentares, mas sem assumir o parlamentarismo. O sistema está travado, e a única saída é uma repactuação institucional. Precisamos decidir se somos presidencialistas, parlamentaristas ou semipresidencialistas. Porque hoje, não somos nada.”

A expectativa é que a liberação de emendas comece a se intensificar no segundo semestre, sobretudo entre agosto e dezembro. Ainda assim, o ambiente de incerteza jurídica provocado pelo impasse no STF pode adiar essa expectativa. A pressão dos prefeitos sobre os parlamentares aumenta, enquanto os deputados buscam alternativas para destravar os recursos.

Flávia Morais (PDT), Glaustin da Fokus (Podemos), Jeferson Rodrigues (Republicanos) e Professor Alcides (PL) conseguiram alguma liberação parcial, mas ainda longe do valor total autorizado. Outros, como Adriana Accorsi (PT), Dr. Ismael Alexandrino (PSD) e Lêda Borges (PSDB), tiveram baixa execução registrada.

A maior parte das emendas apresentadas pelos deputados goianos foram direcionadas à saúde, principalmente para o custeio da atenção primária e para a estruturação da rede hospitalar. Educação, agricultura familiar, infraestrutura urbana e assistência social também aparecem nas planilhas de execução, mas com valores muito inferiores.

Enquanto os recursos seguem parados, os prefeitos aguardam respostas e os parlamentares enfrentam o desgaste político de prometer obras e serviços que, até o momento, não saíram do papel. Agora, o Governo Federal deverá, no segundo semestre, executar R$ 670 milhões destinados por Goiás ao Orçamento de 2025.

DeputadoPartidoTotal aprovadoTotal pago
Adriano Do BaldyPPR$ 37.275.985,00R$ 3.600.000
Célio SilveiraMDBR$ 37.275.985,00R$ 4.000.000
Daniel AgrobomPLR$ 37.275.985,00R$ 1,900,000
Delegada Adriana AccorsiPTR$ 37.275.985,00R$ 700.000
Dr. Ismael AlexandrinoPSDR$ 37.275.985,00R$ 300.000
Dr. Zacharias CalilUNIÃOR$ 37.275.985,00R$ 799.893
Flávia MoraisPDTR$ 37.275.985,00R$ 4.559.493
Glaustin Da FokusPODER$ 37.275.985,00R$ 5.305.000
José NeltoUNIÃOR$ 37.275.985,00R$ 6.500.000
Lêda BorgesPSDBR$ 37.275.985,00R$ 1.637.993
Magda MofattoPRDR$ 37.275.985,00R$ 6.535.209
Jeferson RodriguesREPUBLICANOSR$ 37.275.985,00R$ 6.300.000
Marussa BoldrinMDBR$ 37.275.985,00R$ 1.967.993
Rubens OtoniPTR$ 37.275.985,00R$ 3.350.000
Silvye AlvesUNIÃOR$ 37.275.985,00R$ 2.339.000
Professor Alcides PLR$ 37.275.985,00R$ 3.984.921
TOTAL DE EMENDASR$ 596.415.760,00TOTAL PAGO:R$ 53.779.502

As informações de emendas impositivas do deputado federal Gustavo Gayer (PL) não constam no relatório disponibilizado pela Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados.

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