Agentes de desenvolvimento: auxílio à regularização de trabalhadores informais

16 abril 2014 às 17h45

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Função é proposta em legislação complementar à Lei Geral que trata dos pequenos empreendedores

Yago Rodrigues Alvim
A menos de 25 quilômetros da capital goiana, habita Valéria de Freitas Faria Rodrigues a pequena Nerópolis. Em maio, Valéria completa oito anos de um cotidiano profissional na prefeitura. Há pouco tempo, menos de oito meses, foi nomeada agente de desenvolvimento. Hoje, ela ajuda os neropolinos em suas vidas econômicas, sociais, pessoal. Vida de cada um. Sonho de cada um.
O agente de desenvolvimento é uma figura cujas funções estão determinadas na Lei Complementar número 128, de 2008. O objetivo é o auxílio na implementação e continuidade do que propõe a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. A lei, no artigo 85-A, descreve a função que se caracteriza pelo “exercício de articulação das ações públicas para a promoção do desenvolvimento local e territorial, mediante ações locais ou comunitárias, individuais ou coletivas”.
Um dos maiores agentes de desenvolvimento é o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). A entidade, privada e sem fins lucrativos, capacita e promove o desenvolvimento, apoiando pequenos empresários, empreendedores de todo o país. É esse agente que auxilia na capacitação de pessoas como Valéria, em diversos municípios. Os benefícios continuam daí.
Uma das 27 unidades da Federação está em Goiânia e é lá que o assessor de Relações Institucionais e Políticas Públicas do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-GO), Ieso Gomes Pereira da Silva, trabalha. Ele explica o surgimento do cargo. “Foi com um capítulo específico. O agente de desenvolvimento local, como denominado, é uma figura prevista na Lei Geral e é de tamanha importância. Faz parte de quatro eixos principais: o de compras governamentais, desburocratização e desoneração, empreendedor individual e o agente de desenvolvimento”, explica.
A especificação da lei se encontra com a explicação de Ieso: I) a pessoa, a ocupar a função, deve residir na área da comunidade em que atuar; II) ter concluído, com aproveitamento, curso de qualificação básica para a formação de Agente de Desenvolvimento; e, por fim, III) ter concluído também o ensino fundamental. “É uma pessoa nomeada no município, pela prefeitura, por determinadas características de empreendedorismo, articulação, desenvoltura, certo nível de conhecimento para atuar no município como um animador do processo, junto à sociedade e ao gestor público, sobre os benefícios da Lei Geral e para seu cumprimento, facilitando a vida dos pequenos negócios nos municípios”, acrescenta.
Assim começou um diferente cotidiano na vida de Valéria. Por mais de sete anos, Valéria realizava outra atividade na prefeitura de Nerópolis. Em 15 de outubro de 2009, foi implementada a Lei Geral no município. Simplificada pela sigla LG, a Lei Geral propõe o tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte. O objetivo é contribuir com o desenvolvimento das micro e pequenas empresas (MPE), facilitando o acesso ao mercado, ao crédito e à Justiça, o estímulo à inovação e à exportação. Consequentemente, criam-se mais oportunidades de emprego, distribui renda e inclui, socialmente, os cidadãos do país.
Em agosto de 2013, Valéria fez um curso de capacitação pelo Sebrae, em Goiânia. Anteriormente, havia um colega de trabalho que executava a função que, por problemas particulares, se afastou do cargo. Com isso, ela conheceu a área de atuação do agente de desenvolvimento. Depois, por convite do atual prefeito de Nerópolis, Fabiano Luiz da Silva, o Fabiano da Saneago — ela trabalhava como braçal na companhia de saneamento do governo de Goiás —, Valéria foi nomeada agente de desenvolvimento.
A agente diz que o trabalho é individual e coletivo, pois se relaciona com os trabalhadores não formalizados no município e se dialoga com diversos outros cargos. A prefeitura é um exemplo. Na verdade, exemplo de grande importância. O prefeito Fabiano da Saneago é empreendedor. Valéria conta a trajetória de crescimento do gestor público e diz que “ele tem vontade de ajudar as pessoas a crescerem dentro do município”, talvez por memória e reconhecimento de sonhos próximos: uma vida melhor. Afinal, explica, “se o gestor não tem muito conhecimento, o trabalho [dos agentes de desenvolvimento] fica a desejar, pois há embate. Todos os envolvidos tem que saber os principais aspectos e pontos da lei”.
Ieso comenta a nomeação. “É um cargo público municipal. É um funcionário da prefeitura, pode ser comissionado ou efetivo”, diz. O assessor faz uma importante ressalva: a escolha do agente deve ser feita com profissionalismo. Além das características e qualificações da pessoa, a escolha tem de ser percebida além de um “benefício” ou “apadrinhamento”, dado a alguém. Ainda afirma que, às vezes, o agente faz um bom trabalho, mas, por algum desentendimento pessoal, a pessoa é afastada da função, o que não é correto.
Mais agentes

Mais distante, a 288 quilômetros de Goiânia, está o município de Cristalina. É lá onde vive Sandreanne Mohn de Castro ou, como é conhecida por familiares, amigos e colegas de trabalho, Anne Mohn. Ela também é agente de desenvolvimento. Cuidava de processos na área administrativa, em 2010, quando foi convidada para a função. Participou dos cursos de capacitação. Da Lei Geral ao contato com os cidadãos, Anne sublinha: “Para ser agente de desenvolvimento tem de ter paixão, pois você lida com pessoas humildes, que estão começando e têm medo”.
Ieso explica a importância dos agentes. “O Sebrae não tem condições físicas para estar em todos os municípios. Temos escritórios em onze regiões. Temos agências Sebrae em parceria com as prefeituras, em que algum colaborador da agência também é um agente de desenvolvimento. Na ponta, onde o Sebrae não tem presença física, o agente é muito útil, pois o Sebrae o capacita, em várias frentes, para entender o que o Sebrae tem a oferecer”, diz.
Há uma sala onde o trabalho de Valéria e de Anne é realizado. A sala do empreendedor não é, exatamente, exclusiva para isso. Afinal, alguns municípios não têm condições para tanto. “Até a função não é de dedicação exclusiva. Não é exigência nossa ou da lei; pode ser uma pessoa que execute algum trabalho no município, algum secretário de desenvolvimento, por exemplo, ou outro profissional que esteja na secretaria”, explica Ieso, concluindo que “nós consideramos onde o agente atende como a sala do empreendedor. Onde atende dando informações de como proceder, como registrar uma empresa, como fazer declaração de imposto de renda, ou seja, no auxílio aos empreendedores do município”.
Ieso reforça que, atualmente, é necessário, além da adequação em cada município (pois os municípios têm, cada um, suas peculiaridades) “tirar do papel e pôr em prática”. Ele comenta que o objetivo, do Sebrae, é que tenha agentes em todos os municípios. Para isso, é preciso implementar, primeiramente, a LG. Dos 246 municípios, apenas 189 a implantaram. O conhecimento, a introdução da lei –– implantação –– é mais ampla, 189 municípios, porém sua execução e realidade –– implementação –– só é presente em 79 municípios. O trabalho dos agentes de desenvolvimento é fundamental para que vire realidade, para que a lei seja praticada, de fato.
Anne realizava seu trabalho, primeiramente, na sala do empreendedor. Hoje, vai a campo. Nos três anos como agente, “nunca foi mal atendida”. Na verdade, brincando, Anne conta que muitos viram amigos: “se vendem pão, eles trazem”. Os benefícios da formalização são as informações que fomentam os diálogos da agente. Segundo ela, “a chave mestra é o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)”, o caixa da Previdência Social que permite a aposentadoria. “A partir do momento que se diz a uma pessoa, que nunca contribuiu, que ela pode aposentar com 15 anos de contribuição mais idade, ela tem a sensação de cuidar de si mesma”, diz.
A legalidade é um atrativo. A liberdade em entrar e sair de qualquer lugar, com suas mercadorias, é ressaltada pela agente. A salinha, agora, onde realiza as formalizações, dá diversos apoios ao cidadão que procura o serviço. Anne dá como exemplo, o acesso ao auxílio de contadores. “Formaliza diretamente no Portal do Empreendedor. Com dez minutos a pessoa está com o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) na mão, alvará provisório de 180 dias e deixa a sala com seu trabalho formalizado”, afirma.
Sobre a formalização, Ieso exemplifica: “Às vezes, quando se formaliza como empreendedor individual, que era um camelô, era uma pessoa física e não existia empresarialmente, mas vendia sua pipoca, seu picolé ou algum outro serviço, a prefeitura cobrava o alvará anual dele. A partir do momento em que vira empreendedor individual, que se registra, formaliza o CNPJ, que a sua categoria pode ter nota fiscal, a prefeitura não pode cobrar o alvará.” A problemática levantada por Ieso é que, às vezes, os prefeitos ou secretários de finanças entendem como uma abdicação de receita, o que não é verdade. A partir do momento que o cidadão se registra, se formaliza, ele contribui com o município de outra forma.
Os agentes precisam informar e trabalhar este dado, de benefício também para o município, pois, além da contribuição com o INSS, o trabalhador formalizado gera emprego e movimenta o capital no próprio município, o que é positivo. Ieso conclui a importante função de informar que os agentes têm. Informar em todas as pontas. Anne irá neste abril para a zona rural espalhar informações: “Ajudar a formalizar, explicar as vantagens, organizar o local.”

Em parcerias
O diretor técnico do Sebrae-GO, Wanderson Portugal Lemos, comenta a atuação do Sebrae junto ao empreendedores e empresário goianos. “Hoje, constatamos que todos os municípios de Goiás receberam de forma direta ou indireta ações e serviços do Sebrae. Seja por meio de semanas de capacitação empresarial, seja por meio de eventos empresariais, como feiras, missões técnicas, festivais gastronômicos, atendimentos em praças públicas, palestras, seminários, cursos ou encontros empresariais”, afirma o diretor.
De acordo com Portugal, a parceira se amplia com as Prefeituras Municipais através da figura do agente de desenvolvimento empresarial. Ele destaca a atuação dos agentes no levantamento das demandas que as microempresas e empresas de pequeno porte tanto necessitam. “A proposta maior do Sebrae, por meio dos agentes de desenvolvimento, é ampliar o atendimento aos empreendedores, de forma que eles possam se capacitar e aplicar uma gestão cada vez mais profissional dentro de seus negócios”, diz Portugal, e conclui: “Fortalecer a micro e a pequena empresa é fortalecer o município, e os prefeitos que já indicaram o Agente de Desenvolvimento vão conquistar resultados muito positivos e proporcionar um desenvolvimento continuado e sustentável aos pequenos negócios instalados em suas cidades.”
É por esse caminho que trilha Edson André Teixeira. A 480 quilômetros de distância da capital, o agente narra a parceria entre o Sebrae e o município de Chapadão do Céu, que começou no ano passado. Lá, foram realizadas oficinas e, aos poucos, foi se adequando e se regularizando com a Lei Geral. “Todo um processo”, diz. O trabalho de agente teve início já no meio de 2013. Sobre a capacitação, as palavras foram positivas.
Para ele, os cursos proporcionam um maior conhecimento das ações do Sebrae e a consciência que se adquire permite que as informações se espalhem e se concretizem. “Abriu bem a mente”, afirma André. No caminho, os passos de formiga vão ao encontro com o que diz Ieso, Valéria e Anne. São ações simples, vagarosas. A informação auxilia. Abrir cadastro, anotar e-mail, nome e telefone são exemplos de passos que, aos poucos, se materializam em diversos trabalhadores regularizados. Assim, André alça também uma vontade: a de o município ser uma referência, não só estadual, mas também nacional.
Do informal para o informal, foram mais de 60 formalizações no município. “Loja de roupas, acessórios, pessoas autônomas, cabelereiros, pedreiros, pintores, pessoas que vendiam quitandas, agora, estão formalizadas”, exemplifica. Os benefícios, como linha de crédito, movimentação facilitada de conta por ser pessoa jurídica, são explicados às pessoas que trabalham informalmente.
Junto ao Sebrae, Edson comenta que mais cursos serão oferecidos no município. O exemplo é o “Banho de Loja”, com pessoas já confirmadas para participarem. A agenda, em Chapada do Céu, está cheia praticamente todo o ano. A expectativa é que mais uma pessoa seja capacitada para atuar ao lado de Edson como agente de desenvolvimento. Já em Nerópolis, Valéria faz a “falta de motivação” ser passado. Como diz Ieso, os agentes são animadores do processo. Cerca de 45 a 50 vagas agitam as terças-feiras com as oficinas SEI (Controlar Meu Dinheiro, Comprar, Vender, Empreender, por exemplo).

O “saber” resultou no último relatório 500 microempreendedores cadastrados; “um número elevado para Nerópolis”, diz Valéria. De setembro até meados de março, foram mais de cem formalizações. A agente explica a existência de um Comitê Gestor Municipal da Micro e Pequena Empresa. As reuniões designam planos de execução ao longo do ano. Para 2014, ainda não foi realizada tal encontro.
Além disso, há uma rede de agente, através do Portal do Desenvolvimento, em que a troca de informações é possível entre os agentes de diferentes Estados. Além disso, são realizados encontros, onde se conhecem. Nos dias 14 a 16 de abril, será realizado em Campo Grande (MS), o Encontro Centro-Oeste e Sudoeste dos Encontros Regionais de Agentes de Desenvolvimento.
Anne já está com as malas prontas. Edson expecta mais conhecimento, experiências para um resultado positivo em seu município. Também é o que diz Valéria: recebeu o convite e espera que a troca de vivências propicie ações novas, simples para aplicar também onde atua e comenta ter sido assim, anteriormente, com outros encontros que participou. Afinal, como explica Ieso, há diferenças regionais na ação dos agentes, pois, cada local, região, tem sua especificidade.
Passos
“O desenvolvimento não apenas em âmbito econômico, e sim no âmbito pessoal e social. Pois, cada pessoa tem uma história, tem um propósito, um sonho, um objetivo específico”, diz Valéria sobre a importância de se ampliar a perspectiva. O diretor Wanderson diz que “o passo seguinte é o agente buscar pelas soluções do Sebrae e demais parceiros que possam corresponder com os anseios do segmento”, afinal, o Sebrae tem encontrado um campo fértil e amplo para este trabalho em conjunto com os Executivos municipais, que têm apoiado de forma ímpar o nascimento e o desenvolvimento das microempresas em suas cidades”.
O diretor explica a realidade no Estado de Goiás em que as microempresas e empresas de pequeno porte já ultrapassam os 200 mil negócios formalizados, além dos 150 mil empreendedores individuais que já registraram suas atividades profissionais e, atualmente, atuam na formalidade, com deveres e direitos garantidos. Essa realidade seria diferente sem o trabalho do agente de desenvolvimento.
Para Anne, o amor e dedicação são necessários para o trabalho, pois, “se não se dedicar ao seu serviço, só passará por ele”, sem deixar marcos. Por isso, ela vai à casa das pessoas, conversa, se dedica. São os passos de Anne ou de Edson, de diversos agentes que contribuem para a concretização de vontades, de um futuro, como acredita Valéria, pois, em relação à economia municipal, o amanhã está no microempreendedorismo.