Criador da Lei da Ficha Limpa, o jurista Marlon Reis fez duras críticas à chamada PEC da Blindagem, durante entrevista exclusiva ao Jornal Opção. Para ele, a proposta representa um ataque direto à moralidade pública e à própria aplicabilidade da lei que ajudou a criar.

“Os parlamentares já têm uma série de prerrogativas. Eles não são pessoas, entre aspas, normais. Estão acobertados por uma série de privilégios, como a imunidade parlamentar e o foro por prerrogativa de função. O que se busca agora é inviabilizar o questionamento dos seus gestos, mesmo que estejam em conflito com a lei”, afirmou.

Reis lembra que, no passado, existia a necessidade de autorização parlamentar para abertura de processos contra deputados e senadores, além do voto secreto para julgamentos. “Tudo isso já existiu e nós superamos. Então, só isso já deixa claro tratar-se de um gigantesco retrocesso”, disse. Segundo o jurista, a PEC ameaça diretamente a Lei da Ficha Limpa, sancionada em 2010.

“Para a pessoa ficar inelegível, ela precisa ser condenada. Mas não tem como ser condenada se não for nem permitida a abertura do processo. Se a maioria do Congresso não quiser, o parlamentar não responde. Então não tem como aplicar a Lei da Ficha Limpa. Eles estão atacando a lei por diversos ângulos, direta e indiretamente, como nesse caso.”

Além da PEC, Marlon Reis citou outro movimento legislativo que fragiliza a legislação eleitoral: o Projeto de Lei 192/2023, relatado pelo senador Weverton Rocha (PDT-MA) e aprovado no Senado.

“Esse projeto diminuiu bastante os prazos de inelegibilidade, mudando a forma como ela é contada. Nós identificamos pontos gravemente inconstitucionais e iremos ao Supremo. A Rede Sustentabilidade já se dispôs a assumir a demanda e levar o caso ao STF”, declarou.

Mobilização contra a proposta

O jurista afirmou que o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral já publicou nota contrária à PEC da Blindagem e tem atuado em diálogo direto com os senadores. “Esperamos que o Senado detenha essa excrescência. Mas compete a toda a sociedade brasileira exercer pressão. Estamos às vésperas de um novo processo eleitoral, em que dois terços dos vereadores serão candidatos. Eles precisam sentir o risco da não reeleição se atrelarem seus nomes a esse absurdo.”

Reis também destacou que a resistência à Lei da Ficha Limpa é suprapartidária. “Existem pessoas com problemas judiciais graves em todas as alas. A questão não é ideológica, é de integridade. Não existe nenhuma ala que possa chamar para si o monopólio da moralidade. O que precisamos é de uma política em que, independentemente das matrizes ideológicas, haja pelo menos um ponto comum: a impossibilidade de tocar a mão no dinheiro público.”

Para ele, os ataques recentes à legislação são motivados pelo temor de parte dos parlamentares. “Vários deles estão sob investigação. Eles precisam mesmo temer a Lei da Ficha Limpa, porque se não conseguirem aprovar essas mudanças, serão agarrados mais cedo ou mais tarde e ficarão fora dos mandatos”, concluiu.

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