Nova lei de imigração em Portugal pode separar famílias e discriminar brasileiros, alerta especialista

02 outubro 2025 às 19h27

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A nova Lei dos Estrangeiros aprovada pelo Parlamento português no dia 30 do mês passado ainda não está em vigor. O texto aguarda sanção do presidente Marcelo Rebelo de Sousa, do Partido Social Democrata (PSD), que tem até oito dias para decidir se promulga, veta ou encaminha novamente ao Tribunal Constitucional. Enquanto isso, a legislação anterior continua valendo. Em entrevista exclusiva ao Jornal Opção, Tammy Cavaleiro, Head of Legal da Você Português e especialista em imigração, detalha os impactos da proposta e alerta para o risco de separação familiar e discriminação contra brasileiros e outros imigrantes.
Segundo Tammy, o ponto mais sensível da nova proposta é o endurecimento das regras de reagrupamento familiar. Dependentes de titulares de visto de residência, como cônjuges, filhos, pais e enteados, serão diretamente afetados. Casais com filhos menores poderão se mudar juntos para Portugal sem exigência de tempo. Já casais sem filhos precisarão comprovar 18 meses de união no país de origem e aguardar mais 15 meses em Portugal para solicitar o reagrupamento.
“É uma distinção quase inconstitucional. Por que um casal com filhos seria mais ‘legítimo’ do que um sem filhos? Isso fere o princípio da unidade familiar, tão valorizado pela União Europeia”, afirma Tammy. Ela acredita que muitas famílias vão repensar a mudança para Portugal diante dessas novas exigências.
Alguns grupos continuam isentos das novas restrições. Titulares do visto Gold, voltado para investidores, podem levar seus dependentes imediatos. O mesmo vale para profissionais altamente qualificados. “É evidente que há uma tentativa de limitar o acesso à imigração a um público mais nichado e com maior poder aquisitivo”, observa a advogada.
Tammy destaca que a maioria dos solicitantes do visto de procura de trabalho hoje são profissionais da base da pirâmide, como trabalhadores da limpeza, construção civil e restaurantes. Com a nova proposta, esse visto será limitado a profissionais altamente qualificados. “Na prática, é uma limitação clara. Portugal quer atrair um perfil muito específico de imigrante”, analisa.
A atual legislação permite que cidadãos de países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), como o Brasil, solicitem autorização de residência diretamente em Portugal. Com a nova proposta, isso muda: será obrigatório obter o visto ainda no país de origem, no consulado da jurisdição. “Não haverá mais exceção para brasileiros e outros membros da CPLP. Isso representa um endurecimento claro e uma tentativa de controlar o perfil dos imigrantes que entram no país”, afirma Tammy.
A AIMA (Agência para a Imigração e Mobilidade), responsável por processos de estrangeiros em Portugal, atualmente tem um prazo de três meses para responder a solicitações judiciais. O primeiro texto da nova lei previa a ampliação para nove meses, prorrogáveis até 18. Após críticas e revisão pelo Tribunal Constitucional, o novo texto distingue os casos: causas familiares e vulneráveis, como menores de idade, não podem ser prorrogadas. Os demais casos mantêm o prazo de nove meses, com prorrogação apenas em situações excepcionais.
Tammy explica que o primeiro texto tentou condicionar o direito de recorrer à Justiça. Agora, o novo texto permite que o imigrante que comprove prejuízo grave e imediato possa entrar com ação judicial, sem precisar provar que o dano é reparável, o que representa um avanço.
A advogada também esclarece uma confusão comum: “A Lei dos Estrangeiros é diferente da Lei da Nacionalidade. A que está em pauta agora é a dos Estrangeiros. A da Nacionalidade está parada, mas acredito que, após a decisão sobre essa nova lei, ela volte à discussão em seguida”, aponta.
Tammy Cavaleiro conclui com um alerta. “Estamos diante de uma legislação que pode mudar o perfil da imigração em Portugal. Famílias devem estar atentas e avaliar com cautela. A promessa de vida melhor não pode vir acompanhada da separação familiar. E sim, acredito que essa lei, se sancionada, será discriminatória, tanto para brasileiros quanto para imigrantes em geral”, finaliza.
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