Um relatório divulgado pela Controladoria-Geral da União (CGU) revelou que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, liderado pela atual senadora Damares Alves (Republicanos-DF) durante o governo Bolsonaro, liberou recursos para duas ONGs envolvidas em um esquema de falsificação de documentos, contratações irregulares e desvio de verbas. O dinheiro destinado às ONGs tinha como objetivo financiar projetos sociais, mas acabou sendo desviado para contas de terceiros.

Em teoria, os recursos repassados pelo ministério de Damares às ONGs Instituto de Desenvolvimento Social e Humano do Brasil (IDSH) e Instituto Nacional de Desenvolvimento Humano (Inadh) deveriam ser utilizados para um programa de formação profissional destinado a adolescentes, mulheres em situação de prisão e vítimas de violência. No entanto, essas verbas foram redirecionadas para empresas fictícias.

Para implementar as políticas sociais, as ONGs deveriam contratar empresas por meio de licitação, como gráficas, locadoras de equipamentos, veículos, entre outras. No entanto, as ONGs beneficiadas pelo ministério de Damares simplesmente enviaram os recursos por meio de simulações ou propostas fraudulentas.

Até o momento, apenas uma parte dos recursos foi auditada pela CGU, e o prejuízo identificado chega a aproximadamente R$ 2,5 milhões. No entanto, somando-se todos os contratos das duas ONGs com verbas públicas federais, conforme registrado no Portal da Transparência, o montante envolvido chega a cerca de R$ 30 milhões. Isso indica que o prejuízo pode ser ainda maior.

Fachada

Uma empresas beneficiadas com os contratos foi a Globo Soluções Tecnológicas. Ao todo, recebeu R$ 11,7 milhões do Ministério, através das ONGs, para a compra de computadores, máquinas, ônibus e equipamentos médicos. Acontece que a empresa é uma típica “empresa fantasma”. Não possui funcionários e sua sede, conforme aponta a Receita Federal, jaz em um humilde barraco em favela no interior do Rio de Janeiro.

Sara Vicente Bibiano, a sócia-administrativa da empresa, é a provável laranja. De acordo com informações do Portal da Transparência, foi beneficiária do Auxílio Emergencial durante a pandemia. Resta saber se é realmente uma pessoa humilde que nunca viu a cor do dinheiro que foi apropriado indevidamente em seu nome, ou se é parte ativa do esquema e não se inclui nos pré-requisitos para receber a ajuda do governo.

Outro provável laranja é Clayton Elias Motta, sócio da Total Service Rio LTDA. Clayton foi secretário do deputado federal Professor Joziel (Patriotas-RJ), com quem Damares tinha amizade pessoal. Em 2022, a atual senadora pediu votos para Joziel, mas ele não foi reeleito. No seu mandato anterior, Joziel recolheu emendas do orçamento para o ministério de Damares, destinando-as ao IDSH. Foram cerca de R$ 3,8 milhões. Damares cansou de se referir a ele como “amigo” e “pidão”.

De acordo com a CGU, Damares não corrigiu as irregularidades e, mesmo notificada das falhas, seguiu liberando recursos para as ONGs. Ao Jornal Estadão, Damares negou as acusações e afirma que foi a sua gestão que levou o caso à CGU: “A solicitação de auditoria foi realizada no dia 11 de fevereiro de 2022, por meio de ofício, diante de fortes indícios de irregularidades detectados por ocasião de análise de mapeamento de riscos”, declarou.

Em nota, a assessoria de Damares Alves declarou o seguinte:

“A senadora Damares Alves esclarece que a referida apuração realizada pela CGU foi provocada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) ainda em sua gestão. Tal solicitação de auditoria foi realizada no dia 11 de fevereiro de 2022, por meio de ofício, diante de fortes indícios de irregularidades detectados por ocasião de análise e mapeamento de riscos nos Termos de Fomento firmados com o Instituto de Desenvolvimento Social e Humano do Brasil – IDSH BRASIL e com o Instituto Nacional de Desenvolvimento Humano – INADH. O relatório da CGU teve origem nas informações levadas ao órgão pela Assessoria de Controle Interno do MMFDH.

Ao receber o Relatório, o MMFDH exigiu das organizações sociais esclarecimentos e providências sobre as falhas apontadas. Em 20 de outubro de 2022, o IDSH ressarciu ao Erário o valor de R$ 1.100.659,46. As demais recomendações estavam em andamento quando houve mudança na gestão.

A senadora não conhece os donos da IDSH e da INADH.”