O relatório final da Comissão Especial de Inquérito (CEI) nº 002/2025, apresentado pela Câmara Municipal de Turvânia, aponta que a gestão do ex-prefeito Fausto Mariano Gonçalves, na época pelo antigo DEM, utilizou de forma sistemática e irregular o instituto da indenização para efetuar pagamentos sem licitação e sem respaldo contratual.

O documento, aprovado após quase cinco meses de investigação, conclui que há indícios de improbidade administrativa e de burla à legislação de licitações. O Jornal Opção entrou em contato com o ex-prefeito, que classificou as investigações como “levianas” e motivadas por “interesses políticos”.

Segundo ele, não há qualquer indício de envolvimento seu em casos de corrupção e todos os seus atos administrativos foram analisados e aprovados por órgãos oficiais de controle.

“A Polícia Civil, o Ministério Público e a DECARP, especializada no combate à corrupção, investigam o caso há oito meses e não há uma vírgula que me aponte em qualquer ato ilícito. Nada, zero”, declarou o ex-prefeito.

Fausto Mariano recordou que, durante seu primeiro mandato, denunciou uma servidora municipal que desviava recursos públicos. “No mesmo dia em que fui informado do desvio, acionei a Polícia Civil, o Ministério Público e o Tribunal de Contas dos Municípios. Pedi que a polícia fosse até a prefeitura para fazer a condução coercitiva da servidora, porque para mim corrupção é um valor inegociável”, afirmou.

O ex-prefeito comparou esse episódio com o caso mais recente que envolve o ex-secretário de Finanças Reginaldo Marques da Silva, apontado por desviar recursos na atual gestão. Segundo ele, a diferença de postura entre os casos é evidente.

“Quando descobriram o desvio agora, chamaram o Reginaldo para conversar, e no outro dia ele já não apareceu mais. Isso me causa estranheza. A polícia não foi chamada imediatamente como deveria”, disse.

Fausto destacou que Reginaldo confessou o crime e devolveu parte do dinheiro, “416 mil reais, conforme publicou a própria Polícia Civil”, e questionou a tentativa de associar seu nome ao caso.

“A Câmara tenta criar uma ligação minha com ele sem apresentar uma única prova. Cadê um PIX, um TED, um DOC das contas dele para as minhas? Não existe, porque nunca houve envolvimento meu.”

Críticas à Câmara Municipal

Para o ex-prefeito, a investigação conduzida pelos vereadores carece de legitimidade e base técnica. “A Câmara é uma casa política. Ela não tem instrumentos, nem estrutura para investigar mais do que a Polícia Civil ou o Ministério Público. É uma tentativa clara de perseguição política.”

Ele afirmou que aguarda a conclusão do relatório da Comissão Especial de Inquérito (CEI) e pretende recorrer à Justiça. “Eles vão ter que provar o que estão dizendo. Eu nem sei exatamente do que estou sendo acusado. Estão tentando manchar minha reputação depois de oito anos de trabalho e 30 obras entregues à população.”

O ex-prefeito ressaltou que todas as suas contas foram analisadas e aprovadas pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), sem qualquer ressalva. “De 2017 a 2024, todas as minhas contas foram aprovadas, uma por uma, pelo TCM. Isso mostra que a minha administração foi limpa, transparente e eficiente.”

Por fim, ele lamentou o que chama de uso político da Câmara. “Estão tentando criar um fato para me atingir, mas os documentos e as instituições sérias estão do meu lado. O papel aceita tudo, mas prova concreta ninguém tem.”

Parecer do TCM

CEI

Instaurada em 2 de junho de 2025 pela Portaria nº 060/2025-CMT, a CEI foi criada a partir de requerimento apresentado pelos vereadores Álefe Matias (MDB), Silvia do Urano (MDB) e Franci (PSD), com o objetivo de apurar supostas fraudes à licitação no período de 2017 a 2024.

As investigações revelaram que, especialmente no último ano da gestão anterior, o município realizou pagamentos em larga escala por meio de indenizações, contornando o devido processo licitatório.

Segundo o relatório, os procedimentos analisados apresentavam um padrão idêntico: todos utilizavam o mesmo parecer jurídico genérico, datado de 14 de fevereiro de 2024, e não continham nenhuma cotação de preços ou pesquisa de mercado, o que impediu a comprovação de economicidade e vantajosidade para o poder público.

A Comissão também apurou que as indenizações foram aplicadas em despesas rotineiras e previsíveis, como reformas de prédios públicos, compra de materiais, serviços de alimentação e até o pagamento de eventos que, segundo testemunhas, não chegaram a ocorrer, como o caso do Réveillon 2024-2025.

Depoimentos e indícios

Ao longo das investigações, a CEI ouviu mais de 20 testemunhas e servidores. Diversos depoimentos apontam que o ex-prefeito determinava pessoalmente o uso das indenizações, com o objetivo de concluir obras antes do fim do mandato.

Segundo a ex-controladora interna Divina Eterna de Oliveira, o gestor “ordenou as indenizações e garantiu que não haveria problema”, enquanto a ex-secretária de Administração Natália Alexandre Pereira relatou que o ex-prefeito “exigiu os procedimentos de indenização a partir de agosto de 2024, visando colocar seu nome nas placas de inauguração”.

Ainda de acordo com os relatos, secretários e servidores eram pressionados a assinar documentos sem a devida instrução processual. As oitivas também indicaram a participação direta de ex-primeira-dama Fabiane Mariano, que acompanhava obras e orientava equipes de execução.

A Comissão destacou a atuação do então secretário de Obras, William Silva Barreto, responsável por 71 processos de indenização, que somaram R$ 1,73 milhão. Ele admitiu ter realizado ampliações e serviços sem autorização formal, defendendo que os atos se justificavam pela “urgência” e pelo “fracasso de licitações”.

Os investigados foram notificados em outubro para apresentar defesa prévia. A controladora Divina Eterna de Oliveira e o ex-secretário de Obras Leandro Ribeiro Caetano apresentaram defesa escrita.

Já o ex-prefeito Fausto Mariano Gonçalves, apontado como principal responsável pelas irregularidades, não compareceu à oitiva nem apresentou defesa no prazo concedido pela Comissão.

Próximos passos

No parecer conclusivo, a CEI afirma que o município “passou a utilizar o instituto da indenização como regra, e não como exceção”, o que configurou grave irregularidade administrativa.

O texto ressalta que o pagamento por indenização só é admitido em caráter excepcional, quando comprovada a urgência e a impossibilidade de contratação prévia, condições que, segundo a comissão, não existiam nos casos analisados.

O relatório aponta possível violação aos princípios da legalidade, moralidade e eficiência, previstos no artigo 37 da Constituição Federal, e enquadra as condutas nos artigos 10 e 11 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992).

A CEI deve encaminhar o relatório final ao Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), ao Tribunal de Contas dos Municípios (TCM-GO) e à Prefeitura de Turvânia, para adoção das medidas cabíveis. O documento também será submetido ao plenário da Câmara Municipal para apreciação formal.

A reportagem entrou em contato com a Câmara Municipal de Turvânia, mas não obteve retorno. O espaço permanece aberto.

Parecer conclusivo da CEI

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