Bancada da Bíblia quer ensinar criacionismo nas escolas

08 setembro 2023 às 07h45

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Ao menos 36 propostas que ferem a laicidade do Estado tramitam no Congresso, nos estados e nos municípios. Os projetos, propostos por parlamentares evangélicos, buscam priorizar o cristianismo em detrimento de outras religiões. A maior parte das propostas, com 11 menções, refere-se e a instituições de ensino e visam estabelecer a obrigatoriedade do estudo da Bíblia na grade curricular escolar.
Na Câmara, Cabo Daciolo (PDT-RJ), hoje sem mandato, e o deputado federal Marco Feliciano (PL-SP) propuseram, respectivamente, a inserção da disciplina Estudo da Bíblia Sagrada e conteúdos criacionistas — corrente de pensamento que explica fenômenos naturais a partir da religião. Feliciano, que é pastor, defende que o criacionismo e a ciência não são necessariamente contraditórios: “Minha filha perguntou: papai, o Big Bang existiu? Eu digo pra ela que sim e mostro na Bíblia, porque está lá em Gênesis, em faça-se a luz”.
O parlamentar explica ainda que quer defender os valores religiosos: “Se não daqui a pouco vão tirar o Cristo Redentor do Rio de Janeiro porque ele aponta para alguma religião”, explicou. O Estado, que é Laico desde 1891, prevê a livre manifestação de todas as religiões, mas não adota nenhuma delas como parâmetro para decisões políticas.
Para justificar a inserção da Bíblia na grade curricular, Daciolo afirma que o livro é um dos mais antigos do mundo e que não pertence a nenhuma religião. “Este projeto de lei visa a estimular a leitura dos jovens estudantes, bem como levá-los ao universo de histórias e lições a respeito da vida, dos dilemas morais e éticos tratados”, diz em texto que tramita desde 2017. O PL 9164/2017 pretende alterar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
Cabo Daciolo ganhou destaque por seus discursos proféticos no Congresso. Em setembro, defendeu pelo fechamento do Congresso e intervenção militar. “Vamos colocar a bandeira do Brasil nos nossos lares, contra a corrupção no Brasil e pela denúncia aprovada no STF (contra Michel Temer). E mais, o homossexualismo é pecado e está escrito que ele não vai para o céu. Assim como não vão o alcoólatra, o adúltero, o ladrão e o corrupto. E Deus está no controle. E que se feche o Congresso Nacional, com intervenção federal, com um governo provisório para acertar a nação”, disse Daciolo.
Deputado federal desde 2015, Feliciano é um conhecido antigo do Congresso. Envolvido em projetos polêmicos como “cura gay”, o pastor já foi acusado diversas vezes por homofobia e racismo. Em suas redes sociais, disse que “africanos descendem de ancestral amaldiçoado”.
Estado Laico
Em um Estado laico, não é vedada a prática religiosa, mas pelo contrário, as pessoas são protegidas pela Constituição para manifestarem livremente suas crenças e cultos. Deve-se observar o princípio de que a religião pertence à vida privada e não pode servir de parâmetro para um agente público em exercício do dever.
Em um Estado laico, não deveria se admitir qualquer ação governamental ou estatal justificada por meio de assuntos religiosos. Além disso, temas religiosos não deveriam assumir um caráter de lei para a garantia da hegemonia de apenas um grupo religioso. No âmbito de um Estado laico, entende-se que toda e qualquer visão religiosa de mundo deve ser respeitada e que a liberdade de culto e de crença deve ser garantida.
Em 7 de janeiro de 1890, foi promulgado o Decreto 119-A, que tornava o Brasil um país laico. O Decreto trouxe uma série de mudanças para a vida civil e para a organização governamental brasileira. Nessa ocasião, foi criado o casamento civil, tornando o casamento religioso opcional e a união civil a forma reconhecida pelo governo. Os cemitérios, antes administrados por igrejas, passaram a ser geridos pelo poder público.