Pirâmide: golpes envolvendo apostas esportivas ganham as redes sociais
04 agosto 2023 às 10h17
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Promessas de ganhos surreais, com retornos de até 2.400%, acompanhadas de uma lábia convincente e afirmações de “dinheiro certo”. Os “cálculos são muito precisos e estudados”. Além disso, o jeito de apostar é simples: basta investir uma quantia em dinheiro que é administrada pelo “cabeça”, responsável pela aposta, e contar que o bilhete sugerido será o “premiado”. Isso significa que o time sugerido no palpite irá ganhar com aquele placar escolhido e o apostador assim ganhará dinheiro. Quem dera se fosse tão fácil.
Por uma semana, o Jornal Opção se infiltrou em grupos de redes sociais, como Facebook e WhatsApp, e acompanhou o esquema de pirâmide envolvendo jogos de azar em todo país. Se passando por um apostador iniciante, o repórter chegou a negociar com pelo menos seis criminosos de distintos lugares, como Goiás, Bahia, Piauí, São Paulo, Pará e até do exterior.
Com um poder de convencimento que impressiona, em todos os casos, o modo de aplicar o golpe foi praticamente o mesmo: o repórter teria que dar uma quantia em dinheiro (o mínimo é R$ 2) é escolher um dos palpites apresentados pelos criminosos, que segundo eles, tem 95% de chances de ser premiado. O retorno, porém, pode variar, a depender do valor dado ao estelionatário.
Em um exemplo disponibilizado pelo criminoso goiano que se identificou como Alves, por exemplo, o valor ganho com uma aposta de R$ 100 foi de R$ 3.168. Ou seja, retorno de mais de 3.000%, dinheiro que um trabalhador assalariado (R$ 1.320) levaria quase três meses para conseguir. A aposta, conforme o bilhete, foi realizada no dia 29 de julho de 2023, às 18h30, sendo que o valor foi pago no dia seguinte, às 6h20. O jogo apostado foi entre Corinthians e Vasco da Gama pela Série A do Campeonato Brasileiro. O time paulista saiu vitorioso por 3 a 1.
“É só você escolher e eu faço ele [aposta] pra você no seu nome. Todos os dias eu mando esses bilhetes lá no grupo. Trabalho somente com apostas, meu trabalho é sério e certo. Se você ganhar eu pago na hora, aqui não tem enrolação não”, afirmou Alves.
As apostas, conforme os criminosos, abrangem não só o futebol brasileiro, como também o estrangeiro e até a Copa Feminina.
“95% dos bilhetes prontos aí são certos de bater. Você pode fazer o seu também, pode colocar o valor que você quiser. Não é bolão não, cada um faz a sua aposta individual. É só você liberar o PIX que eu mando para a gerência e eles fazem o seu bilhete. Você acertando, o pagamento cai na hora”, reforçou Luciano, estelionatário da Bahia.
Crimes
O coordenador do Grupo de Atuação Especial em Grandes Eventos de Futebol (GFUT) do Ministério Público de Goiás (MP), Sandro Halfeld, explica que os golpes por meio de apostas esportivas pouco se diferem da maioria dos golpes, visto que a vítima imagina conseguir ganhos econômicos fáceis, mas acaba sendo ludibriada pelos golpistas. Ele reforça que, no caso das apostas esportivas, os criminosos dizem ter “estratégias matemáticas” infalíveis para ganhar.
“A vítima acredita na conversa do criminoso dando seu dinheiro para ele apostar e ganhar para ela. Para não cair em golpes o apostador deve encarar a atividade como recreação ou entretenimento e jamais como uma forma de ganho financeiro. É um risco grande demais”, disse.
Sandro orienta ainda que as dívidas provenientes de apostas são consideradas naturais pela Justiça. Ou seja, caso uma vítima deixe de receber, a Justiça não pode fazer nada para que ela receba o valor pendente.
O promotor afirma que grande parte das plataformas bet.com (voltadas a apostas esportivas) estão hospedadas fora do Brasil. Ou seja, se a pessoa apostar na plataforma e ganhar, mas não receber, o indivíduo não tem onde reclamar, visto que as empresas não se sujeitam às leis brasileiras.
“Nas obrigações naturais há uma obrigação moral para que ela seja paga. Se entrar na Justiça para cobrar uma dívida de aposta, a Justiça dirá que não tem como exigir dívida de aposta no poder judiciário. A nossa lei não garante exigibilidade de dívidas de apostas. Porém, se uma pessoa chega para a outra, engana ela, diz que consegue ganhar dinheiro e a pessoa passa o dinheiro. Isso é golpe. É crime”, concluiu.