Desconsidere os sinais ortográficos e os espaços entre as palavras, inverta as letras e leia a palavra ou frase. Fez sentido? Se não, certamente não é o caso

“Amor, me ame em Roma” é o típico caso dos malabarismos do idioma brasileiro | Foto: Reprodução
“Amor, me ame em Roma” é o típico caso dos malabarismos do idioma brasileiro | Foto: Reprodução

Ademir Luiz
Especial para o Jornal Opção

“Socorram-me, subi no ônibus em Marrocos!”

Esta frase é um palíndromo. Foi muito popular na época em que eu estava na escola. Ficávamos impressionados em ser possível existir algo tão fascinante na chata disciplina Língua Portuguesa, que não aprendíamos nem estudávamos com nossa velha professora que parecia menos interessada nos efeitos pedagógicos dos malabarismos do idioma do que no mistério insondável dos mecanismos da conjunção adversativa do pretérito imperfeito do indicativo. Acho que já tratei disso, mas, agora que me tornei professor, explico: palíndromos são nomes, palavras ou frases que lidas de trás para frente mantêm o mesmo sentido original.
Comumente são desconsiderados os sinais ortográficos e os espaços entre as palavras. A palavra “palíndromo” — que, notem, não é um palíndromo — deriva do grego “palin”, para trás, e “dromos”, corrida. “Corrida para trás” seria uma tradução aceitável. Anotaram, gafanhotos?

Esse é um dos mais famosos em língua portuguesa brasileira. Mas não é um palíndromo perfeito, como quase tudo no Brasil brasileiro — e em Marrocos. Vejam: “socorram-me, subi no ônibus em Marrocos!”. Fica assim: “!socorraM me subinôonibus, em-marrocos”.
Um palíndromo perfeito, excetuando-se palavras muito curtas, é raro. Raro como o amor perfeito, se me permitem o toque de sentimentalismo barato num romance contemporâneo urbano. Mas citei a palavras amor porque me lembrei de um palíndromo quase perfeito: “Amor, me ame em Roma”.

Vejam, fica assim: “amoR me ame em, romA”. O que atrapalha são as vírgulas. Como na vida. Podemos estar cheios de boas intenções, ou mesmo acomodados, mas sempre existem as vírgulas, que nos fazem, sem querer, subir em ônibus impossíveis para o Marrocos, raramente para Roma.

Ademir Luiz é professor da Universidade Estadual de Goiás.