Uns sabem o nome dos bois; o Nunes D’Costa sabe o nome dos passarinhos

05 setembro 2023 às 21h22

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Sinésio Dioliveira
Especial para o Jornal Opção
Há certas pessoas que, muitas vezes espremidas por circunstâncias alheias à sua vontade, são obrigadas a dar nome aos bois; já outras, por pequenez mental, chegam até se comportar como tais, a ponto de mugir e dar chifradas, fato que não lhes preocupa; haja vista que o temor delas mesmo é virar jacaré, conforme foram alertadas por uma divindade de um pau oco, cujo batom cada vez mais se aproxima do conteúdo da sua cueca. Contrastando com essa manada, existe o amigo Nunes D´Costa, que é meu mestre em aves. O que ele sabe bem é dar nome aos passarinhos. Nem só isso como também conhece os bichinhos pelo canto e o comportamento deles. Já eu, tadinho de mim, só os entendo como intérpretes dos poemas de Deus. E sei também que eles são notas musicais de uma canção celeste é que poesiam o céu.
Tenho inúmeras espécies de aves registradas graças à camaradagem do Nunes. Rubem Braga, em cujas crônicas há muitos passarinhos, iria gostar de conhecer o Nunes. Houve um tempo em que eu ia com mais frequência ao seu pequeno paraíso na Chácara de Recreio Samambaia. E nosso trato era: eu levava as quitandas — pão-de-queijo, mané-pelado, enroladinho de queijo — e ele entrava com o café, que era coado quando eu chegava lá. Em nossas conversas, era passarinho pra lá, passarinho pra cá. E nesse bate-papo, ele, como sempre, na regência do assunto, e eu só captando suas informações e pondo no embornal da memória.

Certa vez, ele me mandou a seguinte mensagem: “Corre aqui, tem um urutau com um filhote bem fácil de fotografar”. Tomei a liberdade de chamar a poeta amiga Cida Almeida, que, manoelinamente é também “aparelhada para gostar de passarinhos”. O urutau estava numa praça em frente ao estúdio que o Nunes tinha numa viela do Setor Sul. E com ele seu filhotinho já bem crescidinho num galho de seriguela. Foram fotos e mais fotos. A alegria do Nunes foi maior não por ver tal ave (coisa já tinha visto demais), mas em presenciar a minha alegria e a da Cida, que até então não tínhamos visto um urutau de perto. Numa outra vez, isso já com ele morando na Chácaras, fui novamente acionado: “Tem uma jaó vindo comer num comedouro que fiz na beira da estrada. Corre aqui.”
Corri, mas sem afundar o pé no acelerador. Tive para desistir da espera da jaó. Coloquei meu carro num canto da estrada, e o Nunes jogou um tecido de camuflagem que praticamente cobriu todo o veículo. Abaixei o vidro lateral do lado do motorista e coloquei a lente num buraco do tecido e fiquei à espera. Estava um calor medonho, e eu lá quase por uma hora, suando, muito incomodado com a quentura.
Quando já estava para interromper a captura, isso por volta das 18h, ouvi um barulhinho contínuo nas folhas secas do chão vindo em direção ao comedouro. Todo o incômodo que eu estava sentindo foi embora quando a vi. Meu antigo desejo em saber como era de bem perto aquela ave que eu ouvia cantando triste no meio da mata se realizou. Nessa boa rotina de ser chamado pelo Nunes, também já registrei uirapuru-laranja, coruja-orelhuda, caburé, tico-tico-da-mata. Tenho uma dívida passarinhística com ele impagável.
Recebi um novo convite dele recentemente. Me ligou, falamos demoradamente. Desta vez é para eu ir ao Parque Estadual Altamiro de Moura Pacheco daqui alguns dias. E a novidade agora é para eu conhecer um casal de gavião-pato, que está nidificando no parque. “Mestre, você vai conhecer um gavião raro e espetacular, tem 56 cm de comprimento e 117cm de envergadura, é uma ave rara”. Em nossa conversa sobre o respectivo parque, entraram os incêndios que todo ano ocorrem e deixam um rastro de destruição vegetal e animal. As aves, por sua vez, conseguem escapar, mas seus filhotes acabam morrendo estorricados. Está passando da hora de se comprar um helicóptero para combater os incêndios rotineiros na área, onde existe a Barragem João Leite com capacidade de 129 bilhões de litros de água. Água esta que irá conter os incêndios no parque de maneira mais rápida com o uso da aeronave e consequentemente impedindo grandes danos ambientais para o parque, o qual precisa receber um tratamento de muito respeito de nossa parte, haja vista que ele é imensurável tesouro ambiental a nos proporcionar inúmeros benefícios vitais.
*Sinésio Dioliveira é jornalista