Um poema da bióloga Daniella França sobre a diversidade do Cerrado
13 setembro 2020 às 00h00
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Doutora pela Unesp saúda o Cerrado e protesta contra o que criminosos do colarinho branco estão fazendo com ele
O poema é meu jeito de saudar meu Cerrado, bioma de onde vim, e protestar contra o que criminosos de colarinho branco estão fazendo contra ele. Não há muito o que comemorar, ainda mais com o Pantanal em chamas (#savepantanal), então deixo meu protesto cheio de nostalgia e dor.
Protesto pelo Cerrado
Daniella França
Logo bem cedo o barulho das araras
Que em bando vinham livres das veredas do sertão
E as seriemas estridentes cantando juntas
Disputando no mais alto cupinzeiro desse chão
O joão-de-barro amanhecia animado
Junta galho, junta barro, começava a construção
Enquanto isso o sol nascia preguiçoso
Pra depois arder vistoso lá “detrás” do Cerradão
No campo eu via o veado catingueiro
Nas veredas o campeiro lá por trás da cerração
E quando ouvia o anu cantar manhoso
De um galho espinhoso, me enchia de emoção
E os marrecos que chegavam na represa
Completavam o cenário que me enchia de paixão
Até que à tarde o jaó puxava o coro
E eu me entregava ao choro ao escutar a canção
Hoje eu vivo aqui bem longe, na cidade
Sem arara, sem lagoa, sem jaó, sem ribeirão
Mas as memórias da vida no interior
Sempre me enchem de amor, de saudade e inspiração
Me lembro sempre do cheiro de mato verde
Quando a chuva vinha ao longe, com aquela mansidão
E quando olho para os lados nessa selva
Todinha feita de pedras, chega aperta o coração
O meu Cerrado, terra de tantas belezas
Mil sabores e riquezas, inspira admiração
Mas fico triste ao saber que ainda tem gente
Que manipula e mente pra colocar tudo no chão
Desmatam tudo, assoreiam nossos rios,
Dizem que o meu Cerrado não serve pra nada não
Mal sabem eles que se acabar a natureza
Junto com toda beleza vai embora a produção
É engraçado grandes latifundiários
Que acabam com o Cerrado em nome de produção
Onde era lindo, agora é coberto de soja
E o que mais me enoja é saber tanta aberração
Onde era campo com as lindas sempre-vivas
Agora só se vê gado e muita destruição
E a comida produzida aqui na terra
É vendida fora dela pra alimentar o patrão
Enquanto isso, os bolsos dos fazendeiros
Donos do Brasil inteiro (você não faz nem ideia)
Transbordam cheios de ganância e dinheiro
E o pobre, companheiro, morre de fome e miséria
O meu Cerrado, o mais belo e tão amado
Berço de todas as águas e onde tudo se produz
Foi derrubado, destruído e queimado
Pelo neto do aclamado senhor que hoje ainda induz
Induz o pobre a acreditar que é ajudado
E até bem estimado por aquele que o seduz
Mas a verdade, é bem outra, boiadeiro
Seu patrão conquista o mundo inteiro usando o que você produz!
Poema e fotos de minha autoria.
Daniella França é doutora em biologia e poeta. As fotografias são da autora da poeta.