A questão da natureza de Deus e Sua relação com o Universo é o ponto de divergência mais profundo entre o filósofo Baruch de Spinoza e a Doutrina Espírita (Kardecismo), sendo essa diferença fundamentalmente delineada pela distinção entre Panteísmo e Panenteísmo. Em pesquisa nas fontes citadas ao final, temos que o pensamento de Spinoza, centrado na fórmula “Deus sive Natura” (Deus, ou seja, a Natureza), estabelece um Monismo de Substância radical, que é a expressão máxima do Panteísmo ocidental.

Para Spinoza, Deus é idêntico ao Universo; é a única Substância infinita, eterna e incriada, possuindo uma natureza totalmente impessoal, sem vontade ou consciência separada. Tudo o que existe é apenas um modo finito dessa Substância, o que implica a ausência de livre-arbítrio, pois todas as ações são consequências necessárias e determinadas da ordem da Substância, e a negação da imortalidade individual da alma, que se dissolve no Todo após a morte. O próprio Albert Einstein, admirador de Spinoza, identificava a divindade com a harmonia das leis do cosmos.

Por outro lado, a Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec, alinha-se a uma visão Panenteísta, que sustenta que Tudo está em Deus, mas Deus é maior do que o Todo. O Espiritismo define Deus como a Inteligência Suprema, Causa Primária de todas as coisas, conferindo-Lhe transcendência e personalidade moral (Soberanamente Justo e Bom). Nessa perspectiva, Deus não se confunde com Suas criaturas, pois Ele as criou, estabelecendo o Espírito (a alma imortal) e a Matéria. Nessa perspectiva, alinhavei este texto para considerar que o Espiritismo afirma a existência de Espíritos individuais que progridem moral e intelectualmente através da reencarnação. Essa individualidade e o livre-arbítrio são cruciais, pois a moralidade e a Justiça Divina só se sustentam se o Espírito for responsável por suas escolhas.

A transcendência de Deus permite que Ele estabeleça uma Lei Moral perfeita, enquanto Sua imanência a imprime na consciência humana. É importante notar que a própria expressão Panenteísmo foi cunhada pelo filósofo alemão Karl Christian Friedrich Krause (1781–1832) no século XIX, conforme achei nesta modesta pesquisa em fontes digitais checadas, justamente para distinguir essa visão de Deus, onde o Todo está contido em Deus (e Deus é maior), do Panteísmo spinozista, onde Deus é idêntico ao Todo.

Quando comparadas à física e cosmologia modernas, ambas as visões, panteísta e panenteísta, apresentam desafios e ressonâncias. O Panteísmo de Spinoza encontra alguma afinidade na visão de que o Universo é um sistema coeso e determinista, regido por leis físicas imutáveis. No entanto, a Física Quântica e suas descobertas no nível subatômico representam o maior desafio moderno ao determinismo rígido defendido por Spinoza. A Interpretação de Copenhague da Mecânica Quântica introduz o indeterminismo fundamental, ao postular que os eventos quânticos são regidos pela probabilidade e não pela causalidade estrita. A imprevisibilidade no nível fundamental rompe com a ideia spinozista de que “tudo existe e opera necessariamente de uma maneira determinada”, abrindo uma porta teórica para o Panenteísmo kardecista que afirma a liberdade da escolha individual.

O Panenteísmo do Kardecismo pode ressoar com conceitos que transcendem a matéria, como a energia escura e a matéria escura, que compõem cerca de 95% do universo, sendo o Fluido Cósmico Universal espírita uma possível metáfora para uma estrutura fundamental que permeia o cosmos e não se limita à matéria ordinária.

É fundamental ressaltar que os dados que sustentam a existência da matéria escura e da energia escura têm fontes reais e são baseados em rigorosas observações astronômicas e cosmológicas. Elas são deduções necessárias para que as leis da física (como a gravidade) funcionem. O Panteísmo de Spinoza se alinha à coerência e determinismo da Natureza (na visão clássica), enquanto o Panenteísmo kardecista se alinha à possibilidade de estruturas e inteligências subjacentes (como sugerido pela matéria escura) e encontra no indeterminismo quântico um possível argumento filosófico contra a necessidade absoluta de todos os eventos. As lentes gravitacionais – fenômeno onde a luz de galáxias distantes é curvada pela massa invisível – fornecem o mapeamento visual mais poderoso dessa massa excedente e invisível (matéria escura) que sustenta a estrutura do cosmos.


📚 Bibliografia Principal

  • Spinoza, Baruch. Ética. (Publicada postumamente, 1677).
  • Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos. (1857).
  • Krause, Karl Christian Friedrich. Vorlesungen über das System der Philosophie (Lições sobre o Sistema de Filosofia, 1828) – Contém a cunhagem original do termo “Panenteísmo”.
  • Einstein, Albert. Correspondência e ensaios (para a afinidade com a visão de Spinoza).
  • Rubin, V. C., Ford, W. K. “Rotation of the Andromeda Nebula from a Spectroscopic Survey of Emission Regions.” The Astrophysical Journal (1970) – Fonte primária para as curvas de rotação de galáxias (Matéria Escura).
  • Supernova Cosmology Project & High-Z Supernova Search Team. Trabalhos publicados em 1998/1999 (como o de Riess, A. G., et al.) – Fontes primárias para a aceleração da expansão do Universo (Energia Escura).