Sai no Brasil a polêmica peça “Praça dos Heróis”, do austríaco Thomas Bernhard
15 março 2020 às 00h00
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O escritor critica o nacionalismo e o antissemitismo na Áustria, país que foi anexado pela Alemanha em 1938
O escritor austríaco Thomas Bernhard, como Mário de Andrade, era múltiplo: quiçá trezentos e cincoenta. Escreveu romances, peças de teatro, poemas e obras autobiográficas (como o belo, doloroso e virulento “Origem”). Chega agora ao Brasil a peça “Praça dos Heróis” (Temporal, 192 páginas, tradução de Christine Röhrig), de sua autoria.
Como se sabe, Adolf Hitler era austríaco (como outro Adolf, o Eichmann, o carrasco dos judeus) e, na primeira oportunidade, como chanceler-ditador da Alemanha, anexou a Áustria, sob o aplauso de muitos filhos do país. Depois da Segunda Guerra Mundial, com o nazista-mor morto, o país entrou num processo de “negação”. Havia se submetido à força? Em parte, sim. O fato é que o país cedeu ao nacional-socialismo e acompanhou Hitler de 1938 a 1945, sem resistência (exceto de uma ou outra figura isolada). Thomas Bernhard é um autor — morreu com 58 anos, em 1989, deixando uma obra impagável, de alta qualidade — que não fazia concessões. Era implacável, duríssimo. A peça “Praça dos Heróis” examina, criticamente, o nacionalismo — “o último refúgio dos velhacos”, segundo Samuel Johnson — e o antissemitismo da Áustria no século 20. Trata também, de maneira corrosiva, da tentativa de reconstruir o passado nazista sob luzes mais amenas e douradas — a negação — por parte dos austríacos.
Ao ser encenada no Burgtheater, em Viana, capital da Áustria, em 1988, a peça provocou polêmica. Ela foi escrita por Bernhard sob encomenda de Claus Peymann, diretor do teatro. Era para comemorar os cem anos de abertura da “praça” artística. Frise-se que, naquele ano, completava 50 anos do Anchluss — a anexação da Áustria pela Alemanha.
O presidente da Áustria na época era Kurt Waldheim, que protestou, de maneira veemente, contra a peça de Bernhard. Seria um “insulto ao povo austríaco”. Frise-se que a ficha de nazista de Kurt Waldheim não era nada pequena.
A edição patropi conta com prefácio de Alexandre Villibor Flory, doutor em literatura alemã pela USP e especialista na obra de Bernhard. Flory comenta a qualidade da peça e da tradução. A Temporal inclui na sua edição fotografias, a ficha técnica da peça exibida em Viena e a ficha técnica da apresentação brasileira, que foi dirigida por Luciano Alabarse, no Teatro São Pedro, em Porto Alegre
Detalhe sobre Thomas Bernhard: sua família era austríaca. Quando a mãe ficou grávida, solteira, decidiu dar à luz na Holanda. Portanto, lá nasceu o escritor, “por acaso”. Mas, de fato, era austríaco e escrevia, como Nietzsche (ele é meio nietzschiano), Thomas Mann e Kafka, no mais puro alemão.
Obras de Thomas Bernhard em português
+ “Simplesmente Complicado” (Cotovia)
+ “O Náufrago” (Companhia das Letras, tradução de Sergio Tellaroli, 140 páginas)
+ “Derrubar Árvores — Uma Irritação” (Assírio & Alvim, tradução de José A. Palma Caetano, 196 páginas)
+ “Na Terra e no Inferno” (Assírio & Alvim, tradução de José A. Palma Caetano, 251 páginas). Trata-se da bela e complexa poesia de Thomas Bernhard
+ “O Sobrinho de Wittgenstein” (Rocco, tradução de Ana Maria Scherer, 124 páginas)
+ “Antigos Mestres” (Assírio & Alvim, tradução de José A. Palma Caetano, 251 páginas)
+ “Origem” (Companhia das Letras, tradução de Sergio Tellaroli, 501 páginas)
+ “Árvores Abatidas” (Rocco, tradução de Lya Luft, 167 páginas). Publicado em Portugal como “Derrubar Árvores”
+ “Perturbação” (Rocco, tradução de Hans Peter Welper e José Laurenio de Melo, 234 páginas)
+ “Meus Prêmios” (Companhia das Letras,
+ “Extinção — Uma Derrocada” (Companhia das Letras, tradução de José Marcos Mariani de Macedo, 476 páginas)
+ “Meus Prêmios” (Companhia das Letras, tradução de Sergio Tellaroli, 112 páginas)
+ “O Imitador de Vozes” (Companhia das Letras, tradução de Sergio Tellaroli, 160 páginas).
Sobre Thomas Bernhard
+ “Thomas Bernhard — Una Biografía” (Siruela, 265 páginas), de Miguel Sáenz
+ “Conversas com Thomas Bernhard” (Assírio & Alvim, tradução de José A. Palma Caetano, 141 páginas).