Roseana Murray: de como a poesia salva e mesmo alimenta a alma de boas vibrações
27 outubro 2024 às 00h00
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Soninha Santos
Especial para o Jornal Opção
Roseana Murray, poetisa nascida no Rio de Janeiro, em 1950, é uma das grandes representantes da moderna poesia brasileira, não resta dúvida. Mas que sua poesia infantil seja capaz de alcançar os pequenos leitores, com força e carinho, talvez poucos saibam.
Talvez isso ocorra em parte pela pouca presença do gênero poético nas escolas infantis e fundamentais.
A poesia, diferentemente da narrativa, ocupa um espaço muito pequeno nas nossas escolas. Quando muito é usada para ilustrar uma tarefa ou uma data comemorativa.
Tampouco a poesia faz morada assídua nas seleções de leituras das pessoas, educadoras ou não. Muitos profissionais têm dificuldade em trabalhar, explorar ou analisar o gênero poético e suas imagens.
Entretanto, a poesia precisa, sim, tornar-se mais presente nas salas de aula desde a mais tenra idade. A poesia sensibiliza, desmitifica estereótipos e preconceitos. A poesia transmite aconchego e, se bem explorada em suas variadas nuances, é capaz de modificar o leitor, dos muito pequenos até os maiores ou os adultos.
Voltemos à poetisa Roseana Murray, dona de uma poesia capaz de calar ruídos e ir ao encontro do coração de quem a lê. Sua poesia extrapola barreiras e destitui fronteiras e as imagens que desperta falam diretamente ao que temos de mais humano e às nossas características mais essenciais e imprescindíveis: tolerância, alteridade, afeto, aconchego, empatia, sonoridade, percepção sensorial, ritmo e muito mais.
Roseana Murray consegue extirpar a dor e as perdas com seus versos, falando de modo intimista com seus leitores.
Dentro desse seu fazer poético, dessa forma bonita de expressar sentimentos, é que surgiu seu mais recente livro — “O Braço Mágico” —, ilustrado por Fernando Zenshôe e publicado pela Estrela Cultural.
Recentemente , a poetisa perdeu o braço direito de forma trágica (mordida por cachorros) e, mesmo tão machucada fisicamente, conseguiu força e coragem para reaprender a escrever com a mão esquerda.
O livro, lindamente ilustrado e diagramado, tran3sforma-se assim numa “prosa poética “, contando a história de uma avó, dona de um outro braço, agora invisível, mas que não a deixa esquecer da sua força e da sua capacidade de superação.
Ela fala desse outro braço (que não está mais lá fisicamente) com a leveza dos grandes poetas, capazes de alcançar distâncias infinitas por meio de seus versos e imagens. A trajetória da avó, em companhia dos netos, se tece em conjunto com a trajetória da poeta, e o resultado desse percurso é uma poesia maior, de uma grandeza muito superior aos limites que somos capazes de ultrapassar.
Fazer de uma tragédia, força, é um privilégio para poucos. Roseana Murray consegue isso e muito mais. Confirma com cada verso, com cada imagem criada, com a beleza desse conjunto tecido a partir do sofrimento, como viver vale a pena.
Soninha Santos é professora de literatura infantil e crítica literária. É colaboradora do Jornal Opção.