Por mais propagandista e oportuno que “Rio 2” possa soar, o que importa mesmo é sua mensagem ambiental às crianças

Cena do filme  “Rio 2”, animação dirigida pelo brasileiro Carlos Saldanha | Foto: Fox Filmes
Cena do filme “Rio 2”, animação dirigida pelo brasileiro Carlos Saldanha | Foto: Fox Filmes

Júlio Pereira
Especial para o Jornal Opção

Começa com toda aquela festa extravagante no ano novo. O aparente propósito do filme é anunciado com uma música norte-americana misturada com batuques brasileiros. Antropofagia pobre pra gringo gostar, longe dos genuínos antropofágicos tupiniquins. Logo percebemos: é um filme turístico, espertinho, feito em um ano oportuno. Aquela montagem mostrando os vários pontos turísticos das principais capitais brasileiras, sem nenhuma necessidade narrativa, não mente. Com a Copa do Mundo chegando, uma sequência feito essa é muito oportuna. E como um bom filme turístico, no qual até a perspectiva da câmera por pássaros favorece os planos aéreos exibindo as paisagens, tem-se os personagens estereótipos dos locais em questão. Por exemplo: o carioca malandro, os sambistas natos.

Talvez essa seja a razão do filme existir. Porém, ao contrário do primeiro, “Rio 2” consegue ultrapassar o seu propósito publicitário. Dessa vez, o casal Linda e Blu partem para a Amazônia com a esperança de encontrar pássaros de sua mesma espécie. Chegando lá, descobrem um empresário fazendo negócios ilegais — desmatando a floresta, claro.

Cria-se um cenário ideal para uma mensagem ambientalista, fazendo deste filme algo mais ambiental do que turístico, embora este aspecto persista na beleza intrinsecamente turística da floresta Amazônica. Ainda assim, o roteiro derrapa ao tentar dar um foco a um núcleo humano desinteressante (o atrapalhado que toma o aviso de um animal por dança do acasalamento e o contraponto racional e sereno da presença feminina), por uma aparente mea culpa ou algo do gênero, posto que a autogestão dos animais já é suficientemente instigante.

Aliás, o filme parece ter uma predileção por esses núcleos menores, que acabam por tirar a atenção dos protagonistas. Desse modo, surge a saga completamente deslocada de um antagonista pássaro, embora ele nunca soe cômico conforme o roteiro parece pretender a todo momento. Por outro lado, embora narrativamente risíveis, os momentos dos personagens selecionando artistas para o show de talentos são, em sua maioria, impagáveis, sendo as tartarugas capoeiristas um dos maiores trunfos da obra. Importa, de fato, é o conflito interno do protagonista e o choque de realidades. A saga do americano domesticado e industrializado — sim, um pássaro que come enlatados — tendo que se adaptar ao que seria, na verdade, o seu habitat natural. Evidencia-se um problema grave: seria o retiro dos pássaros em extinção do seu habitat a melhor opção para sua preservação? Não estaríamos, afinal, alienando-o do seu ambiente? Blu é a maior prova disso. O personagem demora a se acostumar com a vida na selva. Ao mesmo tempo, é interessante constatar um cuidado ao se tratar do personagem, já que em muitos momentos demonstra ser completamente egoísta, denotando uma personalidade moralmente dúbia.

Por mais propagandista e oportuno que “Rio 2” possa soar, o que importa mesmo é sua mensagem ambiental às crianças. Além disso, algumas de suas músicas lembram, por exemplo, Clara Nunes, remetendo a um Brasil de raiz que precisa ser resgatado. O Brasil do futebol, do samba, da pobreza, sim, mas, sobretudo, o país da alegria, no qual, apesar de todas as mazelas, o samba não morre, a bola não para de rolar e o sorriso não sai do rosto.

Júlio Pereira é crítico de cinema.