Que tal tirar do poder o governante ruim?
18 março 2017 às 09h34
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Proposta está no livro “Os órfãos da Constituição”, de José Navarrete, que analisa as falhas do sistema democrático contemporâneo; lançamento da obra será na sexta-feira, dia 24 de março, em Goiânia
Cezar Santos
O conservador inglês Winston Churchill definiu a democracia como “a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas”. Conceitualmente, o termo tem origem no antigo grego e é formado a partir dos vocábulos demos (“povo”) e kratós (“poder”, “governo”).
Definir, explicar, entender e, para alguns, até mesmo aceitar, a democracia é uma tarefa ingente. Pois o espanhol-brasileiro José Navarrete mergulhou nesse abismo ao escrever o livro “Os órfãos da Constituição”, que terá lançamento na sexta-feira, dia 24 de março, em Goiânia.
José Navarrete — que vem a ser pai do secretário da Fazenda de Goiás, Fernando Navarrete — fez um alentado estudo impressionista do que deveria ser a democracia plena e efetiva. O texto é rico em informações, com referências a fatos e a grandes pensadores que moldaram e continuam moldando o mundo contemporâneo em muitos aspectos.
O autor lembra que a corrupção é o principal mal que se instalou na maioria das democracias liberais. A corrupção e incompetência de líderes políticos desvirtuam a democracia. E exemplifica com casos em vários países, notadamente nas suas duas pátrias, Espanha e Brasil.
Lá, cabeludos casos de corrupção com os dois maiores partidos, o Popular (PP) e o Socialista Obrero Espanhol (PSOE), e até com a família real. Escândalos que causaram bilhões de pesetas de prejuízo ao erário e favorecerem amigos do poder. Aqui, o Partido dos Trabalhadores (PT), patrocinador de vários escândalos, entre os quais o que muitos classificam de o maior esquema de desvio de dinheiro público do mundo, o chamado Petrolão. Pela incúria do PT, hoje o Brasil está atolado na recessão e com alto índice de desemprego.
O que se viu agora no Brasil “socialista” da era PT, integrantes pobres e de classe média filiados ao partido que ficaram ricos e se aburguesaram durante os três mandatos, aconteceu um pouco antes na Espanha. O autor observa, porém, que a corrupção não é exclusiva dos partidos da esquerda nos regimes democráticos. “Mas é triste que líderes de partidos que defendem aparentemente as causas dos mais desafortunados, dos mais pobres, se dediquem a roubos dos cofres do Estado.”
José Navarrete vai e vem pela história. Seu livro é um estudo de ciência política com base justamente, como não poderia deixar de ser, na história. Faz uma acerba crítica ao capitalismo e ao socialismo; este, por tentar igualar as diferenças naturais entre os seres humanos; aquele, por induzir ao consumismo desenfreado e predatório dos recursos naturais.
Capitalismo e socialismo, enfim, que falharam em dar aos cidadãos o benefício de usufruir a democracia plena: “Há, porém, uma semelhança na massificação em ambos os sistemas, comunismo e liberalismo capitalista. Semelhanças nas suas elites dirigentes, umas no poder por um processo revolucionário e outras por um processo de votação popular que, por si só, não impede que exista uma classe privilegiada de dirigentes favorecidos pelo poder e integrada por políticos e especuladores do sistema capitalista. A crença de que se ‘vive’ a liberdade nas democracias capitalistas, só pelo fato de se poder votar e escolher seus dirigentes e manifestar-se publicamente, nas ruas ou por escrito e nada mais, torna o sistema aleijado na sua essência.”
Aqui, se chega ao ponto fulcral de “Os órfãos da Constituição”: a falha do sistema representativo, o que se configura quando o político eleito não age em benefício da coletividade, ou seja, o representante atua no próprio interesse, e não pelo interesse do representado. José Navarrete propugna um mecanismo aparentemente muito simples para melhorar essa representação, que seria a simples e pura “des-eleição” (o autor optou por usar o hífen) do mau político, uma censura cidadã.
O que José Navarrete denomina “des-eleger” já tem referência como “Recall político”, que significa exatamente o poder de cassar e revogar o mandato de qualquer representante político, pelo eleitorado. O autor vai além, ao propor um sistema de forma mais apurada, usando a moderna tecnologia da informática, que daria ao eleitor a simultaneidade do tempo real ao tomar sua decisão de defenestrar o dirigente corrupto e/ou relapso.
Ele escreve: “Em rigor, o que aconteceria seria a criação de uma nova cultura política. As consequências dessa nova realidade na vida humana são quase inimagináveis. Eleger, sim, mas também ‘des-eleger’, destituir. O voto de des-eleger, que deveria ser um direito tão fundamental como o é eleger, é facílimo de exercer. O cidadão que vota poderia fazer isto, da forma mais pessoal e simples, qualquer dia, em qualquer momento, em qualquer lugar, e com absoluta liberdade. E a democracia, tão doente hoje, teria uma saúde fascinante pela sua capacidade de criar uma nova Era.”
José Navarrete anota: “… é muito pouco provável – se esta proposta de censura estivesse em vigor há bastante tempo – que os Estados Unidos tivessem tido na presidência do país os Bush, pai e filho. Com certeza, não teria havido pela segunda vez a Guerra do Iraque…” O terrorismo, como culto religioso, não existiria. Quiçá os governantes dos países democráticos seriam outros. Em alguns como o Brasil e a Espanha, os seus governantes teriam sido destituídos pelos cidadãos por causa da corrupção e o desemprego”.
O título da publicação se explica pelo fato de que nenhuma Constituição de país democrático dá a seus governantes direito de praticar corrupção e ser incompetente ao ponto de desvirtuar as instituições e arruinar a economia. Nesse sentido, os cidadãos se veem órfãos, desassistidos, espoliados por uma classe dirigente que desrespeita a lei maior do país. Para esses maus governantes, ensina José Navarrete, o remédio é tirá-los do poder, “des-elegêlos”.
O autor
José Navarrete Fernández nasceu em Villacarrillo, na província andaluza de Jaén, Espanha. Formou-se em Magistério da Igreja em Granada, Andaluzia. Ampliou sua formação acadêmica na Faculdade de Filosofia y Letras na Universidade Complutense de Madrí.
Em 1963, a convite do então governador do Estado de Goiás, Mauro Borges Teixeira, mudou-se para o Brasil, onde exerceu a docência por alguns anos. Em 1974 foi coordenador geral do Plano de Governo do Estado de Goiás. Em 1981 retornou à Espanha, instalando-se com a família em Madrí, onde se envolveu ativamente na política, sendo eleito, em 1983, presidente do partido Aliança Popular (hoje PP) no distrito de Moncloa e, mais tarde, membro da Executiva do partido na capital. Em 1990 retornou ao Brasil, onde reside atualmente.
Serviço
l Lançamento: livro “Os órfãos da Constituição”
l Editora: Chiado Editora – Portugal
l Data: 24 de março de 2017, às 20h30
l Local: Associação Goiana do Ministério Público, Rua T-29, 1.758, St. Bueno, Goiânia.