Machine Messiah é tudo, menos um disco do Sepultura
25 janeiro 2017 às 21h36
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Segundo álbum com a mesma formação, 15º registro de estúdio da banda brasileira de metal traz bastante experimentalismo e foge da sonoridade conhecida pelos fãs
Na sexta-feira 13 de janeiro, a gravadora Nuclear Blast lançou o 14º disco de estúdio da banda brasileira de metal Sepultura, terceiro distribuído pelo mesmo selo. Durante a produção do álbum, integrantes da Nuclear Blast chegaram a dizer que esse era o melhor registro feito pelo grupo criado em Belo Horizonte (MG) desde seu início, em 1984.
A declaração pra lá de otimista de executivos da gravadora soa bem exagerada depois de escutar o novo álbum do Sepultura, Machine Messiah (2017), sucessor de The Mediator Between Head and Hands Must Be the Heart (2013) e Kairos (2011), todos lançados pela Nuclear Blast. No Brasil, o disco ainda será lançado em formato físico pela Sony Music na sexta-feira (27/1).
Se contarmos o EP Bestial Devastation (1985), lançado como LP junto com músicas da banda Overdose, Machine Messiah é o 15º registro de estúdio do Sepultura. De 1984 até hoje, muita coisa mudou na banda. Da formação original, apenas o baixista Paulo Júnior permanece no grupo. Mas se considerarmos a formação clássica, ainda está na banda o guitarrista Andreas Kisser, que substituiu Jairo Guedes em 1987.
Na bateria, Igor Cavalera deixou o Sepultura logo depois de gravar o disco Dante XXI em 2006. Seu substituto, Jean Dolabella, hoje é baterista da Ego Kill Talent. Em 2011, ele também saiu do Sepultura. O posto é ocupado desde então por Eloy Casagrande, que tocava na banda Glória. Com Eloy na bateria foram gravados dois álbuns, e um deles é o Machine Messiah.
Passaram pelo vocal da banda Wagner Lamounier (vocal e guitarra), que foi substituído em 1985 pelo já membro-fundador e guitarrista Max Cavalera. Depois foi a vez de Max brigar com o Sepultura e sair em 1997, dando lugar a Derrick Green, que completa 20 anos no conjunto em 2017.
O disco novo
Mas vamos ao que interessa: o disco Machine Messiah. No primeiro instante, a introdução da canção Machine Messiah já indica que tem algo diferente ali no som que o fã do Sepultura está acostumado a escutar. A música começa com uma tendência mais melódica, algo que nunca foi característico da banda. A guitarra chorosa e a busca por um vocal mais cadenciado de Derrick evidenciam algo positivo no grupo em seus 33 anos de história: a tendência a sempre experimentar novos caminhos.
Só que a impressão que fica pela primeira faixa é a de que não se trata de um disco do Sepultura, mas sim de qualquer outro grupo de metal melódico. A canção é boa, porém começa a ficar arrastada no meio dos seus 5 minutos e 55 segundos.
E de cara a explicação para um som mais melódico e progressivo seria o nome do produtor do disco. Jens Bogren já trabalhou com bandas como Angra, Opeth, o vocalista James LaBrie, do Dream Theater, Moonspell e Kreator. Nenhuma dos grupos, apesar de serem todos de metal, tem qualquer coisa a ver com a sonoridade do Sepultura em nenhum de seus 13 discos anteriores.
O tal Machine Messiah, ou Deus ex-Machina, como se chama a arte da capa, da filipina Camille Della Rosa, é uma crítica a um mundo do endeusamento das máquinas. “O conceito de que uma Máquina de Deus criou a humanidade e agora parece que este ciclo está se encerrando, retornando ao ponto de partida. Nós viemos das máquinas e estamos voltando para onde viemos. O ‘Messiah’, quando ele retornar, será um robô, ou um humanoide, nosso salvador biomecânico”, diz o guitarrista Andreas em publicação da banda.
Passada a primeira faixa, o disco encontra uma veia mais Sepultura na boa I Am The Enemy. Característica da banda com Derrick Green nos vocais, o flerte com a rapidez do hardcore aparece pela primeira vez no disco. Começa a ficar evidente o grande espaço dedicado no álbum aos solos estridentes de Andreas nas músicas gravadas em Örebro, na Suécia, no Fascination Street Studios. São 2 minutos e 28 segundos de porrada certeira.
Phantom Self, que ganhou um pesado videoclipe com críticas ao aprisionamento à vida virtual, tem o peso e a agressividade que casam muito bem com o vocal rasgado de Derrick. Eloy e Andreas se entendem bem na melodia da terceira faixa de Machine Messiah.
É quando aparecem os violinos no meio do solo de guitarra, ideia do produtor Jens Bogren, em 5 minutos e 30 segundos nada cansativos de música. “Transformed I’m someone else/Must face my phantom self (Transformado, eu sou outra pessoa/Devo enfrentar meu próprio fantasma).” Talvez a introdução, com percussão e violinos, pudesse ter sido descartada. Não faz muita diferença.
Quando o disco chega em Alethea, quarta música de Machine Messiah, a impressão é a de que cada instrumento segue para um lado, sem se encontrar, assim como o vocal, que caminha em direção quase que independente, apesar de ser a parte que mais lembre o Sepultura como Sepultura. São 4 minutos e 32 segundos cansativos.
A faixa seguinte, inteiramente instrumental em seus 4 minutos e 42 segundos, começa bem. O primeiro minuto de Iceberg Dances é agressivo, os solos de Andreas se comunicam bem com a bateria de Eloy. A partir dos 50 segundos, a rapidez ganha tom interessante. Mas há uma experimentação melódica chata e entediante no meio do segundo minuto que dá até sono.
Quando a música volta a sequências mais rápidas, o Sepultura volta a existir na faixa. Mas são 4 minutos e 42 segundos. Você precisa de gostar de sons instrumentais para chegar até o final. E vale a pena, porque aos 3 minutos e 6 segundos entra o poderoso violão clássico de Andreas e muita técnica na guitarra em seguida. O final tem espaço até para um interessante solo de bateria. E olha que eu costumo achar solo uma grande encheção de linguiça!
Nova sonoridade
Sworn Oath, sexta música do Machine Messiah, deixa bem claro o lado novo de um Sepultura que ninguém conhecia até então. Com 6 minutos e 9 segundos, a faixa se dá ao luxo de ter uma sombria introdução de 1 minuto e 2 segundos. Apesar de diferente, quando o vocal de Derrick entra, o Sepultura mostra força, mesmo quando o refrão parece ter algo de mais melódico no metal, apesar de sua letra agressiva. Por mais estranha que pareça ao se comparar com toda a carreira da banda, é uma canção que deu certo.
Em seguida vem Resistant Parasites, que lembra outras coisas que o Sepultura já fez com Derrick Green na banda. São 4 minutos e 58 minutos que começam bem, tem uma boa dose de peso, mas que parecem ser muito ao ponto de ter faltado inspiração. Era um faixa que não precisava mais do que 2 minutos para dizer a que veio.
Silent Violence não tem nada de silenciosa. Com seus 3 minutos e 46 segundos de porrada, que aposta bastante no poder percussivo da bateria de Eloy e em solos que, vamos falar a verdade, enchem o saco. De positivo, as partes mais agressivas de Silent Violence valem metade do tempo. As quebradas na melodia não compensam a outra parte.
Resgate musical
Vandals Nest, ao contrário de quase todo o disco, com exceção de I Am The Enemy, dialoga com aquela fase que é lembrada com glória pelos fãs antigos da banda, até o disco Arise (1991), mostra o lado rápido de Derrick em seu melhor estilo no Sepultura, além de ousar sem fugir do estilo característico do grupo. Vale os acertados 2 minutos e 48 segundos.
A despedida vem com 5 minutos e 22 segundos em Cyber God. O vocal inicial de Derrick na canção dialoga com a faixa Machine Messiah. Em seguida vem a pancadaria de uma voz rasgada e um bom final para o disco.
Não entra para a minha lista de melhores discos do Sepultura, mas também não é um álbum ruim. Fica evidente uma mudança de sonoridade, parte dela muito longe do que a banda havia feito até o registro anterior, de 2013, e com clara influência do produtor, mais habituado a trabalhar com bandas de metal melódico e progressivo. Resta saber se será a tendência, com experimentações que darão uma nova cara, mais melódica e progressiva, ao Sepultura nos próximos discos, ou se é apenas uma gravação diferente de tudo que já se ouviu do grupo e para por aí.