Carlos Willian Leite

Vigésimo segundo (22º) livro lido em 2024: “Limonov” (Alfaguara, 344 páginas, tradução de André Telles), de Emmanuel Carrère.

O escritor francês Emmanuel Carrère, aclamado por seu romance “Ioga”, revela a figura de Eduard Limonov, cuja essência se desvia de forma notável do convencional, tanto na realidade tangível quanto em sua representação no universo literário.

Eduard Veniaminovich Limonov transcende a figura típica de um protagonista, com uma vida marcada por episódios tão intensos e variados que parecem ultrapassar a ficção.

Em uma abordagem que mescla jornalismo literário e investigativo, Carrère desdobra a existência de Limonov, destacando que, enquanto vivo, sua história continuava sendo escrita, prometendo novos capítulos mesmo após sua morte em 2020, aos 77 anos.

O discernimento entre o real, as percepções pessoais do escritor e a pura ficção é deixado à apreciação do leitor. Carrère retrata Limonov, que se autodenominava um provocador inato, com uma vivacidade que nos transporta pelas diversas fases de sua vida: das ruas de Moscou aos cafés de Paris, das avenidas de Nova York às incertezas na Ucrânia.

“Assombroso, inclassificável e comovente”

Mais do que relatar eventos, Carrère insere o leitor nas transformações sociais e políticas pelas quais Limonov passou, como se fosse uma espécie de guia em um mundo em constante mudança e transformação.

Sua vida reflete, além das inquietações humanas, os dilemas e a complexidade da Rússia sob Putin, em um período marcado por silenciamentos e desafios éticos. A obra de Carrère, que oscila entre a admiração e a crítica, não apenas disseca a personalidade de Limonov — como um dos homens mais intrigantes da segunda metade do século 20 — mas também oferece uma perspectiva aguçada sobre uma era tão marcante quanto estranha.

O relato é um tributo, assumidamente iconoclasta, a um homem cuja trajetória é tão envolvente quanto os tempos históricos em que esteve imerso, sugerindo que a influência de Limonov persistirá além de sua existência física. A capa da edição brasileira do livro traz uma frase do “Le Monde” que captura perfeitamente o espírito do romance: “Assombroso, inclassificável e comovente”.

Nota: 9

Carlos Willian Leite, editor da “Revista Bula”, é poeta, jornalista e crítico literário.