Ensaísta “insere” o poema O Corvo, de Poe, num encontro de Lula com o Papa
25 abril 2021 às 00h00
COMPARTILHAR
Autor sugere que somos pó e ao pó voltaremos, que são passageiras as glórias, que devemos amar-nos uns aos outros e que podemos corrigir os costumes sorrindo
Lembrei-me, ao ler essas páginas¹ que o leitor vai agora percorrer, de um aforismo — “Se a mocidade soubesse; se a velhice pudesse” — enunciado, há 500 anos, pelo francês Henri Estienne (1531-1598), e que encontra plena equivalência nos versos do compositor gaúcho Lupicínio Rodrigues (1914-1974), citados por Jorge Wilson Simeira Jacob, no livro “As Minhas Reflexões” (268 páginas): “Esses moços, pobres moços/Ah! Se soubessem o que sei/Não amavam, não passavam/Aquilo que já passei”.
As reflexões de Jorge Jacob, se lidas e aproveitadas, seriam de grande valia para a juventude brasileira. Infelizmente, como sabemos, não é isso o que acontece. O ímpeto juvenil dispensa o conhecimento longamente adquirido e julga ser a energia da idade o único combustível a mover a existência, enquanto, sabemos os mais velhos, a experiência, se bem usada, poupa trabalho e economiza fracassos. Mas nem por isso os idosos devem se omitir.
Jorge Jacob tem muito a dizer, e o faz, em seus conceitos expressos neste livro. Afinal, em suas mais de oito décadas bem vividas, acumulou uma bagagem expressiva, como comerciante, industrial, banqueiro e líder empresarial-classista (foi fundador e primeiro presidente da Associação Brasileira de Bancos Comerciais, ABBC, em 1983). Tudo isso em nível nacional. E, principalmente, tem muito a dizer como exemplar chefe de família. Conheço-o desde a década de 1980, e mesmo no mais aceso de seu comprometimento sempre correto e competente com suas empresas, jamais se desligou das vicissitudes nacionais e de nossas deficiências sociais e sempre separou parte do seu tempo para procurar ajudar a mitigá-las. Por isso mesmo, sempre colaborou com o Instituto Liberal, esse importante think tank brasileiro, que presidiu, por vários períodos. Foi fundador, em 1983, e o primeiro presidente da Associação Brasileira de Dislexia (ABD). Esse, meu testemunho pessoal, que espero, possa adicionar uma centelha de interesse nas afirmações do autor.
Não é este livro a primeira aventura literária de Jorge Jacob. Ele traduziu, do italiano, “Fosca”, de Iginio Ugo Tarchetti (1839-1869), um romance de 1861, tão intrigante que foi adaptado para o cinema, em 1981, pelo diretor Ettore Scola, e para a Broadway em 1994, por Stephen Sondheim. Tradução e adaptações primorosas, diga-se.
Um prefácio não é uma resenha, e por isso devo refrear meu desejo de comentar vários capítulos do livro que o leitor vai contemplar. Mas abordo alguns pontos, que sobremaneira atraíram minha atenção. Amostras do que o leitor encontrará a seguir.
Quando Jorge Jacob se pergunta se existe Papai Noel, e responde pela afirmativa, pois como homem de boa vontade tem o espírito natalino em seu interior, o faz com atenção ao preceito bíblico de “não fazeres aos outros o que não queres que te façam”, preceito que vale por si só todo um tratado de filosofia. Um ensinamento que faz bem e que faz falta aos homens. Que todos deveríamos recitar em silêncio várias vezes ao dia.
Quando afirma “Isto é ser pai!” dá o exemplo de Atenas e Esparta, um alerta de que a cultura do espírito é indispensável, mas nem por isso pode-se deixar de fortalecer a saúde do corpo e da vontade. Um recado velado para os jovens que se mantêm indefinidamente sob a tutela dos pais e para os pais que aquiescem, se esquecendo que não somos eternos e que é bíblico também o mandamento de “ganharás o pão com o suor de teu rosto”.
Outro capítulo é um pertinente comentário sobre o livro “A Revolta de Atlas” (Editora Arqueiro, 1216 páginas, tradução de Paulo Henriques Britto), de Ayn Rand, um convite à sua leitura. Para quem não conhece, esse romance filosófico se tornou um dos livros mais lidos nos Estados Unidos no século passado e foi traduzido para três dezenas de línguas. E é impossível não identificar no Brasil a distopia de Rand.
Mas nem tudo é sisudez nas páginas do livro. Também se pode ensinar com verve, como é mostrado no capítulo “Never More”, no qual o autor, com humor britânico, imagina um diálogo entre o ex-presidente Lula da Silva e o Papa, e ainda transmuta o corvo do poema de Edgar Allan Poe numa pomba pacifista mas pessimista.
E como se vê na metáfora do autor, usando o comunismo no capítulo “O Belo Antonio”. O filme (baseado no romance o italiano Vitaliano Brancati, traduzido por Renata Lucia Bottini para a Editora Berlendis & Vertecchia), do diretor Mauro Bolognini, com roteiro do célebre Pier Paolo Pasolini, com o também famoso ator Marcello Mastroianni, foi um dos clássicos da nossa geração (de Jorge Jacob e minha). Conta o drama de um adônis italiano, belo e impotente. Ao compará-lo ao comunismo, o autor faz um paralelo veraz: o marxismo, em sua história, deitou-se com uma quarentena de nações, prometendo fecundá-las. Excitou a todas, a nenhuma satisfez e a prometida fecundidade revelou-se somente sofrimento. Em resumo, neste livro o autor à sua maneira nos lembra que somos pó e ao pó voltaremos, que são passageiras as glórias do mundo, que devemos amar-nos uns aos outros e que podemos corrigir os costumes sorrindo. Além de outras coisas. Aproveitem. Carpe diem.
Nota
¹ O texto acima é o prefácio do livro, publicado pelo Jornal Opção com autorização de seu autor, Irapuan Costa Junior.