Longa de guerra é marcado por plano-sequência e ostenta efeitos visuais, mas enredo é raso

Cena de 1917, filme de Sam Mendes / Foto: Reprodução © Universal Pictures

A megaprodução “1917” é a segunda de guerra dirigida por Sam Mendes, depois de Soldado Anônimo, de 2005. Inspirado pela história de seu avô, que lutou na Primeira Guerra Mundial e, de fato, recebeu a missão de entregar uma mensagem, o realizador delineia a jornada de dois soldados, Blake e Schofield, interpretados por Dean-Charles Chapman e George MacKay, incumbidos pelo general Erinmore a entregar uma carta ao coronel Mackenzie, na linha de frente da batalha.

A história se ambienta em 6 de abril de 1917, onde tropas inglesas lutavam em território francês. O enredo é muito similar ao do premiado “Resgate do Soldado Ryan”, que deu a Steven Spielberg a estatueta do Oscar de melhor direção, dentre outras quatro que enalteceram o longa-metragem. Assim como no filme de Spielberg, os heróis de Sam Mendes pretendem atravessar o inferno na Terra para encontrar o irmão de Blake nas trincheiras depois de Scout, onde outros 1.600 homens ingleses foram atraídos para uma armadilha alemã. A missão é impedir o ataque britânico já planejado pelos inimigos e evitar a morte massiva do pelotão.

Tecnicamente, Sam Mendes orquestrou para obter um visual perfeito do campo de batalha, com mais de um quilômetro e meio de trincheiras cavadas, enormes crateras de água, obstáculos de arame farpado e uma cidade cenográfica completamente em ruínas. Ainda, para criar a luz igreja em chamas, a equipe de produção utilizou cerca de 2 megawatts com duas mil lâmpadas de tungstênio. Nas cores, enquanto as trincheiras e os soldados são retratados em cores frias, para retratar a própria frieza da guerra com seus homens largados à própria sorte, Mendes quebra a paleta ao derramar na tela os vermelhos quentes de fogos, erupções e explosões infernais.

O mojo do filme foi ter sido gravado em plano-sequência, que dá a sensação de que não há cortes nas gravações, ou talvez, pouquíssimos cortes. No entanto, eles estão lá, seja na poeira que embaça as vistas, seja no percurso escurecido pela cidade bombardeada, seja se desviando de objetos. A cena mais longa foi de oito minutos e meio, enquanto a mais curta durou apenas 39 segundos. Para obter a montagem perfeita, as cenas foram repetidas dezenas de vezes, em uma média de 20 vezes por cena.

A câmera em modo travelling dá a sensação de se estar em uma partida de Battlefield. O espectador fica ali respirando na nuca das personagens, enquanto estes seguem seu perigoso percurso pelo labirinto da morte. E, se “1917” merece louros pela coreografia das cenas, o realismo das carcaças de cavalos, os defuntos apodrecidos no caminho, os cenários perfeitamente montados e os efeitos especiais impecáveis, em contraposição, é essa mesma qualidade que torna tudo mecanicista, robótico e sem emoção.

Embora Chapman e Mackay tenham sido a combinação que se completa, sendo o primeiro um jovem com rosto afável, atitudes ingênuas e diálogos delirantes, o segundo tem a expressão rigorosa, é realista e desesperançoso, já experiente da Batalha do Somme, essa engenharia no qual o filme se preoucupou tanto em mostrar atrapalhou a fluidez. Novamente, o longa se parece com um joguinho de ultrapassar obstáculos. Talvez a cena que mais sensibiliza o espectador, é segundos antes de chegar aos 2º Devons, depois de atravessar um riacho de cadáveres, a personagem de Mackay desaba em lágrimas. Mas foi tão rápido, que logo nos esquecemos.

Enquanto o protagonismo está nas mãos dos jovens, que vimos por poucas vezes nas telas – Chapman como Tomlin de “Game of Thrones” e Mackay em “Capitão Fantástico” e “Minha Nova Vida” – os papéis secundários foram dados a nomes extravagantes do cinema, como Colin Firth (general Enmore), Bennedict Cumberbatch (coronel Mackenzie) e Mark Strong (capitão Smith). Hollywood idolatra um bom filme de guerra e, se talvez o heroi fosse norte-americano, poderia até ter sido melhor prestigiado no Oscar. Mesmo assim, o filme não foi esquecido pela academia, angariando três estatuetas por prêmios técnicos, o que foi justo: melhor fotografia, melhor mixagem de som e melhores efeitos visuais.