E para comandar a festa ninguém menos importante do que o “maestro” Jorge Ben Jor, que botou 6,5 mil pessoas para dançar e cantar em aproximadamente duas horas de show

O maestro Jorge Ben Jor fez um show impecável, mesmo com problemas na guitarra em toda a apresentação | Foto: Bruna Aidar
Jorge Ben Jor fez um show impecável, mesmo com problemas na guitarra em toda a apresentação | Foto: Bruna Aidar

Já era pouco mais de 1 hora de sábado (14/5) quando os primeiros versos de Jorge da Capadócia transformaram a Esplanada JK do Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON) em uma contagiante pista de dança. Antes disso, a 18ª edição do Festival Bananada passou por dez lugares diferentes da cidade entre segunda (9) e sexta-feira (13).

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De casas noturnas e pubs (El Club, Diablo, República, Complexo, Bolshoi), bares (Shiva), teatros (Sesi e Sesc) e até shopping (Passeio das Águas), a programação durante a semana trouxe muitas e boas atrações. Infelizmente, com eventos raros ocorridos nesses dias, como a vinda da então presidente Dilma Rousseff (PT) a Goiânia e três dias depois o seu afastamento pelo Senado, consegui acompanhar pouco dos eventos antes do Oscar Niemeyer.

Mesmo assim deu tempo de conferir de perto os sets dos DJs Maurício Fleury e Milian G. na madrugada de terça (10), que não deixaram a pista desanimar um segundo, os excelentes shows da Cuscobayo (RS) e Catavento (RS) no showcase da Honey Bomb, uma ótima apresentação instrumental do baterista Fred Valle e convidados e shows fora do final de semana do Mahmed, que é uma das melhores bandas da programação, e o Supercordas, que sofreu com alguns problemas de som, mas mandou muito bem, em noite da Balaclava.

Não poderia ser diferente, a sexta-feira, até agora, foi o dia mais esperado do festival. Tanto é que 6,5 mil pessoas passaram pelo Oscar Niemeyer até o final do show do carioca Jorge Ben Jor, já perto das 3 horas de sábado.

No CCON

Foi-se há muito o tempo em que o Bananada era um festival pequeno ou se limitava ao público dos shows independentes. A dimensão e organização é outra pelo menos nas últimas três edições. E isso é fácil de notar, se você for hoje, domingo (15) ou esteve no Oscar Niemeyer na sexta: propagandas e espaços de patrocinadores e parceiros espalhados pela estrutura destinada ao público.

O lado bom disso é que a pessoa sai de casa para ver o show do Jorge Ben Jor, por exemplo, e acaba conhecendo o Bike, Supercordas e a fantástica Juçara Marçal. Se a animação for muita e chegar cedo, ainda é possível ver atrações mais novas e muito boas como Sara Não Tem Nome e My Magical Glowing Lens em um palco menor chamado Casa do Mancha, lá no fundo de tudo.

O espaço pode virar fundo de foto para postar nas redes sociais com o mural do Blackbook todo em lambe-lambe embaixo da parede onde estava no ano passado o painel do Bicicleta Sem Freio, que é a identidade visual do festival em 2016, inclusive com projeção na mesma parede. E se você quiser fazer uma tatuagem, o Bananada é lugar para isso também.

Achou o show chato, vai dar uma volta e acompanhar a competição na pista de skate do Goiânia Crew Attack organizado pela Ambiente Skate Shop.

Shows

Julito Cavalcante comando o Bike e sua viagem psicodélica no Bananada | Foto: Bruna Aidar
Julito Cavalcante comando o Bike e sua viagem psicodélica no Bananada | Foto: Bruna Aidar

A psicodelia do Bike (SP), liderada por Julito Cavalcante, foi a primeira a tocar em um dos palcos principais. A banda já tinha passado pelo Bananada em 2015, mas num show bem mais improvisado e intimista do que nesse ano, quando eles se apresentaram no Palco Construtora, da estrutura principal do festival. Se você perdeu o show, vale a pena dar uma chance para o disco 1943, o ano em que Albert Hofmann descobriu o LSD.

Antes teve o show, no Palco Casa do Mancha, menor e bem mais intimista, da mineira Sara Braga, que se apresenta como Sara Não Tem Nome. Seu disco, Ômega III, a colocou, ao menos para mim, como uma das artistas mais interessantes do festival. Pena que eu perdi o show porque não consegui chegar cedo.

Com o som bem mais limpo do que na apresentação de quinta-feira na Diablo Pub, o Supercordas, banda que se divide entre Rio de Janeiro, Paraty (RJ) e São Paulo, fez um bom show que faz parte da turnê do álbum Terceira Terra.

O israelense Yonatan Gat preferiu tocar no meio do público e trocou o Palco Construtora pelo espaço da plateia em seu show | Foto: Bruna Aidar
O israelense Yonatan Gat preferiu tocar no meio do público e trocou o Palco Construtora pelo espaço da plateia em seu show | Foto: Bruna Aidar

Talvez tenha sido o show mais interessante da sexta pelo fator inusitado o que veio em seguida. Um trio de rock’n’roll sem frescuras, muito barulho e contato direto com o público. Esse é um resumo tosco e fiel do que foi a participação do Yonatan Gat e sua banda no Bananada. O último disco, Director, saiu em setembro de 2015.

Ao invés de usarem a estrutura do Palco Construtora, os três músicos (guitarra, baixo e bateria) usaram um mini-palco no meio do público, sem qualquer isolamento entre os músicos e a plateia, que ficou em volta da banda. O israelense Yonatan Gat canta na sua língua mãe e mostrou toda sua energia, acompanhado de um baterista frenético e ligado no 220. Um dos melhores shows da noite.

Yonatan foi seguido pelo show saudosista e encantador do Frank Jorge, vocalista e baixista da Graforreia Xilarmônica (RS). No repertório, não poderiam faltar canções dele que foram regravadas por outras bandas, como o Pato Fu em Eu e Nunca Diga, além do clássico Amigo Punk. Alguns covers, entre eles The Beatles e The Beach Boys. Não deixou a peteca cair depois da boa apresentação do israelense.

E a noite continuou em alta quando Frank Jorge, do Palco Skol, passou a bola para a fluminense de Duque de Caxias Juçara Marçal. Mestre de cerimônia oficial do Bananada desde 2015 e participante ativo da cena independente brasileira há algumas décadas, Carlos Miranda anunciou a cantora como uma das coisas que ele mais gosta na música e tinha o prazer de anunciar o show.

Juçara Marçal encantou o público com sua bela voz na sexta-feira 13 que ela considerou de "tempos tenebrosos" | Foto: Bruna Aidar
Juçara Marçal encantou o público com sua bela voz na sexta-feira 13 que ela considerou de “tempos tenebrosos” | Foto: Bruna Aidar

Com seu Encarnado, Juçara foi obrigada a encurtar a apresentação na metade ao descobrir que o tempo tinha acabado. Apesar de ser um show que encaixaria melhor no teatro, a sintonia leve de poesia carregada e emoção traduzida em uma voz encantadora não deixou o público desanimar. Aliás, como sentir tédio ou desinteresse quando se tem uma diva em canto como Juçara no palco?

O time ao lado dela não deixava barato para todo o talento da cantora. Kiko Dinucci, Roberto Campos e Thomas Rohrer. Não preciso falar mais nada. Se você perdeu, azar o seu! E era sexta-feira 13 de “tempos tenebrosos”, como bem lembrou Juçara Marçal. “Sigamos na luta”, porque o momento é de resistência. Foi que disse a cantora ao final de sua apresentação.

Carnaval de Recife (ou Olinda, se preferir)

Juçara deu lugar a Siba. Sérgio Roberto Veloso de Oliveira é um dos recifenses mais talentosos. Que injustiça! É um dos brasileiros mais talentosos do mundo. Com sua poesia de cordel, sua música tradicional, folclórica e popular que mistura samba, maracatu, rock, ciranda e muita coisa nesse meio, Siba, aos poucos, fez todo mundo dançar.

Ele já foi do Mestre Ambrósio, já cantou com a Fuloresta, Barachinha, Roberto Corrêa e agora é só Siba e sua banda, que transformam o lugar em que passam em um grande carnaval de improviso e corpo solto sem qualquer vergonha ou formalidade. Não viu o show? Ouça o disco De Baile Solto. Se só Siba fosse bom no palco tudo bem, mas a banda é de uma qualidade inexplicável, principalmente as guitarras.

Siba deu o recado: “Eu não sei pra vocês/Pra mim não falta nada/E no final do meu show/Sempre tem é que sambar“. E nesses versos improvisados ele seguiu na parte final da apresentação: “Vamos ver se alguém gostou/Do meu versinho pesado/Mas no fim da brincadeira/Vai ter verso improvisado“.

Siba transformou a Esplanada JK do CCON no carnaval de Recife | Foto: Bruna Aidar
Siba transformou a Esplanada JK do CCON no carnaval de Recife | Foto: Bruna Aidar

Até com o nome do festival ele brincou, ao cantar que comeu toda a banana e jogou a casca fora, antes de dizer “eu só vou parar o show se alguém mandar parar”. O verso veio acompanhado de um aviso de que o tempo estava acabando. “Só eu precisei falar/E alguém falou ‘termina’.” Ele prometeu voltar, em música, e disse que vai “cumprir a sina” de tocar em Goiânia de novo para “outra vez que voltar” fazer mais um carnaval.

Santo de casa faz milagre

Para quem achou que a empolgação seria contida assim que o show do Siba acabou, veio o Carne Doce e mostrou que isso não aconteceria na sexta-feira. Com toda simpatia e controle do palco da vocalista Salma Jô, a banda goiana mesclou músicas do primeiro disco com as do que deve gravar em junho em São Paulo. Até o funk Tá Tranquilo, Tá Favorável, do MC Bin Laden, foi improvisado na abertura de Passivo.

Em momento de defesa de causa, Salma disse que a mãe estava na plateia e que a próxima música, Basta Eu Não Querer, apesar de a mãe ser contra a legalização do aborto, quando ouviu a canção e viu a letra entendeu a posição da filha, que defende a liberdade da mulher sobre seu próprio corpo e o direito de escolha sobre ter um filho ou não: “Não vai nascer/Porque eu não quero/Porque eu não quero e basta eu não querer“.

Quando o show começou, o som do microfone não estava aberto e o público não ouviu a voz da vocalista quase que por toda a primeira música. Ela brincou que queria mais cinco minutos ao final da apresentação para descontar a falha técnica.

Ava Rocha e Salma Jô cantam Hermética durante show do Carne Doce | Foto: Bruna Aidar
Ava Rocha e Salma Jô cantam Hermética durante show do Carne Doce | Foto: Bruna Aidar

A participação da cantora carioca Ava Rocha, que é lembrada por quem não conhece a carreira dela como filha do Glauber Rocha, foi sensacional. Ela continuou o justo discurso de empoderamento feminino ao cantar Auto das Bacantes no show do Carne Doce: “Mate você
Mesmo/Coma do seu morto/Desalinhe o corpo/Fique louco/Tome espaço do Estado, da polícia, da NSA/Da mulher maravilha/E meta um grelo na geopolítica“.

E antes de cantar, junto com Salma, a canção Hermética, também mandou o seu recado. “As mulheres ocupando os seus espaços. As mulheres não deixando de ocupar os seus espaços. A gente não pode deixar.” Se quiser conhecer Ava Rocha, a sugestão é o disco Ava Patrya Yndia Yracema.

Na última música do show, como acontece às vezes, Danilo Pimentel, o Moranguinho, subiu na estrutura metálica do palco para dançar. Ele já fez isso em alguns shows. Mas dessa vez os seguranças tentaram tirá-lo.

Foi aí que ele escapou da segurança escalando o palco e ficou pendurado no alto. Parte do público ficou assustada e outra aplaudiu quando ele conseguiu escapar dos seguranças. Assim que desceu, foi abraçado pela vocalista do Carne Doce, que falou ao microfone: “Esse é o Moranguinho, amigo nosso”.

“Maestro” Jorge Ben Jor

“O maior de todos.” E quem disse isso foi Carlos Miranda ao anunciar o carioca de 71 anos Jorge Duílio Lima Meneses, conhecido como Babulina e Zé Pretinho, mas famoso por ser o Jorge Ben Jor.

E ele justificou toda essa fama e as 6,5 mil pessoas que foram ao Bananada para vê-lo e ouvi-lo cantar e tocar guitarra. A primeira música, mais do que arrebatadora, foi Jorge da Capadócia. Daí em diante foi hit seguido de hit em cerca de duas horas de show, com encerramento nas canções Gostosa e Salve Simpatia com o palco tomado por mulheres da plateia.

Público ficou até o final, por mais que isso fosse às 3 horas de sábado | Foto: Bruna Aidar
Público ficou até o final, por mais que isso fosse às 3 horas de sábado | Foto: Bruna Aidar

Fio Maravilha, País Tropical, Zumbi, W/Brasil (Chama o Síndico), Umbabarauma, Os Alquimistas Estão Chegando, Take It Easy My Brother CharlesTaj Mahal. Só deu hit nesse show. E o público agradeceu bastante. Até homenagem a Tim Maia com Do Leme ao Pontal teve.

A energia era tão contagiante que pouca gente percebeu, ali perto do palco, que o Jorge Ben Jor estava bem incomodado com os problemas que a guitarra e o amplificador deram durante todo o show. Ele passou grande parte da apresentação sem tocar uma nota porque uma hora era o cabo que dava problema, na outra o amplificador não funcionava.

Deu até dó do roadie, que tinha que entrar no palco toda hora para tentar achar um jeito de resolver o problema, que continuou a acontecer. Até que uma hora o Jorge Ben Jor apelou e chutou o amplificador, quando resolveu desistir de vez da guitarra.

Mas nem fez falta, porque o baixista Eduardo Magalhães Carvalho, o Dadi Carvalho, e o baterista Lucas Real, da talentosíssima Banda do Zé Pretinho, seguraram com enorme sintonia o show inteiro na falta da guitarra. Dadi tem no currículo dele bandas e artistas inexpressivos como Novos Baianos, A Cor do Som, Barão Vermelho, Tribalistas, Caetano Veloso e Mick Jagger, aquele cara desconhecido dos Rolling Stones, sabe? Pois é!

No final, parte das mulheres que estavam no palco puxaram um tímido coro “não vai ter golpe”. Mas o seguinte contagiou também parte da plateia, que foi ouvido com mais força: “Fora Temer”.

Como bem disse Jorge Ben Jor ao abrir o show com Jorge da Capadócia: “E eu estou feliz porque eu também sou da sua companhia“.

Tem mais

O Bananada continua neste sábado com Kastelijns, Vitreaux, Ventre, Martin, Mahmed, Riviera Gaz, Matias Cena, Felipe Cordeiro, Killing Chainsaw, Silva, Liniker, Omulu e uma apresentação conjunta de Renato Cohen, Mau Mau e Anderson Noise. Até daqui a pouco.

Veja fotos da sexta-feira do Bananada no Centro Cultural Oscar Niemeyer: