A nova classe premium nos toaletes dos aviões
28 novembro 2025 às 20h27

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Ycarim Melgaço
Professor e escritor, autor de “História das Viagens e do Turismo” (entre outros). Instagram: @ycarim
A LATAM realmente se superou e inventou um novo nível de separação social: o banheiro vip. Até outro dia, o que separava a gente no voo era só o tamanho da poltrona, a comida ou a simpatia do comissário. Agora, existe uma linha imaginária no corredor decidindo quem tem “direito ao alívio” e quem precisa esperar a vez lá no fundão.
Pense no avião como um minipaís com fronteiras bem rígidas. Lá na frente fica a terra prometida, com assentos largos, silêncio e bebida em copo de vidro. No meio, aquele limbo onde você paga uma taxa extra para sofrer um pouco menos. E lá atrás, a famosa classe econômica, que hoje em dia é só aperto, joelho esmagado e aquela guerra silenciosa pelo apoio de braço.
É ali no fundo desse ônibus com asas que a gente tem a ilusão de que somos todos iguais no perrengue. Mas nem a biologia escapou. Agora, até a bexiga tem classe tarifária. O passageiro da fileira 25 levanta, inocente, indo para o banheiro da frente que é o mais lógico e, perto, e descobre no meio do caminho que a necessidade dele não tem o ticket adequado.
A cena chega a ser cômica. O comissário levanta o braço com a naturalidade de quem barra penetra em festa vip. Nada pessoal, entende? É só que o seu assento não dá direito a essa descarga. No avião de hoje, tem banheiro para quem paga mais e banheiro para quem já aprendeu a ficar no fundo da fila e do avião desde sempre.
As explicações da empresa são bonitas, falam em “melhorar a experiência” e “organizar fluxo”. Traduzindo para a vida real: quem paga caro não quer dividir a pia, o sabonete e o chão molhado com o resto da humanidade compactada lá atrás.
Não que a desigualdade seja novidade nos ares. Sempre teve fila preferencial e tratamento diferenciado. A diferença é a sinceridade brutal disso tudo. A empresa parou de fingir. Esse pedaço é seu, aquele não. Esse banheiro você usa, aquele ali jamais.
E, no entanto, tem um detalhe irônico nisso tudo. Durante o voo, a gente divide o mesmo céu e a mesma turbulência. Na hora que o avião sacode, ninguém pergunta se o oxigênio é premium ou econômico, o medo é igual. Mas passou o susto, volta a ordem natural das coisas: cada um no seu quadrado, cada um no seu banheiro.
Lá atrás, alguém tenta cochilar todo torto, com o joelho no encosto da frente. Lá na frente, alguém pede um café e levanta sem pressa para usar o banheiro exclusivo. E assim o voo segue, fiel àquela lógica que nunca muda: até para apertar o botão da descarga, você precisa ter a classe certa.
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