O romance “A Intuicionista” relata a história de Lila Mae Watson, uma mulher cuja competência incomoda o mundo masculino novaiorquino

Mariza Santana

Em 1852, o norte-americano Elisha Otis resolveu o problema da segurança dos elevadores, tornando possível o surgimento dos arranha-céus que se espalhavam por todas as grandes cidades; e fizeram de Nova York uma metrópole, com suas muitas construções verticais. O empresário apresentou um equipamento com um design que tinha um “freio” de segurança. Por isso, Otis é conhecido como o inventor do elevador moderno.

Nessa mesma época, em meados do século 19, diante do crescimento do uso de elevadores verticais nos prédios nova-iorquinos, a prefeitura dispunha de uma unidade especializada na fiscalização desses equipamentos: o Departamento de Inspetores de Elevadores. Mais do que apenas uma unidade da burocracia municipal, o Departamento reunia servidores orgulhosos do exercício de sua função, considerada vital para garantir a segurança das pessoas que utilizavam diariamente elevadores na cidade.

O romance “A Intuicionista”, do escritor norte-americano Colson Whitehead, conta a luta de Lila Mae Watson, a primeira mulher negra a integrar o Departamento de Inspetores de Elevadores. A equipe era dividida em duas categorias: os empiristas e os intuicionistas. Lila Mae, oriunda do Sul dos Estados Unidos, conseguiu, com muito esforço, se formar no Instituto Técnico da área. Intuicionista de formação, ela é a inspetora que possui o maior grau de precisão de toda a equipe no trabalho de prever possíveis falhas técnicas nesses equipamentos.

Entretanto, ocorre um acidente com o elevador de número 11 do Edifício Memorial Fanny Briggs (ironicamente, a construção recebeu o nome de uma menina negra assassinada por um policial). Os equipamentos do prédio recém-construído haviam passado pela inspeção de Lila Mae, fato que lhe causa sérios problemas. E leva sua vida, até então discreta, ao caos.

Entretanto, é ano de eleição na Associação dos Elevadores, e o vencedor do pleito costuma ser o indicado para o cargo de diretor do Departamento de Inspetores. O acidente passa a ser utilizado politicamente para culpar os intuicionistas e colocar os empiristas em vantagem na campanha eleitoral, envolvendo Lila Mae em uma rede de intrigas que ela jamais imaginaria que um dia iria enfrentar.

Se você não entende nada das questões técnicas relacionadas aos elevadores, prepare-se para as citações relacionadas ao assunto que o escritor cita ao longo da obra literária. Mas esses detalhes não diminuem o ritmo do romance, que nos apresenta uma Lila Mae pressionada pelos acontecimentos, imersa em um vendaval inesperado.

Colson Whitehead: escritor norte-americano | Foto: Reprodução

Embora de personalidade frágil e circunspecta, ela não vai temer buscar provas de sua inocência a qualquer custo, e acaba involuntariamente se envolvendo com os principais personagens da disputa eleitoral da Associação dos Elevadores. A garota “de cor”, como é descrita pelo autor, volta ao Instituto onde estudou para desvendar os segredos do teórico do Intuicionismo, James Fulton, já falecido e que lecionou na instituição de ensino, para ao final fazer uma descoberta surpreendente.

O romance “A Intuicionista” foi lançado em 1999. É o livro de estreia de Colson Whitehead, escritor afro-americano nascido em Nova York em 1969. Com o livro “The Underground Railroad — Os Caminhos para a Liberdade”, ele conquistou o National Book Award de Ficção, em 2016

No ano passado, o romancista se tornou o quarto na história dos Estados Unidos a ganhar dois prêmios Pulitzer em ficção. Whitehead ganhou a segunda premiação em 2020, com “O Reformatório Nickel”, obra sobre abusos em um reformatório juvenil norte-americano na década de 1960.

Um dos expoentes atuais da literatura afro-americana, é uma das vozes literárias que se erguem contra o racismo nos Estados Unidos. Whitehead tem se mantido produtivo ao longo da pandemia da Covid-19, período em que concluiu sua última obra, “Harlem Shuffle”, romance de ficção policial ambientado no bairro nova-iorquino do Harlem durante a década de 1960. O novo livro está programado para ser publicado em setembro próximo.

Mariza Santana é crítica literária do Jornal Opção. E-mail: [email protected]