Audiodescrição, um jeito de ouvir imagens
20 agosto 2016 às 09h47

COMPARTILHAR
Fica 2016 é o primeiro festival com programação audiodescritiva, ação que implica em empoderamento, ampliação de conhecimento e acessibilidade a cultura

“Onde é que cê tava, Léo? Você aí de noite, no escuro.
Mãe, para mim é sempre escuro”
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho
Yago Rodrigues Alvim
Pedro quis se abrir para o mundo, quis conhecer coisas novas para além da pequena propriedade rural em que cresceu. No entanto, fora ele o filho destinado a cuidar da terra e de sua família.
Fictícia, a historieta é apenas um trechinho do curta-metragem de Daniel Calil Cançado, o intitulado “E o Galo Cantou”. Exibida na 18ª edição do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental, o Fica 2016, o filme de Calil marca uma nova conquista em terras goianas. Com sessão audiodescritiva, o festival se torna o primeiro no mundo com uma programação voltada a pessoas com deficiência visual.
Presente no festival de cinema, a doutora Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, Lívia Motta, trabalha, desde 2005, com audiodescrição e a simplifica nas seguintes palavras:
— A audiodescrição é um recurso de acessibilidade que amplia o entendimento das pessoas com deficiência visual em eventos culturais, gravados ou ao vivo, como: peças de teatro, programas de TV, exposições, mostras, musicais, óperas, desfiles e espetáculos de dança; eventos turísticos, esportivos, pedagógicos e científicos tais como aulas, seminários, congressos, palestras, feiras e outros, por meio de informação sonora.
É uma atividade de mediação linguística, uma modalidade de tradução intersemiótica, que transforma o visual em verbal, abrindo possibilidades maiores de acesso à cultura e à informação, contribuindo para a inclusão cultural, social e escolar. Além das pessoas com deficiência visual, a audiodescrição amplia também o entendimento de pessoas com deficiência intelectual, idosos e disléxicos.
Já com quase 35 anos, a Associação dos Deficientes Visuais de Goiás (ADVEG), desde a sua constituição, pauta-se pela defesa dos direito dos deficientes audiovisuais a terem acesso à saúde, educação, mobilidade e, mais recentemente, à informação e cultura.
O presidente Gilberto Alves Silva conta um pouco do feito da associação que, graças a uma vontade dos próprios associados (hoje, cerca de 2,7 mil) em ter acesso a cultura, e mais especificamente ao cinema, conseguiu, por intermédio do Superintendente de Cultura Nars Chaul e da secretária de Cultura e Educação Raquel Teixeria, ter a causa abraçada.
A esperança é de que seja o primeiro de muitos festivais a criar pontes, fazer ouvir imagens. O presidente, na ocasião mesmo, já demonstra a vontade de que não seja uma ação descontinuado, e sim da construção de uma cultura de acessibilidade. Por isso, no Fica foram realizadas oficina dirigida a produtores de cinemas e demais profissionais da área, e um fórum, com participação além de Lívia Motta, da especialista em audiodescrição já com mais de 100 roteiros produzidos Mônica Magnani, a fim de debater o assunto.
Gilberto esmiúça a audiodescrição que consiste em transmitir o todo, o sentido completo da mensagem que um diretor, por exemplo, visa transmitir com seu filme a quem tem ausência de visão — esta que pode ser total ou parcial.
“A deficiência visual implica na impossibilidade de olhar as imagens que constituem o universo em que vivemos. E eis que surge, há pouco tempo no Brasil, a audiodescrição, cuja finalidade é descrever essas imagens a quem não tem acesso a ela. É uma forma de fazer enxergar o contexto dos lugares em que estamos, em que estão os programas de tevê, os filmes”, esmiúça.
Por mais que existam falas em filmes ou programas de tevê e, mesmo, jornalísticos, este áudio não é suficiente. Assim, intercalam-se descrições, com as informações dos cenários e do enredo. É um componente a mais, sem interferir nos diálogos travados pelos personagens. Assim, é possível o todo, o sentido da mensagem do diretor do filme ser apreendido.
A ação é só um pingo, muito bem-vindo vale destacar, em meio a um oceano que implica em empoderamento, ampliação de conhecimento e, principalmente, em acessibilidade a cultura — o que é, nos dias de hoje, mais que significativo. l