Em 1937, sopravam os ventos da mudança da capital goiana para a nova cidade, já construída nas planícies próximas à Campininha das Flores. Muito zunzunzum, muitos mexericos e notícias falsas – coisa antiga isso que hoje tem o pomposo nome de fake news.

– Doutor Pedro, os funcionários estão fazendo um movimento contra a mudança para a nova capital. Dizem que não vão de jeito nenhum.

– Ora, ora! Contorne lá essa situação, homem. Afinal, eu sou o interventor, mas você é o meu secretário de Administração…

Promessas foram feitas em nome do governo: subsídios financeiros; construção de moradias para os servidores públicos e suas famílias; enfim, um rol de benefícios oferecidos para estimular não só o povoamento da nova capital, mas, também, para garantir o bom andamento da administração pública.

– E então, secretário? Vencidas as resistências?

– Que nada, doutor Pedro – disse o secretário enxugando o suor e torcendo as mãos de nervosismo. – Já tentamos de tudo, mas eles se mostram irredutíveis. Não querem mesmo se abalar daqui para Goiânia, de jeito nenhum. Se for assim, o governo nem terá como se instalar.

– Isso é coisa da oposição! Temos que dar um jeito nisso, ora essa! Ofereça os caminhões do governo para levar a mudança dos funcionários. Sem custo algum, ouviu bem? Ressalte bem que será sem custo algum para quem quiser ir.

Passaram-se os dias e nenhum progresso parecia haver. Dois ou três gatos pingados, que se sentiram tentados a aceitar a proposta, logo desistiram face às hostilidades de que passaram a ser vítimas por parte dos colegas que se mantinham firmes na disposição de resistir à mudança.

– Preciso falar com o doutor Pedro – disse o secretário de Administração ao mordomo da parte residencial do velho Palácio do Governo.

– Ele está almoçando…

pé de pequi 3

Lá de dentro, da sala de jantar, veio logo a ordem do governante, ao reconhecer a voz do auxiliar:

– Deixa o homem entrar, Policarpo.

– Dá licença, doutor Pedro…

– Pois não, secretário. Já almoçou?

– Ainda não tive tempo, doutor…

– Pois então puxe aí essa cadeira e sente-se conosco. Esse arroz com pequi está uma beleza.

– Muito obrigado. Aceito com muito prazer, pois não há nada que nós, goianos, gostemos mais do que um bom arroz com pequi. Pena que os pequizeiros só dão uma vez por ano…

Um sorriso iluminou o rosto do interventor, que se levantou de chofre, dizendo:

– Aí está a solução! Diga ao pessoal que lá no cerrado na nova capital os pequizeiros dão fruto duas vezes por ano.

Com um argumento assim tão poderoso e convincente, não houve dúvidas: mudaram-se todos!

Fernando Cupertino, médico, compositor e escritor, é colaborador do Jornal Opção.