Elias Antunes

Em Helvécio Goulart, na leitura de seus “Poemas Reunidos”, pode-se denotar a preocupação com uma escrita mais profunda, uma busca lírica e atual, com resultado extremamente satisfatório.

Ao longo de uma carreira literária voltada, principalmente, para a poesia, publicou diversos livros, como “A Janela Azul” (1970); “Memória das Águas” (1976); “Duração dos Dias” (1986). Este último, tocante, levantou o Prêmio Hugo de Carvalho Ramos.

“Duração dos Dias” alcança uma beleza ímpar, cheio de ritmo, inteligência e musicalidade.

Há poemas curtos e outros longos, mantendo a elegância, a sutileza e o lado social e familiar.

Poemas como este:

“Divisa

Um anjo, quando chega,

               não dá sinal que chega

só a ausência do anjo

                é a sua presença”.

(GOULART, 2007, p. 33)

A lírica de Goulart canta a mulher amada, mas a tonalidade é outra, não se trata de sentimento derramado e exacerbado; contudo, soa como uma música mais afinada com nosso tempo.

São poemas assim:

“IV

Dorme a mulher de costas

                                         para o medo

A noite está perdida

                                          cobra nos olhos

De sono da mulher

                                          centelha azul

Na noite cheia de vigílias

                                                         pálpebras

Nos labirintos da mulher que não vê

Braços de malícia apertar-lhe

                                                        a cintura e

cercá-la de espinhos (…)”

(GOULART, 2007, p. 130)

Seu lirismo é mais aparente de que real. Ao descrever a mulher, por exemplo, fala muito mais da condição humana de que de uma paixão cega e desmedida.

Helvécio Goulart possuía essa ciência da seriedade e importância do fazer poético.

Não é crime escrever maus poemas, mas um poeta, sabedor da dureza do ofício como Helvécio Goulart, justamente por isso mesmo, produziu poemas de qualidade indiscutível.

“Laranjas

As laranjas maduras

estão aí para quem queira chupá-las.

                                                              Doces frutos

humildes como pássaros

                                           de folhas amarelas.

               Meninos brincam:

irmãos dos campos e das ervas

que a chuva faz crescer.

                             Ao sol

há o murmúrio da água”.

(GOULART, 2007, p. 35)

Texto publicado na “Revista Entre Poetas & Poesias”.

Elias Antunes é escritor e crítico literário.