Se a trajetória atual das emissões globais de gases do efeito estufa não mudar, o aquecimento global poderá ultrapassar os 3,1ºC até o final do século, afirma um novo relatório da ONU. O documento “Emissions Gap Report 2024”, divulgado na última quinta-feira, 24, destaca que as políticas climáticas adotadas até agora estão aquém das metas acordadas no Acordo de Paris, que visa limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC.

Para os especialistas, a Conferência do Clima das Nações Unidas (COP 29), que ocorrerá no Azerbaijão entre 11 e 22 de novembro, será uma oportunidade decisiva para que os países intensifiquem suas promessas de redução de carbono até 2030, buscando assim evitar um futuro marcado por eventos climáticos extremos.

Metas e compromissos climáticos

Para manter o aquecimento global em níveis controlados, cada nação é incentivada a apresentar Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês), que funcionam como promessas voluntárias de corte de carbono. No entanto, segundo o relatório da ONU, as atuais metas apresentadas pelos países estão longe de serem suficientes.

As emissões de carbono precisam ser reduzidas em 43% até o fim desta década para que a humanidade possa alcançar o carbono zero até 2050, enquanto os compromissos atuais indicam uma redução de apenas 2,6% até 2030.

A União Europeia, composta por 27 países, adotou uma meta conjunta de corte de emissões que agora será atualizada. Os novos valores deverão ser apresentados já no início de 2025, antes da COP30, que será sediada no Brasil. O secretário-executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, Simon Stiell, ressaltou que os próximos dois anos são “essenciais para salvar nosso planeta”. Ele enfatiza a necessidade de uma nova geração de planos climáticos mais rigorosos e imediatos.

A ameaça do aumento de 3,1°C 

Os especialistas consideram um aumento de 3,1ºC “catastrófico”, pois intensificaria eventos climáticos extremos como secas, ondas de calor e furacões, além de elevar o nível do mar, ameaçando diretamente milhões de vidas e ecossistemas. A diretora do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), Inger Andersen, reforça que ainda é tecnicamente possível conter o aquecimento, mas exige investimentos pesados em energias renováveis, como solar e eólica, que, juntas, poderiam reduzir até 38% das emissões até 2035.

Segundo Andersen, ações de conservação florestal também podem contribuir em até 20% para o potencial de mitigação do carbono.

Além de reduzir as emissões industriais, o relatório aponta que setores como transporte e construções devem adotar medidas de eficiência energética, além de políticas que limitem a queima de combustíveis fósseis. Sem essas ações, o esforço para conter o aquecimento global ficará ainda mais complexo, com metas de redução anuais de 8 a 15% se o início das reduções for postergado para 2030.

Embora as discussões globais sobre o clima estejam avançando, as emissões de CO2 relacionadas à energia atingiram níveis recordes em 2023, aponta o relatório. Isso reflete a dificuldade que muitas nações enfrentam para reduzir sua dependência de fontes energéticas fósseis, como carvão e petróleo.

Em junho deste ano, o secretário-geral da ONU, António Guterres, chamou a atenção para a urgência da situação, comparando os impactos das atividades humanas ao de um meteorito que causou a extinção dos dinossauros.

Durante um evento em Nova York, Guterres sugeriu medidas polêmicas, como a proibição da publicidade para produtos de petróleo, gás e carvão, uma estratégia que visaria reduzir a demanda por combustíveis fósseis e, consequentemente, as emissões de carbono. “No mundo conturbado de hoje, a esperança não é suficiente. A esperança exige ação determinada e soluções multilaterais para a paz e um planeta próspero”, afirmou o secretário-geral.

O documento da ONU também destaca que, com o aquecimento global, as florestas estão perdendo sua capacidade de absorver dióxido de carbono, segundo dados da Organização Meteorológica Mundial (OMM). Isso significa que, à medida que as temperaturas aumentam, o papel das florestas como “pulmões” do planeta diminui, tornando ainda mais urgente o investimento em ações de reflorestamento e conservação.

Em paralelo, o desenvolvimento de tecnologias limpas, como energia solar e eólica, tem potencial para mitigar parte das emissões de gases de efeito estufa. Até 2030, o avanço dessas tecnologias poderia fornecer mais de um quarto do potencial total de redução de carbono, e, em 2035, esse número poderia aumentar para 38%. Contudo, isso exige um esforço coordenado dos países e incentivos para tornar essas fontes energéticas mais acessíveis.

Necessidade de comprometimento internacional na COP 29

Com a COP 29 marcada para o próximo mês, líderes globais terão a chance de ajustar suas políticas e compromissos ambientais. As conversas serão focadas nas contribuições das NDCs, com os países atualizando seus compromissos de corte de carbono, essenciais para evitar que o aquecimento global ultrapasse os 1,5ºC. Essa meta é particularmente relevante para regiões vulneráveis, como pequenas ilhas e áreas costeiras, que enfrentam risco iminente com a elevação do nível do mar.

A ONU também destaca que, se as reduções de emissões começarem de forma imediata, será necessário reduzir de 4 a 7% das emissões anualmente para atingir os objetivos do Acordo de Paris. No entanto, se o corte for postergado até 2030, a redução anual deverá saltar para 8 a 15%, colocando ainda mais pressão sobre os governos e a indústria.

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