A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) inicia nesta terça-feira, 14, o julgamento do chamado “núcleo quatro” da trama golpista, grupo acusado de ser o responsável pela tática de desinformação usada para sustentar o movimento que tentou um golpe de Estado após as eleições de 2022.

Se forem condenados, os réus protagonizarão a primeira decisão criminal do STF envolvendo desinformação contra o sistema eleitoral, criando um precedente jurídico sobre o tema. Até agora, punições desse tipo haviam ocorrido apenas na esfera eleitoral — como nos casos do ex-presidente Jair Bolsonaro e do ex-deputado Fernando Francischini, condenados por disseminar notícias falsas sobre as urnas eletrônicas.

A sessão começa com a leitura do relatório (resumo do caso) pelo ministro Alexandre de Moraes. Em seguida, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, responsável pela acusação, fará a sua manifestação. Depois, a defesa de cada réu, em ordem alfabética, terá até uma hora para apresentar seus argumentos. A sessão deve ser obrigatória até às 12h, e, após intervalo para o almoço, o presidente da Primeira Turma, ministro Flávio Dino, abrirá a segunda sessão de hoje.

O julgamento é presencial, com transmissão ao vivo pela Rádio e TV Justiça e pelo canal do STF no YouTube.  Acompanhe.

Quem são os acusados

A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu a condenação de sete réus por envolvimento direto na produção e difusão de narrativas falsas que buscavam desacreditar o processo eleitoral e pressionar instituições. São eles:

  • ex-major Ailton Barros,
  • major da reserva Ângelo Denicoli,
  • engenheiro Carlos Rocha,
  • subtenente Giancarlo Rodrigues,
  • tenente-coronel Guilherme Marques Almeida,
  • policial federal Marcelo Bormevet,
  • e coronel Reginaldo Vieira de Abreu.

De acordo com o procurador-geral da República, Paulo Gonet, o grupo teria “fabricado e disseminado narrativas falsas contra o processo eleitoral, os Poderes constitucionais e as autoridades que os representam, fazendo nascer e crescer a instabilidade social necessária para a ruptura institucional”.

Além da campanha contra o sistema eleitoral, o grupo também é acusado de organizar ataques virtuais para pressionar os comandantes das Forças Armadas a aderirem ao plano golpista.

Defesas negam envolvimento

Os sete réus negam participação em qualquer ação voltada à tentativa de golpe e pedem absolvição. As defesas argumentam que não há provas concretas de que os acusados tenham participado de atividades criminosas e afirmam que a atuação deles foi “técnica e desvinculada de intenções políticas”.

Entre os principais pontos:

  • Ângelo Denicoli e Guilherme Almeida são acusados de disseminar nas redes sociais suspeitas infundadas sobre as urnas;
  • Denicoli e Reginaldo Abreu teriam tentado interferir no relatório do Ministério da Defesa — que não encontrou fraudes — usando dados fornecidos por um influenciador argentino;
  • Carlos Rocha, presidente do Instituto Voto Legal (IVL), é apontado como autor do relatório contratado pelo PL que embasou a ação pedindo a anulação de parte dos votos do segundo turno, mesmo após alertas técnicos sobre inconsistências;
  • Giancarlo Rodrigues e Marcelo Bormevet são acusados de integrar uma estrutura da Abin que teria tentado vincular ministros do STF à empresa fabricante das urnas;
  • Ailton Barros teria orientado ataques aos comandantes do Exército e da Aeronáutica, que se recusaram a aderir ao movimento golpista.

Julgamento pode fixar novo entendimento jurídico

Especialistas apontam que o julgamento pode abrir caminho para um novo entendimento jurídico sobre o uso criminoso de desinformação contra instituições democráticas.

Para o professor Breno Melaragno, da PUC-Rio, o processo representa uma mudança de paradigma:

“O precedente que se cria é o seguinte: quem, sem qualquer prova, propagar notícia falsa questionando a lisura do processo eleitoral atenta contra o Estado democrático de Direito — e, portanto, comete crime.”

Como será o julgamento

O julgamento começa com as sustentações orais da PGR e das defesas, e deve se estender até o dia 22 de outubro, com seis sessões reservadas pela Primeira Turma.

Essa é a primeira vez que o Supremo julga um grupo específico da trama golpista pelo uso sistemático de fake news como instrumento de desestabilização institucional.

O caso ocorre em meio ao esforço do STF para consolidar o entendimento de que a desinformação deliberada contra o processo eleitoral pode configurar crime contra o Estado Democrático de Direito.

Leia também: STF começa a julgar réus do Núcleo 4 da trama golpista nesta terça